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"Não sei se falta ainda algum ministro pronunciar-se contra a redução do imposto sobre os combustíveis para aliviar o impacto das 18 subidas do preço ocorridas desde o início do ano.
O mais contundente, como não podia deixar de ser, foi o primeiro ministro. Na semana passada, na Assembleia, disparou: “Acha bem que quem não tem carro financie a gasolina?” A afirmação de Sócrates foi certeira, porque se em economia ninguém almoça de borla, com a gasolina a estes preços também acabaram as boleias gratuitas. E o alívio dos condutores só poderia vir da sobrecarga da factura dos contribuintes.
O primeiro ministro acrescentou na altura que a preocupação do Governo é “garantir aos portugueses que há efectivamente em Portugal condições de concorrência”. E rematou: “Faremos tudo o que está ao nosso alcance para que haja em Portugal um ambiente cada vez melhor para os negócios”. Muito bem. Não fosse o pormenor do Governo ainda não ter feito em relação aos combustíveis o que já concretizou nos restantes mercados em que uma empresa para-estatal beneficiava de uma esmagadora posição dominante – separar as infraestruturas da comercialização. Foi assim com a separação da rede da Portugal Telecom e também no gás e na electricidade. Nos casos em que a posse da infraestrutura não foi retirada ao operador dominante, este esperneou mas foi obrigado a dar acesso em condições de transparência aos concorrentes.
Nas gasolinas, o mercado foi liberalizado em 2004, mas não interessava muito enfraquecer o operador dominante, até porque o Estado ainda era o seu maior accionista. Dois anos depois, Manuel Pinho emendou a mão com uma lei que previa esta separação funcional. Mas a lei nunca foi regulamentada, por isso não se aplica. Assim, o mecanismo de fixação do preço dos combustíveis continua a ser um enorme túnel onde entram barris de petróleo a 131 dólares e sai gasolina a um preço tabelado pela bitola alta pelos operadores dominantes, que além da Galp incluem a BP e a Repsol. Existe um mercado internacional de produtos já refinados. Mas as restrições de acesso à armazenagem faz com que quase todo o combustível queimado em Portugal tenha de passar por este túnel. Não há provas de que os preços sejam combinados. Mas há enormes dúvidas sobre se, não havendo boleias gratuitas, não estaremos a pagar demais a estes taxistas.
O problema é que, não tendo o Governo tomado na altura certa os passos para que a lei já estivesse em vigor, se forçar agora a sua aplicação tem um dilema de resolução quase impossível: não querendo que sejam os contribuintes a pagar os passeios de quem tem carro, terão de ser os accionistas da Galp a fazê-lo. Pensando em Américo Amorim, na Sonangol e na Eni é fácil pensar, “que se lixem!” Mas além dos “fat-cats”, a Galp conta com milhares de investidores que compraram acções numa empresa cujas condições de mercado poderão mudar radicalmente. Será que foram avisados? "
Pedro Marques Pereira
O mais contundente, como não podia deixar de ser, foi o primeiro ministro. Na semana passada, na Assembleia, disparou: “Acha bem que quem não tem carro financie a gasolina?” A afirmação de Sócrates foi certeira, porque se em economia ninguém almoça de borla, com a gasolina a estes preços também acabaram as boleias gratuitas. E o alívio dos condutores só poderia vir da sobrecarga da factura dos contribuintes.
O primeiro ministro acrescentou na altura que a preocupação do Governo é “garantir aos portugueses que há efectivamente em Portugal condições de concorrência”. E rematou: “Faremos tudo o que está ao nosso alcance para que haja em Portugal um ambiente cada vez melhor para os negócios”. Muito bem. Não fosse o pormenor do Governo ainda não ter feito em relação aos combustíveis o que já concretizou nos restantes mercados em que uma empresa para-estatal beneficiava de uma esmagadora posição dominante – separar as infraestruturas da comercialização. Foi assim com a separação da rede da Portugal Telecom e também no gás e na electricidade. Nos casos em que a posse da infraestrutura não foi retirada ao operador dominante, este esperneou mas foi obrigado a dar acesso em condições de transparência aos concorrentes.
Nas gasolinas, o mercado foi liberalizado em 2004, mas não interessava muito enfraquecer o operador dominante, até porque o Estado ainda era o seu maior accionista. Dois anos depois, Manuel Pinho emendou a mão com uma lei que previa esta separação funcional. Mas a lei nunca foi regulamentada, por isso não se aplica. Assim, o mecanismo de fixação do preço dos combustíveis continua a ser um enorme túnel onde entram barris de petróleo a 131 dólares e sai gasolina a um preço tabelado pela bitola alta pelos operadores dominantes, que além da Galp incluem a BP e a Repsol. Existe um mercado internacional de produtos já refinados. Mas as restrições de acesso à armazenagem faz com que quase todo o combustível queimado em Portugal tenha de passar por este túnel. Não há provas de que os preços sejam combinados. Mas há enormes dúvidas sobre se, não havendo boleias gratuitas, não estaremos a pagar demais a estes taxistas.
O problema é que, não tendo o Governo tomado na altura certa os passos para que a lei já estivesse em vigor, se forçar agora a sua aplicação tem um dilema de resolução quase impossível: não querendo que sejam os contribuintes a pagar os passeios de quem tem carro, terão de ser os accionistas da Galp a fazê-lo. Pensando em Américo Amorim, na Sonangol e na Eni é fácil pensar, “que se lixem!” Mas além dos “fat-cats”, a Galp conta com milhares de investidores que compraram acções numa empresa cujas condições de mercado poderão mudar radicalmente. Será que foram avisados? "
Pedro Marques Pereira
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