quarta-feira, outubro 29, 2008

LISBOA É PORTUGAL

"Em época de "autárquicas", isto é, durante o longo ano que precede as eleições, a Câmara Municipal de Lisboa preenche mais espaço mediático, como agora se diz, que as restantes 307 autarquias juntas. Há vigorosos debates sobre o embaraço que seria se X tentasse regressar à CML, ou sobre se Y daria um candidato capaz, ou sobre se a liderança da CML permitirá a Z alimentar ambições superiores. Isto claro, se a nação dispuser de um posto superior em prestígio e estatuto à presidência da CML, o que, a avaliar pelo barulho alusivo, é pouco provável.

Mas se o barulho proclama a solenidade da CML, também revela o seu menos solene quotidiano, comum a todos os mandatos. Apenas nas últimas semanas, houve notícias de distribuição de património por amigos, fecho de zonas públicas para publicidade de empresas, arrogância, favores, incompetência, etc. A única promessa que os ocupantes da CML invariavelmente cumprem é a de devolver o Tejo à cidade: mal chove, Lisboa rivaliza com Veneza.

Outra demonstração recente do estilo que habitualmente governa Lisboa prende-se com a empresa municipal que gere a habitação dos pobres. "Gerir" e "pobreza" são aqui conceitos latos, já que em escassos vinte meses de 2006 e 2007 três administradores da tal Gebalis terão gasto uma fortuna em viagens, livros, filmes, discos e refeições (64 mil euros em restaurantes). Não pertencesse o dinheiro aos contribuintes, o investimento dos três funcionários no aprimoramento cultural (e gastronómico) deveria ser louvado. Assim, a coisa não passa de um trivial roubo, igualzinho no método e na provável impunidade à regra do país autárquico, do qual, aliás, a CML não se distingue.

"Caso" após "caso", há quem insista em distingui-la, conferindo ao respectivo chefe uma relevância que, com ou sem culpa do dito, os hábitos da casa não justificam. No que toca a descaramento, a autarquia da capital é tão caipira quanto a de Felgueiras. Se a capital não andasse distraída a rir da província, notaria que os rigorosos rituais de escolha do seu próprio presidente pecam por exagero: na realidade, para presidir àquela desavergonhada balbúrdia qualquer um serve, embora, dadas as dimensões da desvergonha e da balbúrdia, a CML de facto não sirva a qualquer um.
"

Alberto Gonçalves

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