A insegurança na economia
"O dinheiro sujo em Portugal não precisa de 'offshores' para se esconder.
Os notários têm uma função muito importante na sociedade e na economia. Eles realizam um controlo imparcial e prévio da legalidade dos negócios das partes. Por isso, os documentos notariais são dotados de uma publicidade e força executiva semelhantes às das sentenças.
Com a privatização do notariado, o Estado aboliu a figura do notário funcionário público e introduziu a figura do notário privado. O propósito da reforma era simples: a função notarial poderia ser exercida por profissionais liberais com mais eficiência e menos encargos para o erário público. Por outro lado, a reforma evitou uma desregulação do exercício da profissão, pois os notários continuaram sujeitos a um regime apertado de ingresso, exclusividade, impedimentos, incompatibilidades e controlo disciplinar.
Contudo, desde 2005, o Estado tem procedido à desformalização dos actos tradicionalmente incluídos no âmbito da função notarial e à "renacionalização" das funções do notariado, por via do alargamento das competências das conservatórias. Através dos vários programas do Simplex, o Estado tem atribuído às conservatórias competência para o exercício de funções incluídas na actividade notarial.
Esta política do Estado tem três consequências gravíssimas. A primeira consequência é o aumento da insegurança da vida económica do País. A introdução do registo por depósito dos actos mais importantes da vida das empresas levou a uma situação de grave insegurança dos negócios das empresas, pois o registo de operações societárias pode ser feito com base na simples declaração do interessado no registo. Por isso se repetem as situações de registos de actos ilegais, de que são exemplo flagrante as cessões de quotas entre cônjuges.
A segunda consequência desta política é fácil de ver: a multiplicação das situações de registos ilegais levou em linha recta ao aumento dos processos nos tribunais comerciais. Esta explosão da litigiosidade judicial fica a dever-se à opção de desformalizar completamente os contratos referentes às operações societárias e privar essas operações de um controlo imparcial e prévio da legalidade pelos notários ou conservadores. A situação agrava-se ainda mais quando se torna possível que funcionários com a 4.ª classe procedam a actos que anteriormente estavam confiados aos notários.
A mesma situação se verifica no registo predial, com o desaparecimento do controlo imparcial e prévio da legalidade na transmissão de imóveis, o que permite uma multiplicação dos negócios fraudulentos. A política do Estado não tem, pois, efeitos nefastos apenas para as empresas, mas também para a vida das famílias.
Esta desformalização dos contratos referentes às operações societárias e à transmissão de imóveis tem uma terceira consequência mais grave ainda: ela favorece a entrada de capitais ilícitos na economia, pela razão simples de que as regras prudenciais de combate ao branqueamento de capitais não são aplicáveis nos casos de registo por depósito. Assim, o dinheiro sujo em Portugal não precisa de offshores para se esconder!"
Paulo Pinto de Albuquerque
Os notários têm uma função muito importante na sociedade e na economia. Eles realizam um controlo imparcial e prévio da legalidade dos negócios das partes. Por isso, os documentos notariais são dotados de uma publicidade e força executiva semelhantes às das sentenças.
Com a privatização do notariado, o Estado aboliu a figura do notário funcionário público e introduziu a figura do notário privado. O propósito da reforma era simples: a função notarial poderia ser exercida por profissionais liberais com mais eficiência e menos encargos para o erário público. Por outro lado, a reforma evitou uma desregulação do exercício da profissão, pois os notários continuaram sujeitos a um regime apertado de ingresso, exclusividade, impedimentos, incompatibilidades e controlo disciplinar.
Contudo, desde 2005, o Estado tem procedido à desformalização dos actos tradicionalmente incluídos no âmbito da função notarial e à "renacionalização" das funções do notariado, por via do alargamento das competências das conservatórias. Através dos vários programas do Simplex, o Estado tem atribuído às conservatórias competência para o exercício de funções incluídas na actividade notarial.
Esta política do Estado tem três consequências gravíssimas. A primeira consequência é o aumento da insegurança da vida económica do País. A introdução do registo por depósito dos actos mais importantes da vida das empresas levou a uma situação de grave insegurança dos negócios das empresas, pois o registo de operações societárias pode ser feito com base na simples declaração do interessado no registo. Por isso se repetem as situações de registos de actos ilegais, de que são exemplo flagrante as cessões de quotas entre cônjuges.
A segunda consequência desta política é fácil de ver: a multiplicação das situações de registos ilegais levou em linha recta ao aumento dos processos nos tribunais comerciais. Esta explosão da litigiosidade judicial fica a dever-se à opção de desformalizar completamente os contratos referentes às operações societárias e privar essas operações de um controlo imparcial e prévio da legalidade pelos notários ou conservadores. A situação agrava-se ainda mais quando se torna possível que funcionários com a 4.ª classe procedam a actos que anteriormente estavam confiados aos notários.
A mesma situação se verifica no registo predial, com o desaparecimento do controlo imparcial e prévio da legalidade na transmissão de imóveis, o que permite uma multiplicação dos negócios fraudulentos. A política do Estado não tem, pois, efeitos nefastos apenas para as empresas, mas também para a vida das famílias.
Esta desformalização dos contratos referentes às operações societárias e à transmissão de imóveis tem uma terceira consequência mais grave ainda: ela favorece a entrada de capitais ilícitos na economia, pela razão simples de que as regras prudenciais de combate ao branqueamento de capitais não são aplicáveis nos casos de registo por depósito. Assim, o dinheiro sujo em Portugal não precisa de offshores para se esconder!"
Paulo Pinto de Albuquerque
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