Filosofia da crise
"Os alicerces da ciência económica precisam de ser reconstruídos. Eis a grande oportunidade de fundar uma nova economia.
Um ano depois do começo da crise nos mercados financeiros o que impressiona é a ligação entre a especulação financeira e a especulação teórica. Não foi apenas o mercado imobiliário que entrou em colapso. Para muitos é todo um edifício teórico, são os alicerces da ciência económica que precisam de ser reconstruídos. Eis a grande oportunidade, não de comprar produtos financeiros em saldo mas de fundar uma nova economia.
George Soros quer fazer as duas coisas. Compra e escreve. Num livro acabado de sair explica o que falhou na economia dos últimos dois séculos. A teoria do equilíbrio de mercado assume que podemos ter um conhecimento mais ou menos perfeito da realidade económica. Neste ponto comete um erro fatal: a realidade económica não existe independentemente do nosso conhecimento desta realidade. Se uma empresa é boa ou má depende em certa medida do modo como a avaliamos. A opinião que fazemos deste empresa modifica os seus fundamentos. A realidade acaba por nos dar razão, mas fomos nós que produzimos essa realidade através da nossa opinião: comprando acções, elevando o preço, facilitando o acesso ao crédito, produzindo uma opinião ainda mais favorável da empresa, num mecanismo acelerador.
A crise financeira ilustra esta coincidência entre realidade e conhecimento, aquilo a que Soros, o primeiro filósofo bilionário da história, chama reflexividade. Imaginem um mercado onde o valor dos activos depende sobretudo da opinião que os investidores têm destes activos. O que cada um pensa depende do que pensam todos os outros. É uma situação extremamente instável, quase como uma fusão em cadeia: cada mudança de sentimento modifica a realidade, produz uma nova mudança de sentimento, e o propulsor acelera, rumo ao céu ou, como no último ano, ao abismo.
Soros é um mau filósofo. Ele próprio confessa, numa linha que me fez rir, que muitas vezes não consegue perceber o que escreveu no dia anterior. Há um ponto importante onde uma mente pouco treinada produz uma conclusão absurda. Para Soros a ideia da reflexividade conduz necessariamente à ideia da regulação política dos mercados. O conhecimento da realidade é impossível porque modifica essa realidade. Logo, não podemos confiar no conhecimento dos agentes económicos. O que Soros parece esquecer é que a regulação sofre do mesmo problema: sempre que o regulador forma uma opinião sobre o que precisa de ser feito esta opinião está necessariamnte errada porque entretanto já modificou a realidade que pretende analisar. Voltámos ao início. Ainda ninguém resolveu o problema."
Bruno Maçães
Um ano depois do começo da crise nos mercados financeiros o que impressiona é a ligação entre a especulação financeira e a especulação teórica. Não foi apenas o mercado imobiliário que entrou em colapso. Para muitos é todo um edifício teórico, são os alicerces da ciência económica que precisam de ser reconstruídos. Eis a grande oportunidade, não de comprar produtos financeiros em saldo mas de fundar uma nova economia.
George Soros quer fazer as duas coisas. Compra e escreve. Num livro acabado de sair explica o que falhou na economia dos últimos dois séculos. A teoria do equilíbrio de mercado assume que podemos ter um conhecimento mais ou menos perfeito da realidade económica. Neste ponto comete um erro fatal: a realidade económica não existe independentemente do nosso conhecimento desta realidade. Se uma empresa é boa ou má depende em certa medida do modo como a avaliamos. A opinião que fazemos deste empresa modifica os seus fundamentos. A realidade acaba por nos dar razão, mas fomos nós que produzimos essa realidade através da nossa opinião: comprando acções, elevando o preço, facilitando o acesso ao crédito, produzindo uma opinião ainda mais favorável da empresa, num mecanismo acelerador.
A crise financeira ilustra esta coincidência entre realidade e conhecimento, aquilo a que Soros, o primeiro filósofo bilionário da história, chama reflexividade. Imaginem um mercado onde o valor dos activos depende sobretudo da opinião que os investidores têm destes activos. O que cada um pensa depende do que pensam todos os outros. É uma situação extremamente instável, quase como uma fusão em cadeia: cada mudança de sentimento modifica a realidade, produz uma nova mudança de sentimento, e o propulsor acelera, rumo ao céu ou, como no último ano, ao abismo.
Soros é um mau filósofo. Ele próprio confessa, numa linha que me fez rir, que muitas vezes não consegue perceber o que escreveu no dia anterior. Há um ponto importante onde uma mente pouco treinada produz uma conclusão absurda. Para Soros a ideia da reflexividade conduz necessariamente à ideia da regulação política dos mercados. O conhecimento da realidade é impossível porque modifica essa realidade. Logo, não podemos confiar no conhecimento dos agentes económicos. O que Soros parece esquecer é que a regulação sofre do mesmo problema: sempre que o regulador forma uma opinião sobre o que precisa de ser feito esta opinião está necessariamnte errada porque entretanto já modificou a realidade que pretende analisar. Voltámos ao início. Ainda ninguém resolveu o problema."
Bruno Maçães
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