segunda-feira, maio 19, 2008

Individualismo

"Já não se suportam vínculos, cuida-se do corpo com dietas, ginástica, próteses, procura-se o sexo fácil e sem compromisso.

Muitos filósofos e sociólogos estão convencidos de que o progresso humano está na emancipação crescente dos indivíduos relativamente aos laços da sociedade, da religião, dos mitos e dos tabus, numa procura racional da sua própria felicidade. Eu nunca acreditei nesta concepção e sempre defendi que a história é o produto de duas forças sociais opostas e complementares. Uma é a transformação não solidarista produzida pelas descobertas científicas e pelas aplicações técnicas e seu aproveitamento por parte dos mais variados indivíduos e grupos. Essa transformação produz progressos científicos e um desenvolvimento económico desregulado que destroem os laços sociais tradicionais e a religião, esvazia as aldeias, despedaça a família, gera individualismo e desordem. No seu tempo, Marx achou que “a anarquia capitalística” iria ser a ruína do capitalismo. Heidegger pensou que a técnica iria substituir Deus. Mas a queda do capitalismo não se deu e Deus não morreu. Porquê? Porque, para além de um certo grau de desordem, movimentam-se também forças solidarísticas, ou seja, os movimentos colectivos políticos, religiosos, sindicais, nacionais que fazem nascer novas fés, outros valores, outros mitos. O que se passa é que, actualmente, destas duas forças, apenas as primeiras, as não solidarísticas, operam na Europa.

É por isso que as religiões, as crenças e os valores tradicionais estão cada vez mais enfraquecidos. O indivíduo pensa nele próprio, nos seus interesses, na sua felicidade. Não suporta vínculos, nem travões, já não tem filhos, cuida do corpo com dietas, ginástica, próteses, procura o sexo fácil e sem compromisso.

Pelo contrário, neste mesmo período, nos países islâmicos prevalecem as segundas forças, ou seja, os movimentos colectivos que se destinam a reconstruir a ‘umma’, a comunidade de crentes, a devolver-lhes os ideais e as virtudes religiosas antigas, e que sacrificam o indivíduo e geram fanatismo e violência. A Europa apaga-se no cinismo permissivo, o Islão arde no rigorismo da utopia.

Para encontrar um equilíbrio, temos de olhar para outro exemplo. Para os Estados Unidos, que conservam uma alma religiosa e ideal ainda que no pragmatismo. Mas sobretudo para países como a China e a Índia que encontraram forças nas suas próprias raízes, nas suas próprias tradições, e entusiasmo, optimismo e fé no futuro ao mesmo tempo que desfrutam do gosto pela liberdade individual outrora ausente. E é esta mistura equilibrada que lhes confere rigor, disciplina e força, mas também o gosto de arriscar, imaginar, sonhar e vencer
."

Francesco Alberoni

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