Direito à diferença, dever de semelhança
"Há oito dias, escrevi aqui sobre o casamento "gay" e diversos e-mails chamaram-me "homofóbico primário" (para amavelmente me distinguir dos secundários, suponho). A razão? Decerto não foi por causa da parte em que confessei não ter nada contra semelhante matri- mónio. Talvez se deva à parte em que, a propósito do referendo rejeitado pelo PS, admiti a hipótese de alguém ter.
Limitei-me a recordar que convém à lei reflectir uma espécie de consenso social, ou seja, que às vezes é útil ouvir as pessoas sobre matérias em que, gostemos ou não, o juízo das pessoas pesa. Claro que é discutível fazer depender de opiniões alheias uma questão essencial como, digamos, o direito de voto de determinados grupos (e no entanto isso acontece, conforme se constata nos menores de 18 anos e nos dementes). Mas, pelo seu carácter acessório, o casamento gay é um exemplo em que a "vontade geral" deve fundamentar ou no mínimo influenciar a legislação. Os casamentos polígamos ou incestuosos são outros. Teoricamente, em nenhum dos casos se joga a vida ou a dignidade humanas (o casamento é somente "um papel", lembram-se?). Teoricamente, em nenhum dos casos existem motivos "racionais" que impeçam tais enlaces: só a lei, e o julgamento "popular" por detrás dela.
O casamento "gay", porém, suscita um empenho político que os demais exemplos não merecem. Porquê? O argumento "oficial" é o de que, ao invés da poligamia ou do incesto, os actos homossexuais formam uma "identidade". O argumento autêntico é o de que, sob pena de "fractura" excessiva, até as causas "fracturantes" necessitam do aval, ainda que minoritário, de uma considerável parcela da sociedade.
No primeiro caso, usa-se o conceito que a psiquiatria inventou para "demonizar" a homossexualidade, associando-a a indivíduos e não a comportamentos. No segundo caso, usa-se a opinião de terceiros para legitimar a dispensa da opinião de terceiros. Tradução: os entusiastas do casamento gay cometem aquilo de que me acusam e condenam-me por aquilo que praticam, incoerências desculpáveis em campeões da tolerância que odeiam os que toleram coisas distintas. Ou as mesmas, só que sem a fúria e os interesses eleitorais. "
Alberto Gonçalves
Limitei-me a recordar que convém à lei reflectir uma espécie de consenso social, ou seja, que às vezes é útil ouvir as pessoas sobre matérias em que, gostemos ou não, o juízo das pessoas pesa. Claro que é discutível fazer depender de opiniões alheias uma questão essencial como, digamos, o direito de voto de determinados grupos (e no entanto isso acontece, conforme se constata nos menores de 18 anos e nos dementes). Mas, pelo seu carácter acessório, o casamento gay é um exemplo em que a "vontade geral" deve fundamentar ou no mínimo influenciar a legislação. Os casamentos polígamos ou incestuosos são outros. Teoricamente, em nenhum dos casos se joga a vida ou a dignidade humanas (o casamento é somente "um papel", lembram-se?). Teoricamente, em nenhum dos casos existem motivos "racionais" que impeçam tais enlaces: só a lei, e o julgamento "popular" por detrás dela.
O casamento "gay", porém, suscita um empenho político que os demais exemplos não merecem. Porquê? O argumento "oficial" é o de que, ao invés da poligamia ou do incesto, os actos homossexuais formam uma "identidade". O argumento autêntico é o de que, sob pena de "fractura" excessiva, até as causas "fracturantes" necessitam do aval, ainda que minoritário, de uma considerável parcela da sociedade.
No primeiro caso, usa-se o conceito que a psiquiatria inventou para "demonizar" a homossexualidade, associando-a a indivíduos e não a comportamentos. No segundo caso, usa-se a opinião de terceiros para legitimar a dispensa da opinião de terceiros. Tradução: os entusiastas do casamento gay cometem aquilo de que me acusam e condenam-me por aquilo que praticam, incoerências desculpáveis em campeões da tolerância que odeiam os que toleram coisas distintas. Ou as mesmas, só que sem a fúria e os interesses eleitorais. "
Alberto Gonçalves
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