A crise dos preços alimentares
"Como a resposta da produção ao aumento dos preços é limitada, podemos concluir que o problema da alimentação mais cara, veio para ficar.
1. O problema dos preços dos produtos alimentares tem vindo a tornar-se um ‘case-study’.
Seca prolongada na Austrália nos dois últimos anos, má colheita europeia de 2007 e decisões dos EUA e da China reduzirem os seus ‘stocks’ fizeram baixar os níveis de ‘stocks’ mundiais.
Menos referido é que a actual subida de preços coincide com a maior colheita de cereais de sempre e que os preços se sobem sem cessar, desde o Verão passado, continuam, em termos reais, abaixo dos preços de 1974, mas são o dobro da média dos últimos 25 anos.
2. Esta subida de preços associada a colheitas recordes significa que a procura de cereais se alterou estruturalmente nos últimos 20 anos.
O aumento de riqueza na China e na Índia, mas sobretudo o aumento do consumo de carne em todos os países emergentes fizeram aumentar exponencialmente a procura de cereais: a procura directa e a indirecta, utilizada para produzir carne – os chineses aumentaram o consumo anual de 20 para 50 Kg por habitante e cada quilo de carne precisa, em média, de 6 Kg de cereais para ser produzida.
Mas este crescimento foi progressivo e não explica este súbito aumento de preços.
3. Há razões para os aumentos súbitos dos preços.
A produção de etanol nos EUA absorverá um terço da produção de milho do maior exportador mundial, ou seja, utilizará com o etanol mais do que o que exporta, o que explica a subida do preço do milho desde 2005.
Esta subida do preço, além de tornar a carne mais cara, levou ao detrimento da cultura de trigo e soja, cujos preços também começaram a subir.
Por outro lado, a subida do preço do petróleo fez subir os custos de produção – 25 a 35% dos ‘inputs’ destas culturas dependem do preço do petróleo.
4. A adopção recente pela UE de medidas de apoio à produção de biocombustíveis vai agravar o problema. Além de demonstrar, mais uma vez, a incapacidade da Comissão para perceber o que se está a passar nos mercados alimentares.
Os governos americanos e europeus dificilmente recuarão nestes programas em que se comprometeram. E como a resposta da produção ao aumento dos preços é limitada, podemos concluir que o problema da alimentação mais cara veio para ficar e que a 25 anos de descida contínua do peso da alimentação nas despesas das famílias se seguirá uma década de subida dos preços. Situação que contrasta com anos recentes – o índice de bens alimentares do FMI estava em 2005 abaixo do nível de 1974, o que significa que, em termos reais, os preços da alimentação tinham caído 75% em 30 anos.
5. Se uma subida de 10% nos preços aumenta a oferta de cereais entre 1 e 2%, torna-se evidente que é imprescindível, para satisfazer uma procura crescente, deixar que o preço mais elevado chegue ao produtor, estimulando a produção.
Ora a reacção de vários governos tem ido no sentido contrário. Para evitar a subida de preços internos, que afectam os seus consumidores, vários países estabeleceram controlos de preços. Vários outros lançaram impostos sobre as exportações ou estabeleceram ‘plafonds’, e a Argentina e a Rússia usaram os dois tipos de medidas.
Nos E.U.A. o aumento dos preços vai para os agricultores, que verão subir bastante os seus rendimentos.
6. Mas é necessário para fazer face à crescente procura alimentar que várias zonas do mundo aumentem as áreas cultivadas, usem melhores técnicas e que não cedam a argumentos proteccionistas para compartimentar o mercado mundial em pequenos mercados regionais, distorcidos e provocadores de escassez e açambarcamento.
A União Europeia já declarou que as importações deviam satisfazer as regras comunitárias ambientais, de higiene e do bem-estar animal, uma forma conhecida de tornear as regras do comércio livre.
7. O facto da França presidir à União Europeia no segundo semestre de Julho deve significar uma oportunidade perdida de reformar a Política Agrícola Comum.
No passado a PAC distorceu o mercado alimentar mundial exportando excedentes subsidiados, assim desestimulando a produção nos países em desenvolvimento. Agora pretende criar novas barreiras para evitar importações de terceiros países.
Não devemos esquecer que a PAC absorve 55 biliões de euros (metade do orçamento comunitário) e que, no caso de Portugal, a subida das importações alimentares, adicionada à do petróleo, levanta problemas graves à nossa desequilibradíssima balança comercial, difícil de financiar na actual conjuntura."
Pedro Ferraz da Costa
1. O problema dos preços dos produtos alimentares tem vindo a tornar-se um ‘case-study’.
Seca prolongada na Austrália nos dois últimos anos, má colheita europeia de 2007 e decisões dos EUA e da China reduzirem os seus ‘stocks’ fizeram baixar os níveis de ‘stocks’ mundiais.
Menos referido é que a actual subida de preços coincide com a maior colheita de cereais de sempre e que os preços se sobem sem cessar, desde o Verão passado, continuam, em termos reais, abaixo dos preços de 1974, mas são o dobro da média dos últimos 25 anos.
2. Esta subida de preços associada a colheitas recordes significa que a procura de cereais se alterou estruturalmente nos últimos 20 anos.
O aumento de riqueza na China e na Índia, mas sobretudo o aumento do consumo de carne em todos os países emergentes fizeram aumentar exponencialmente a procura de cereais: a procura directa e a indirecta, utilizada para produzir carne – os chineses aumentaram o consumo anual de 20 para 50 Kg por habitante e cada quilo de carne precisa, em média, de 6 Kg de cereais para ser produzida.
Mas este crescimento foi progressivo e não explica este súbito aumento de preços.
3. Há razões para os aumentos súbitos dos preços.
A produção de etanol nos EUA absorverá um terço da produção de milho do maior exportador mundial, ou seja, utilizará com o etanol mais do que o que exporta, o que explica a subida do preço do milho desde 2005.
Esta subida do preço, além de tornar a carne mais cara, levou ao detrimento da cultura de trigo e soja, cujos preços também começaram a subir.
Por outro lado, a subida do preço do petróleo fez subir os custos de produção – 25 a 35% dos ‘inputs’ destas culturas dependem do preço do petróleo.
4. A adopção recente pela UE de medidas de apoio à produção de biocombustíveis vai agravar o problema. Além de demonstrar, mais uma vez, a incapacidade da Comissão para perceber o que se está a passar nos mercados alimentares.
Os governos americanos e europeus dificilmente recuarão nestes programas em que se comprometeram. E como a resposta da produção ao aumento dos preços é limitada, podemos concluir que o problema da alimentação mais cara veio para ficar e que a 25 anos de descida contínua do peso da alimentação nas despesas das famílias se seguirá uma década de subida dos preços. Situação que contrasta com anos recentes – o índice de bens alimentares do FMI estava em 2005 abaixo do nível de 1974, o que significa que, em termos reais, os preços da alimentação tinham caído 75% em 30 anos.
5. Se uma subida de 10% nos preços aumenta a oferta de cereais entre 1 e 2%, torna-se evidente que é imprescindível, para satisfazer uma procura crescente, deixar que o preço mais elevado chegue ao produtor, estimulando a produção.
Ora a reacção de vários governos tem ido no sentido contrário. Para evitar a subida de preços internos, que afectam os seus consumidores, vários países estabeleceram controlos de preços. Vários outros lançaram impostos sobre as exportações ou estabeleceram ‘plafonds’, e a Argentina e a Rússia usaram os dois tipos de medidas.
Nos E.U.A. o aumento dos preços vai para os agricultores, que verão subir bastante os seus rendimentos.
6. Mas é necessário para fazer face à crescente procura alimentar que várias zonas do mundo aumentem as áreas cultivadas, usem melhores técnicas e que não cedam a argumentos proteccionistas para compartimentar o mercado mundial em pequenos mercados regionais, distorcidos e provocadores de escassez e açambarcamento.
A União Europeia já declarou que as importações deviam satisfazer as regras comunitárias ambientais, de higiene e do bem-estar animal, uma forma conhecida de tornear as regras do comércio livre.
7. O facto da França presidir à União Europeia no segundo semestre de Julho deve significar uma oportunidade perdida de reformar a Política Agrícola Comum.
No passado a PAC distorceu o mercado alimentar mundial exportando excedentes subsidiados, assim desestimulando a produção nos países em desenvolvimento. Agora pretende criar novas barreiras para evitar importações de terceiros países.
Não devemos esquecer que a PAC absorve 55 biliões de euros (metade do orçamento comunitário) e que, no caso de Portugal, a subida das importações alimentares, adicionada à do petróleo, levanta problemas graves à nossa desequilibradíssima balança comercial, difícil de financiar na actual conjuntura."
Pedro Ferraz da Costa
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