segunda-feira, janeiro 25, 2010

Passos perdidos

"Há semanas, um amigo que também é amigo de um ex-presidente do PSD jurou-me, durante o jantar, que o partido não aguentará nova liderança falhada. Por gentileza, perguntei-lhe qual dos plausíveis líderes evitará o falhanço. Ele revirou os olhos, acabou o copo de vinho, acendeu um cigarro e, num ápice, a conversa reverteu para a chuva que não acaba.

Um destes dias, talvez acabe o PSD. Por regra, a principal força da oposição cresce, simbólica e eleitoralmente, em função do declínio da força no poder. Ao não retirar qualquer benefício da decomposição acelerada do Governo, o PSD actual conseguiu a proeza de implodir essa lei tácita. Dadas as alternativas, o PSD futuro ameaça proezas ainda maiores.

A alternativa confirmada chama-se Pedro Passos Coelho. As alternativas presuntivas chamam-se Aguiar-Branco, Marcelo Rebelo de Sousa, Paulo Rangel, Santana Lopes e um longo elenco de secundários. Passos Coelho tem a vantagem de possuir bons apoios na área política do PSD e a desvantagem de possuir óptimos apoios no PS, o que lança relativo mistério em volta das reais intenções de "mudança", o tema do seu recente livrinho ("Não foi inspirado por Obama", garantiu). Os restantes, e eventuais, candidatos têm a vantagem de não querer ser Passos Coelho e a desvantagem de ninguém perceber ao certo o que, fora esse louvável feito, eles de facto querem.

Tudo somado, eis o problema, de resto já admitido por Marques Mendes: há demasiados anos que a luta pela chefia do PSD se esgota em si mesma. Perdidos em remoques codificados para consumo interno, os concorrentes ao cargo aparentemente esqueceram-se de que em redor do partido existe um país, ou no mínimo um eleitorado potencial que não se reduz à militância e não está exactamente fascinado pelo cisma bases/barões ou pelos múltiplos grupinhos, alguns de um solitário elemento, em que o partido se decompõe, pelos vistos literalmente.

É possível que a próxima fase da decomposição seja a eleição de Passos Coelho, não graças ao vazio algo egocêntrico do discurso mas à falta de comparência. Pelo menos à comparência de um adversário a sério, sem nódoas de fracassos passados e com propósitos um bocadinho mais abrangentes do que meramente impedir a vitória de uma réplica, no sentido sísmico, do eng. Sócrates. Por isto e por aquilo, o único nome que me ocorre é o de Rui Rio, que não entra nas contas correntes. Talvez Rio espere o seu momento, embora se arrisque a que o PSD, sob ameaça de implosão ou irrelevância, não espere por ele. Se o PSD não se interessa pelo País, porque haveria o País de se interessar pelo PSD?
"

Alberto Gonçalves

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