A língua escancarada
"Na entrega do prémio da editora Leya, o prof. Cavaco relembrou a importância da "língua comum". Nada de novo. Quando não estão a destruí-la com aquele jargão repleto de "âmbitos", "níveis", "valências" e, agora, "empoderamentos", os políticos louvam imenso a "língua comum" e, implicitamente, o seu veículo preferencial: o Acordo Ortográfico.
É verdade que os leigos não entendem o relevo de um arranjinho que muda apenas 2% de uma língua com diferenças mínimas entre os seus falantes. É por isso que são leigos. Os peritos, como o professor da Academia Brasileira de Letras Evanildo Cavalcante, que recentemente nos visitou, percebem que só o português "unificado" permitirá "escancarar" (sic) a sua divulgação.
Até ouvir o prof. Cavalcante, eu próprio julgava que a subalternização do português no mundo se devesse a inúmeros factores: não ser a língua partilhada pelos dois últimos impérios da Terra, não ser falado nos principais centros científicos, académicos, industriais e comerciais, não possuir uma tradição literária excessivamente rica, não dispor da difusão facilitada pelo audiovisual ou pela informática e, em suma, não ser o inglês. Erro meu. Afinal, o factor é um e assaz pedestre: o português é secundário porque existem umas consoantes mudas e uns tremas que o impedem de alcançar a pujança a que tem direito.
Não se tem dado o devido destaque aos milhões de brasileiros que tentaram ler Pessoa no original e, embora compreendessem perfeitamente 98% do texto, desistiram fustigados pelos 2% restantes. Bastou um "fato" que se vestia e um "terno" que era meigo para estraçalhar a comunicação. E eu nunca acabei as Memórias Póstumas de Brás Cubas por causa do "tranqüilo" logo no capítulo VII. Que diabo é "tranqüilo"? Não sei e, o que é melhor, o AO dispensa-me de saber.
Graças ao AO, aproxima-se o dia em que portugueses e brasileiros (e angolanos, etc.) lerão o mesmo, o dia em que Paulo Coelho e José Rodrigues dos Santos (e Pepetela) escreverão o mesmo, o dia em que a língua enfim unida jamais será vencida e seguirá por aí a escancarar barreiras e a subjugar o mundo. Vai ser bom, não vai? E se os nossos irmãos brasileiros decifrassem o significado da palavra, eu diria que vai ser óptimo. "
Alberto Gonçalves
É verdade que os leigos não entendem o relevo de um arranjinho que muda apenas 2% de uma língua com diferenças mínimas entre os seus falantes. É por isso que são leigos. Os peritos, como o professor da Academia Brasileira de Letras Evanildo Cavalcante, que recentemente nos visitou, percebem que só o português "unificado" permitirá "escancarar" (sic) a sua divulgação.
Até ouvir o prof. Cavalcante, eu próprio julgava que a subalternização do português no mundo se devesse a inúmeros factores: não ser a língua partilhada pelos dois últimos impérios da Terra, não ser falado nos principais centros científicos, académicos, industriais e comerciais, não possuir uma tradição literária excessivamente rica, não dispor da difusão facilitada pelo audiovisual ou pela informática e, em suma, não ser o inglês. Erro meu. Afinal, o factor é um e assaz pedestre: o português é secundário porque existem umas consoantes mudas e uns tremas que o impedem de alcançar a pujança a que tem direito.
Não se tem dado o devido destaque aos milhões de brasileiros que tentaram ler Pessoa no original e, embora compreendessem perfeitamente 98% do texto, desistiram fustigados pelos 2% restantes. Bastou um "fato" que se vestia e um "terno" que era meigo para estraçalhar a comunicação. E eu nunca acabei as Memórias Póstumas de Brás Cubas por causa do "tranqüilo" logo no capítulo VII. Que diabo é "tranqüilo"? Não sei e, o que é melhor, o AO dispensa-me de saber.
Graças ao AO, aproxima-se o dia em que portugueses e brasileiros (e angolanos, etc.) lerão o mesmo, o dia em que Paulo Coelho e José Rodrigues dos Santos (e Pepetela) escreverão o mesmo, o dia em que a língua enfim unida jamais será vencida e seguirá por aí a escancarar barreiras e a subjugar o mundo. Vai ser bom, não vai? E se os nossos irmãos brasileiros decifrassem o significado da palavra, eu diria que vai ser óptimo. "
Alberto Gonçalves
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