sexta-feira, janeiro 29, 2010

O comércio (legítimo) das agências de rating

"As agências de rating fixam um preço ao dinheiro. A estratégia comercial não lhes pertence - cabe aos países. O que elas dizem é determinante para venderem dívida.

O ministro das Finanças disse: "As agências de rating são empresas com estratégia comercial." Percebe-se a ideia: ninguém gosta de ver uns rapazes de fora sublinharem a fraca competitividade da economia nacional ou a dificuldade em encontrar soluções para reduzir a despesa pública. Percebe-se, mas não se aceita. Teixeira dos Santos regulou o mercado de capitais (CMVM) antes de ser ministro e conhece, até pelas suas extraordinárias competências técnicas, a linguagem agressiva dos mercados. E sabe: os países hoje são empresas - precisam de atrair investimento externo, criar produtos com potencial de exportação e atrair investidores. Sabe, mas não resistiu à tentação.

E vale a pena esclarecer o problema, regressando ao Orçamento do Estado: as agências de rating, por mais erradas que tenham estado na crise, são ouvidas pelo mercado. Vítor Bento explicou-o numa entrevista ao i (que pode reler em www.ionline.pt): se o mercado e os investidores continuam a ouvir as agências de rating, então o que elas dizem é válido. E o que elas dizem, naturalmente, tem estratégia comercial. Não para elas - para Portugal. É um jogo simples. Repare-se:

Os países emitem obrigações do Tesouro e outros títulos de dívida soberana (soberana porque é do país) para se financiarem. Ora o preço que o país terá de pagar por essas obrigações (o prémio, ou juro, que devolvem a quem compra esses títulos) é tanto maior quanto mais agressivas e críticas forem as agências de rating. Neste momento, as agências explicam aos investidores que só devem comprar dívida portuguesa se esse prémio (juro) for 1,149% superior ao que paga a dívida alemã (sexta-feira passada era 1,04% a mais ).

No Orçamento do Estado percebe-se que Portugal vai emitir 17 mil milhões de euros em produtos de dívida, o que torna simples a conta - ou melhor: a importância das agências de rating. Aquelas palavras duras obrigam o estado português a pagar mais 195 milhões de euros que a Alemanha (preços de ontem) pelo mesmo dinheiro. É muito. A Grécia está pior, claro - se decidisse emitir os mesmos 17 mil milhões de dívida, a desconfiança das agências de rating obrigaria a que pagasse mais 7% (isso, sete por cento) pelo mesmo dinheiro: mais caro 640 milhões (do que a Alemanha).

É evidente que um ministro das Finanças tem de pressionar as agências de rating. Faz parte do seu trabalho. De resto, as equipas destas agências reúnem-se com o staff do ministro - e aí podem ser influenciadas (como qualquer pessoa) por um discurso determinado e responsável. De resto, são os emissores que pagam a existência destas agências (o que explica parte das críticas). O que não faz sentido é imaginar que os portugueses não sabem que um país, hoje, tem de ter uma estratégia comercial clara - que também passa por tentar pagar o menos possível quando compra dinheiro.
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Martim Avillez Figueiredo

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