segunda-feira, maio 24, 2010

Tratar a crise com os pés

"Carlos Queiroz, vulgo O Professor, sugeriu há dias que a selecção nacional "pode funcionar como um estímulo e um capital importante de auto-estima para os portugueses". É um pensamento monumental, aliás à medida do autor. Inúmeros estudos provam que o desempenho desportivo de uma nação reflecte-se no comportamento dos respectivos cidadãos e, consequentemente, nos indicadores colectivos de progresso. E se os estudos não bastassem, a realidade é avassaladora.

O Luxemburgo, por exemplo, é um território deprimido e indigente porque nunca se habituou a celebrar vitórias em competições internacionais, incluindo na bisca lambida. Já os habitantes do Quénia e da Jamaica, estimulados pelos campeões do atletismo, acumularam o capital de auto-estima necessário para transformar esses países nos portentos de prosperidade que, hoje, inegavelmente são.

Portugal é um caso intermédio. De vez em quando, há uma competição internacional, por regra de futebol, que corre razoavelmente. É nesses momentos que o optimismo do povo se alarga, por processos que apenas os místicos conhecem, à economia.

Infelizmente, tais momentos não abundam, e há meia dúzia de anos que não existem de todo. Donde a penúria em curso, económica porque anímica e anímica porque desportiva.

É verdade que o recente campeonato do Benfica empolgou seis milhões dos nossos compatriotas, entretanto estimuladíssimos em benefício da pátria. Mas é preciso ter em conta os quatro milhões que o mesmo campeonato acabrunhou e que, pelo menos durante umas semanas, querem que a pátria se lixe. É por causa disso que os torneios internos não ajudam à confiança de que os portugueses carecem.

O Mundial da África do Sul, porém, constitui uma extraordinária oportunidade para inverter o desesperado estado das coisas. Se a selecção se portar bem, cada drible de Cristiano Ronaldo terá efeitos imediatos nos números do desemprego. Cada golo ao Brasil contribuirá para a redução do défice. Cada vitória empurrará multidões para as ruas, a transbordar de auto-estima e Super Bock. Mal contemplem esses milhares de criaturas aos gritos de "Somos os maiores!", "Já ganhamos!" e "Até os comemos!", as agências de rating não terão outro remédio senão reconhecer que, de facto, somos, ganhamos e comemos.

E se a selecção se portar mal
?"

ALBERTO GONÇALVES

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