quinta-feira, março 20, 2008

Gerir o medo

"Quando o medo social cresce, aquilo que fica em jogo é a própria existência de uma sociedade livre, ou aberta.

Thomas Hobbes, um filósofo político inglês do século XVII, considerava que o medo era a paixão humana fundamental. Os seres humanos – pensava Hobbes – preferem ficar submetidos a um poder absoluto que garanta a paz, do que viver em total liberdade e no medo constante de serem atacados, ou mesmo mortos. É o medo, especialmente o medo dos outros seres humanos, daquilo que eles podem fazer com os nossos corpos e as nossas posses, que justifica a renúncia à liberdade e a preferência pela servidão.

Não podemos concordar com a cedência de Hobbes face à servidão. Mas ele estava certo num ponto: o medo é uma motivação essencial e muitas das decisões humanas mais básicas derivam dele. Ora, no momento actual, os medos estão em crescendo. O mais recente advém da crise bolsista: ela traz, para muitos, o medo de perder o seu património, ou de o ver drasticamente reduzido. Mas há muitos outros medos: a sensação de insegurança e medo nas ruas, nos espaços públicos e até na própria casa; os medos mais difusos, como o do terrorismo, das pandemias e das catástrofes naturais; os medos ligados à globalização e à crise do Estado social, como o medo dos imigrantes, o medo de perder o emprego, o medo de perder a assistência na saúde, ou o medo daquilo que poderá acontecer aos nossos filhos.

Quando o medo social cresce, não é apenas a qualidade de vida que decresce. Aquilo que fica em jogo é a própria existência de uma sociedade livre, ou aberta. A sociedade aberta implica confiança no funcionamento das instituições que protegem a liberdade – o Estado de direito, os tribunais independentes, uma comunicação social pluralista, os mercados concorrenciais, etc. – e, portanto, a capacidade para vencer o medo potencial que nos opõe aos nossos semelhantes. Uma acrescida percepção subjectiva dos medos societários conduz à erosão da confiança entre os indivíduos e no próprio funcionamento das instituições livres. É esta situação que leva a que alguns, na senda de Hobbes, prefiram a servidão à liberdade.

É certo que muitos dos medos actuais são exagerados pelos jornais sensacionalistas, pela televisão e por sítios na ‘internet’ que exploram a natural credulidade humana. Também é certo que estes medos são alimentados por intelectuais pouco escrupulosos e sedentos de chamar a atenção para si mesmos – aqueles que dizem que a nossa sociedade livre é uma forma de fascismo, aqueles que fazem equivaler a causa dos terroristas e a dos amigos da sociedade aberta, aqueles que disfarçam mal a sua simpatia por fundamentalismos, religiosos ou ateus, e que misturam no mesmo saco o ódio e o medo que nutrem pela liberdade. Há também – e sempre haverá – um grupo de políticos prontos a capitalizar votos diante de todos esses medos e a dizer o que fôr preciso para agravar um sentimento já de si excessivamente poderoso. Porém, mesmo sem a intervenção de todos estes oportunistas, o medo hoje existente na sociedade é bem real.

Julgo que os governos das sociedades abertas têm prestado pouca atenção à gestão de todos estes medos societários. O nosso Governo não é excepção. Continua a hesitar em fazer um discurso forte sobre a segurança de bens e pessoas, e em agir em conformidade. Um dos aspectos mais graves da nossa vida social é a desmoralização das forças policiais e a sensação de insegurança que elas próprias criam junto dos cidadãos. Outro aspecto é a dificuldade em inverter o descrédito absoluto em que caíram os tribunais. Os cidadãos interiorizaram que, em caso de conflito, não têm verdadeiramente a quem recorrer. Um outro problema é o desemprego que teima em manter-se. Como se isso não bastasse, há ainda a suspeita de que o sistema universal de saúde será destruído, se não por este Governo, pelo próximo. Ou ainda a percepção de que as autoridades políticas não têm os instrumentos para travar a crise financeira e económica global.

Infelizmente, os nossos políticos democráticos não leram Thomas Hobbes. De outra forma, colocariam a gestão do medo no topo das suas agendas. Nos tempos que correm, gerir o medo e alimentar a confiança no futuro é a tarefa política mais importante para todos aqueles que prezam a liberdade e a sociedade aberta
."

João Cardoso Rosas

11 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Parece-me que há quem goste que a miséria seja cada vês maior!Mas ainda há gente que pensa que este Governo fez alguma coisa de bom para os pobres e menos pobres? De certeza que não está incluído nestas classes. Acham que é honesto, prometer uma coisa e depois fazer outra? Quando a Ferreira Leite pensou fazer alguma coisa, oa arruaceiros do PS e o Sr. Sampaio, gritavam a sete ventos, dizendo que havia mais vida, para além do défice! Agora, depois de enganarem o povo, enchem a boca com isso! Quanto às exportações e esxpansão de algumas empresas, até para o exterior, dá impressão que isso é obra do Governo! O Ministro da economia, parece uma maluca bêbeda, como se isso fosse obra dele! Viva a ignorância!

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

Não me diga que há 3 anos os portugueses viviasm pior do que vivem hoje? Então, quantos Centros de Saúde tinham fechado? Quantas maternidades e quantas Escolas tinham fechado? Quantas pessoas pagavam IVA a 21%? Quantas pessoas que mal ganham para comer, pagavam IRS? Isto é que é governar bem ? Cercam as pessoas de todo o lado e espremem-nos até os asfixiarem! será que a paranoia clubista, torna as pessoas cegas e insencíveis? Vá comprar óculos, porque está a ver o filme ao contrário. Ou então vive do orçamentom e tem a pança cheia!

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

A criminalidade especialmente violenta tem apresentado novas tipologias, com nova intensidade, em consequência de determinadas alterações, das quais podemos destacar, por ordem aleatória: O fim das fronteiras na Europa, que facilitando a circulação das pessoas e bens também dificulta o seu controlo, além de criar movimentos de procura ilícita de mercados negros. O uso das tecnologias de informação, que fornece grande mobilidade e até impunidade a certas formas de criminalidade.

A crise económica e social, com o cortejo de desempregados enquanto mão-de-obra potencial das multinacionais do crime ou até de fórmulas mais caseiras. A exploração do tráfego de pessoas, o crime económico e financeiro enquanto rotas internacionais de uma criminalidade altamente rentável. Os fenómenos de exclusão social, de delinquência juvenil organizada enquanto culturas de violência, de contra-poder, de afirmação anti-social.

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

A criminalidade violenta acontece porque a maioria dos polícias que "garantem" a segurança das pessoas e das populações não têm preparação, não têm equipamento (incluindo armas) adequado, e, sobretudo, porque as leis penais protegem mais os criminosos que os polícias e os cidadãos pacíficos.

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

Essa crise social já existe, mas a falta de cultura política da parte de quem a sofre, não dá lugar a que a contestação se torne o "mote". Quando se alude há necessidade de refundação ou restruturação de valores, tais como a moralidade e a ética, valores enfim, que sustentem uma cidadania civica de pendor bem vincado de forma a que se consiga reformar o "Estado" e, por conseguinte, o modo de como se governa,abstraimo-nos da essencialidade de recordar que o povo Português tal como a grande maioria dos Povos Europeus sofre o sindroma do Globalismo Político, fenómeno que tem com factor de proa a desintegração desses mesmos valores, afim de que se consiga instalar toda uma maneira peculiar de tornar pessoas, em "consumidores" de produtos e de modas.Sofre a sociedade Portuguesa no meu entender de excesso de legalismos que por sua vez dão origem a uma espécie de erosão do singelo. Já não se consegue abarcar, o essencial, em virtude da "inundação" de conceitos que obrigam a escolhas de modo de vida impensados, que levam por sua vez a um desenraízamento cultural gravíssimo. Essa "cultura" abrange o essencial das nossas atitudes vivenciais diárias, causando aquilo que eu chamo a vivência do real pelo superficial. Bem vindos ao mundo da irrealidade.

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

A crise social, melhor de valores, é a mais profundo da minha exstência de 69 anos. Caso como o imóvel do casino, e o da "nacionalização" do BCP são o exemplo do que os governantes vêm perseguindo- governarem-se em vez de governar a bem do país. Por outro lado o atropelo das leis, nomeadamente no ensino, com o estatuto do aluno e a avaliação dos docentes, em que as regras mudam no meio do jogo e aplicam-se retrroactivamente,ilustra a incompeência da tutela, que não faz atempadamente o trabalho de casa, e que no estatuto do aluno obriga a um exame de recuperação ,por exemplo, a quem esteja ausente um período inteiro por doença grave, quando o que se aplicava era que o aproveitamento em dois períodos permitiria a transição. A lei deve ser abstrata mas terá que prever as várias hipóteses que se poderão colocar, para que não seja uma má lei. Mas em Portugal até tem havido leis "dirigidas" para ilibar cidadãos do sistema, ou seja, cidadãos de primeira, porque o número de excluídos aumenta incessantemente. O nosso PR, em quem votei, e no único governante que confio, tem lançado alertas para os exageros dos "senhores feudais" ( esta expressão é minha).

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

Ha tempos Manuel Alegre disse: antes que venha uma Maria da Fonte é necessario agir.Não é somente as urgências que estão mal é todo o sistema.Necessitamos um Homem de caracter e força capaz de se fazer respeitar por todos e não massacrar o povo que ja esta sobrecarregado com impostos. Os fracos são sempre culpados porque não têm dinheiro para se defender ou são espezinhados forçados a emigrar, não ha pior crime do que fazer emigrar um povo Senhores do Governo.Não olhem ao vosso bolso mas criem condições,não tenham medo de votar medidas para o investimento e criar empregos estes vão gerir riqueza para o povo enriquecendo as Caixas que servirão para os trabalhadores,criem medidas fiscais.Olhem para as Caixas Sociais e não para as caixas dos partidos. Sr.Eng. Socrates bata aonde tenha que bater,ainda temos uma luz de esperança.

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

sociedade portuguesa tem hoje donos que a sugam, que a utilizam de acordo com os seus interesses, as suas vaidades e os seus caprichos.A nós que os sustentamos, para além de público da arena política que alimenta o seu ego, resta-nos o estatuto de sermos servos agradecidos, habilmente monotorizados. Dramaticamente são os partidos políticos a génese desta apropriação e manipulação social, pois são neles que são criados e formados estes novos "figurões".

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

O País vive desde há muito num modelo de distribuição e consumo suportado pelo endividamento e pela sua integração numa área monetária estável. A crescente dependência está a transformar-nos num País pária, à beira de ser economicamente inviável. A estratégia que está a ser seguida, sob pressão comunitária, com o pacto de estabilidade, conduz à aniquilação das forças inovadoras e mais dinâmicas da sociedade. A pressão fiscal, imposta pela incapacidade de reformar o Estado e diminuir a despesa pública, constitui o factor de ajustamento mais visível da tentativa de retomar um crescimento que seja capaz de manter a viabilidade da País, permitindo a estabilidade social com níveis de desemprego suportáveis. A atitude generalizada do Governo do tipo "ASAE", em todos os domínios da sociedade, é uma manifestação de impotência e incapacidade para resolver os verdadeiros problemas. O crescimento do desemprego, o nível de endividamento e as rercussões numa eventual crise bancária e financeira, constituem os ingredientes para inflamar o tecido social e causar uma crise política de efeitos imprevisíveis.Não é preciso que a Sedes venha dizer o que é óbvio. A diferença é que, sendo a Sedes a dizê-lo, talvez o Governo escute, mesmo que a Sedes de hoje ninguém saiba o que é ou o que representa. Esta Sedes nada tem a ver com a Sedes do tempo do Marcelo Caetano. É talvez um grupo de "amigos" que se reúne de vez em quando à volta de um bom jantar. É só isso.

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

Estou inteiramente de acordo com esta análise potitica e social. Corresponde exatamente aquilo que sinto. Um desencanto enorme pela politica que me levou, a deixar de votar, ou melhor votar em branco. Os politicos têm sido responsáveis pelo alheamento, que vai crescendo em espiral, de uma boa parte de portugueses que entende não valer apena votar, pois são todos iguais. Os compadrios, os lugares criados à medida, os vencimentos vergonhosos que os responsáveis de empresas publicas atribuem a si próprios, com a indiferença dos membros do Governo, pois sabem que mais cedo ou mais tarde também estarão nessa situação, são dificeis de entender pela esmagadora maioria da população que sente diáriamente o mau funcionamento dos serviços a que tem direito e em muitos casos, a quebra do poder de compra. As reformas escandalosas dos politicos, deputados e altos quadros da Administração, em muitos casos acumuláveis, por pouco tempo de serviço, não são minimamente aceitáveis pela população, originando alheamento da vida politica activa e participativa, e cria uma revolta latente e crescente com consequências imprevisiveis. Penso que, quem nos governa, deveria parar e pensar como alterar este estado de coisas. Sinto que a maioria silenciosa poderá explodir a todo o momento, se não for alterado este estado de coisas e nem a capa da União Europeia nos vai ajudar.

quinta-feira, março 20, 2008  
Anonymous Anónimo said...

Os "media" não têm qualidade, a Justiça nunca funcionou, os Partidos tratam de si próprios, os governos nunca tiveram coragem para fazer reformas e os portugueses estar melhor mas não querem reformas nem melhoram os seus conhecimentos. Um país onde cada qual trata de si e onde não existe responsabilidade. Um país que não é digno de estar na CEE.

quinta-feira, março 20, 2008  

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