domingo, novembro 20, 2011

O Duque de Caracas

"No número 224 da Zon está a VTV. A VTV é a emissora, ou uma das emissoras, a serviço de Hugo Chávez. Por perversão, às vezes espreito aquilo. O resultado é insusceptível de descrição adequada: normalmente, há um caipira com pretensões "revolucionárias" a explicar ao povo porque é que o Grande Líder é tão sábio, magnânimo e popular. Às vezes, os caipiras são dois ou três, numa espécie de debate em que o único tema discutível é apurar qual dos participantes elogia mais o Grande Líder. Frequentemente, o assunto desvia-se para a oposição ao Grande Líder e aqui os comentários dos caipiras dividem-se: ou se riem às gargalhadas da impotência da oposição ou, com ar sinistro, aconselham a oposição a limitar-se à impotência. "Eles" mandam; os "outros", se tiverem juizinho, obedecem. No seu site, a Zon descreve o VTV como "O canal de todos os venezuelanos. Este canal pertence ao governo Venezuelano (com maiúscula) e emite conteúdos de interesse nacional."

Esse exacto tipo de "interesse nacional" é igualmente invocado por João Duque, o economista que coordena o grupo de trabalho encarregado de estudar a reestruturação da RTP, de modo a legitimar a subjugação da RTP Internacional (e, ao que percebi, da RTP África) ao Governo e, em particular, ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. O canal dos sonhos do dr. Duque seria a "janela" (sic) do país para "os portugueses da diáspora e os estrangeiros". À superfície, a sua função consistiria em divulgar a noção de que Portugal tem "produtos bons" e um "turismo de qualidade", além da indispensável promoção da "cultura" e da "língua".

Descrita enquanto o típico "televendas" de fancaria, a coisa já é bonita. Mas a coisa, de que Paulo Portas se apressou a afastar, ainda melhora. No fundo, o evangelho televisivo segundo o dr. Duque pressupõe um serviço de pura propaganda: os governos devem tratar a comunicação, leia-se a informação, "à luz daquilo que é a sua política de relações externas". Desde que "sufragado em votos", o poder político, sempre de acordo com o dr. Duque, é livre de "manipular, opinar, modificar". É, conclui o dr. Duque, "assim mesmo, à dura". Sobretudo, concluo eu, para o contribuinte.

Perante isto, apetece perguntar ao dr. Duque onde é que ele desencantaria um Governo capaz de distinguir entre o abstracto "bem da nação" (palavras dele) e os interesses dos partidos e das pessoas que o integram. Porém, é muito mais urgente perguntar ao Governo onde desencantou o dr. Duque. Eu aposto em Caracas
."

Alberto Gonçalves

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