quarta-feira, maio 04, 2011

Feliz ano novo

"Quando Pedro Passos Coelho pediu a Bruxelas, há meses, que Portugal tivesse mais um ano para reduzir o défice, foi chamado de imaturo, irresponsável, desestabilizador.


Ontem, Portugal ganhou o que Passos Coelho pediu. Ainda bem. O que vamos agora fazer para que mais um ano não seja um ano a mais?

Só hoje conheceremos o programa de austeridade do FMI, BCE e UE. Será mais duro que o PEC IV. Mas menos duro que o "PEC V" que chegou a ser efabulado. Assistiremos agora ao debate político da vitória: o jogo d' "a culpa é deles" passou agora a "o mérito é nosso". Os jogadores são os mesmos: PS, PSD e PP. E são três, de facto, os que merecem o maior elogio pela tolerância dada ontem a Portugal. Mas são outros três: FMI, UE e BCE. Um pouco de gratidão seria melhor que a soberba.

A intervenção externa na Grécia foi autoritária, rancorosa e improvisada. Em Portugal será apenas autoritária. A troika deu-nos mais um ano para reduzir o défice orçamental, não por clemência, mas por acreditar que o sucesso do seu "plano" é mais possível desta forma.

O júbilo de Sócrates ontem é, no entanto, dispensável. A austeridade que já acumulamos e a nova que enfrentamos mereciam um mínimo de pudor. Mas as eleições são como o Carnaval, já ninguém leva a mal: os políticos são apenas as suas máscaras.

À boa notícia de ontem segue-se o detalhe hoje. Há três tipos de medidas: as da consolidação orçamental para baixar défice e dívida; as de política económica para aumentar o crescimento potencial; e as de sustentabilidade do sistema financeiro.

Os reformados vão ter as pensões acima de 1.500 euros cortadas. 1,4 milhões de famílias de trabalhadores e pensionistas da classe média vão pagar mais IRS (através dos limites às deduções de saúde e educação). O Estado vai privatizar o que puder a preços de liquidação total. O subsídio de desemprego vai ser reduzido e o despedimento será mais barato. Os apoios à compra de habitação própria serão cortados. Os bancos vão ser forçados a conceder menos crédito. As empresas públicas de transporte vão ser espremidas. A subida do IVA, em contrapartida da descida da taxa social única das empresas, fica em estudo.

Tudo isto é para quê? Para virar para cima o país que está ao contrário. A troika não se comportou como um cobrador de fraque, que viesse executar as dívidas. Trouxe, como hoje veremos, um plano estratégico para tornar a economia mais competitiva e justa. Os portugueses, conservadores, vão odiar. Mas os liberais estão agora no poder. Não são portugueses nem foram eleitos por portugueses, mas estão no poder.

A banca vai levar uma valente chicotada mas vai ter protecção no acesso à liquidez. Essa liquidez será depois injectada na economia, com condições. As leis de trabalho serão flexibilizadas, a mobilidade social aumentará, os aumentos salariais dependerão da produtividade em vez da inflação, aprenderemos a ter uma vida baseada na economia nominal, sem alavancas. As empresas em sectores protegidos perderão privilégios, haverá mais concorrência. A Justiça, espera-se, será desarmadilhada.

Temos um novo ano para esta tarefa. Não vai ser de arromba, vai ser um rombo. Que seja para mudar de vida. Antes de vida que de moeda, de soberania, de país. Feliz ano novo.
"

Pedro Santos Guerreiro

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