domingo, abril 19, 2009

O regresso dos fantasmas

"A situação herdada em 2005 era medonha: 6,1% de défice, mais do dobro do limite permitido. E, para grandes males, grandes remédios: o Governo propunha-se equilibrar as contas até ao exercício de 2010.

Armas a utilizar: crescimento económico, moderação salarial, recuperação de atrasados - e, no limite, se necessário, cortes no investimento público. O plano arrancou muito bem, e no final de 2007 o défice já estava em 2,6%.

Mas sobreveio uma crise do tamanho do mundo. A maior de que há memória nos últimos oitenta anos. E os objectivos, por muito meritórios que fossem, tiveram de ser alterados. A prioridade já não era o futuro, mas o presente; não era o défice, mas as pessoas: os pobres, os endividados, os desempregados, os sem ninguém. E o país, sem que déssemos por isso, ficou cercado. Amarrado. Hoje todos exigem tudo e ninguém parece ao corrente do que se está a passar.

A este cerco o Governo tem respondido com medidas avulsas, aparentemente sem critério, numa ânsia incontida de salvar tudo o que mexe. É uma atitude humanamente defensável, mas também economicamente suicida, porque deixámos de ser racionais. Não se pode salvar tudo. Não teríamos sequer dinheiro para o fazer. Mas foi a pensar nos "estímulos" que adormecemos à sombra do orçamento - até que Bruxelas nos desperte. Não vai demorar muito...

O futuro próximo é hoje fácil de desenhar: recessão económica, baixa inflação, desemprego de dois dígitos, défice incomportável, endividamento explosivo. E é com este enquadramento que vamos ter de viver a partir de Outubro. Arrisco um número: no final de 2009, o défice será pelo menos igual ao que herdámos de 2005 - mas com uma dívida maior. Única certeza: vamos pagar isso com língua de palmo. Se necessário à força.

Era aqui que pretendia chegar: os fantasmas estão de volta. O fantasma do défice, o fantasma da dívida, o fantasma da austeridade necessária para os combater. Com uma diferença: estes fantasmas refinaram a maldição. O que se passa é de tal modo grave, de tal modo dramático, que bem justificaria um debate político no Parlamento. De olhos nos olhos. E com sentido de Estado. Mas quem se preocupa com ninharias quando vêm aí três eleições?
"

Daniel Amaral

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