sexta-feira, maio 20, 2011

Sobre a TSU

"A discussão à volta da Taxa Social Única (TSU) tem sido muito pobre e, como parece cada vez mais inevitável, rapidamente resvalou para a demagogia, apesar de o tema ter destaque no MOU assinado entre o Governo (que, como é seu hábito em tudo o que é incómodo, finge que não) e a Troika. E de o líder desta lhe ter atribuído um papel de “mudança de jogo”.

Em causa está uma possível redução da TSU - compensando a perda de receita fiscal com outros impostos, nomeadamente sobre o consumo (que não desenvolvo por falta de espaço) - por forma a aliviar os custos laborais, tem em vista emular os efeitos de uma desvalorização cambial.

Esta funciona através de 2 mecanismos: a) altera, a favor dos primeiros, o preço relativo entre o sector transaccionável (ST) e o não transacionável (SNT), pois que a desvalorização da moeda inflaciona o preço do ST em moeda nacional; b) embaratece o custo laboral, em termos reais, uma vez que a inflação gerada "come" parte do salário nominal.

Neste caso o que se pretende é conseguir o segundo efeito, reduzindo o custo laboral pela diminuição da fiscalidade sobre a factura salarial das empresas. A ideia é que, reduzindo os custos de produção, as empresas possam baixar os seus preços, tornando-se mais competitivas, e vender mais (exportando ou substituindo importações no mercado interno).

O problema é que, se não for possível emular também o primeiro efeito acima explicado, esta acção acabará por se tornar num bónus à rentabilidade do SNT e assim apertar ainda mais o "nó cego" da economia. Essa emulação é mais difícil, uma vez que, não se podendo agora inflacionar o ST, o efeito só se poderá alcançar por deflação do SNT e esta dificilmente será conseguida sem uma intervenção "administrativa". Em teoria, nas actividades onde a concorrência e a elasticidade procura/preço são maiores, os preços poderão ajustar pelo aperto da procura interna. Mas nas actividades com menor concorrência efectiva e baixa elasticidade, não há automatismo que funcione.

Em qualquer caso, se este efeito não for acautelado, há um sério risco de se fracassar no objectivo de "mudar o jogo". O mesmo acontecendo se a medida "central" for tímida ou "gradual" (?!).

Sobre a sua utilidade, não hajam dúvidas de que a produtividade é a variável chave para a competitividade saudável. Mas nessa frente só se conseguem resultados num horizonte de médio e longo prazo. Até lá temos um problema sério de desemprego, agravado com as medidas recessivas para estabilizar a situação financeira. Para minorar este problema só uma redução dos custos de produção - laborais e dos consumos intermédios provenientes do SNT - poderá produzir um estímulo económico nesse sentido.

Esse estímulo põe-nos a competir num patamar mais baixo? Sim, mas pode fazer-nos crescer (ou decrescer menos) e proteger o emprego. O resultado é certo? Não. É possível? Sim. É provável? Sim. Vale a pena? Depende da função de preferência de quem decide e de quem apoia o decisor, pois a escolha é: a) não fazer nada e assumir a queda do PIB e o aumento do desemprego resultantes da austeridade, quaisquer que sejam; ou b) tentar uma via que, não sendo ideal nem garantida, abre uma janela de possibilidade para mitigar aqueles efeitos e relançar o crescimento.

Se o decisor e a sua base de apoio estiverem predominantemente no SNT, qual será a preferência?
"

Vitor Bento

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