segunda-feira, outubro 20, 2008

CML

"Andei enganado durante anos: sempre que queria mudar de casa em Lisboa, consultava as páginas dos jornais. No fim, pagava balúrdios por apartamentos médios. Que idiota. Bastava escrever para a Câmara Municipal de Lisboa, apresentar-me como "jornalista" e esperar por uma chave na volta do correio. Baptista-Bastos não é mais do que eu. Sim, o homem escreveu romances. Mas, em contrapartida, todas as semanas o incontornável BB espirra moralismo nos jornais, vergastando homens sem ética que, ao contrário dele, gostam de comer na gamela pública do orçamento. Baptista-Bastos, não: ele apenas "pediu" uma casa; se os outros a ofereceram, o problema não é dele. De certa forma, e por paradoxal que pareça, Baptista-Bastos tem razão e é injusto que o plumitivo receba sobre o lombo as chicotadas todas da pátria.

Porque, pelos vistos, o esquema durava há trinta anos e, do senhor autarca ao senhor "choffer", toda a gente se lambuzou em propriedades do Estado. Não admira que os principais partidos políticos mantenham sobre o caso um silêncio de ouro, à imagem do que sucedeu com os partidos italianos das últimas décadas que alimentavam iguais esquemas e que um filme recente (O Meu Irmão é Filho Único) aborda com humor gentil. Em Itália, era prática corrente a "construção social" ir parar às mãos de amigos, ou de amigos de amigos. Eu próprio conheci um tribuno italiano que tinha cinco casas, em cinco regiões distintas, graças à máfia da construção. Saber que Lisboa, e provavelmente o país, seguiu à risca estas práticas mafiosas, pode não ser uma boa notícia para os amantes da ética. Mas pode ser uma óptima notícia para o moribundo cinema nacional.
"

João Pereira Coutinho

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