segunda-feira, abril 13, 2009

O povo é sereno

"Quem leia com atenção os jornais não pode ficar indiferente ao peso da informação que nos chega, à sobrecarga de tensões que se acumulam na sociedade. Em bom rigor, o que a democracia portuguesa precisava era de uma boa massagem.

Mas não restem ilusões: com eleições marcadas para daqui a seis semanas, não há paz no horizonte - só fumo. Ou será só fumaça?

No topo da agenda mediática continua a Justiça - ou a falta dela. Começa nos sucessivos casos que entram nos tribunais com uma mão cheia de polémica e saem deles com uma mão cheia de nada. Nas últimas duas semanas, vimos o desfecho do costume com Avelino Ferreira Torres e com Pinto da Costa, inocentados pelos juízes depois de anos em lume brando.

Estes casos deviam ir para os livros. Passámos anos a falar deles para mostrar ao país como os grandes iam ser apanhados, como os tribunais funcionavam. Até os partidos usaram estes casos (e outros em tudo semelhantes) para mudar leis ou prometer mudá-las em breve. E, findo o caso, na história ficará a tal palavra: inocente.

Nada disto seria dramático se, dos sucessivos casos que passam pelos tribunais e pelas páginas dos jornais, algum tivesse acabado em "culpado". Desta palavra, só há mesmo memória de um juiz a ter dito a Domingos Névoa, condenado a uma multa de 5.000 euros por ter tentado corromper o vereador José Sá Fernandes. Sim, cinco mil euros.

Se, no meio de toda esta névoa, da fumaça do costume, restasse algum optimismo sobre o futuro das investigações criminais em Portugal, um ex-Procurador Geral da República, Souto Moura, decidiu pôr cobro a tal ignomínia. "Segundo o meu irmão, os únicos condenados [no processo Casa Pia] serão o Bibi e eu próprio". Uma sentença de morte.

O filme prossegue, com o caso Freeport: o sindicato denuncia pressões, conversas privadas entre magistrados aparecem transcritas nos jornais, o PGR promove acareações públicas, políticos lançam pequenas farpas e os amigos defendem-se uns os outros. Tudo como se não houvesse amanhã.

No meio de tal alucinação colectiva, só duas pessoas mantêm a lucidez de permanecer em silêncio. O Presidente da República, a quem cabe zelar pela normalidade do sistema. E o primeiro-ministro que, dissesse o que dissesse, seria sempre acusado de ter falado a mais, ou a menos - conforme os interesses.

Excepções à parte, há muitos responsáveis que, 35 anos depois da revolução e 34 depois do PREC, assobiam para o ar como fez Pinheiro de Azevedo. E não percebem que os sinais que sentimos no ar são mais do que fumaça e podem bem cair-lhes em cima
."

David Dinis

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