A hora da verdade
"Se a extrema-esquerda conseguir formar Governo na Grécia vai ter de fazer a escolha que queria evitar. Se não conseguir, o impasse político que resultou das eleições de 6 de Maio encarregar-se-á de preencher o vazio de poder. Em qualquer das situações, convém que a Zona Euro comece já a preparar-se para enfrentar o cenário de perda de um dos seus membros.
A hora da verdade está a chegar. Para a Grécia e para os seus parceiros no espaço da moeda única. No vendaval que reduziu a um peso minoritário os dois partidos que apoiam o cumprimento do acordo com a troika, os eleitores fizeram as suas escolhas legítimas. Mas não é certo, nem seguro, que estivessem preparados para enfrentar as consequências.
Os cidadãos gregos têm muitos e bons motivos para quererem mudar de protagonistas políticos. O currículo dos partidos que ocuparam o poder desde a adesão do país ao euro está longe de ser brilhante. Em vez de fazerem as reformas que a presença na moeda única exigia, aspecto em que não foram os únicos a pecar, entretiveram-se a fazer algo muito mais fácil. Esconderam informação, maquilharam dados estatísticos, criaram a ilusão de que a economia e as finanças públicas estavam bem, quando na realidade estavam bem mal.
Quem engana e vive no engano, raramente acredita que um acontecimento que não controla possa, um dia, levantar o tapete e deixar à vista o lixo que se tentou ocultar. Foi isto que a crise internacional fez. À Grécia, mas não só. A necessidade de recorrer a apoio financeiro externo em troca da correcção dos erros do passado teve um preço chamado austeridade, recessão, desemprego e a evaporação de um quinto do produto interno bruto do país.
É um caminho duro, também feito de hesitações, recuos e adiamentos que levaram à necessidade de negociar um segundo pacote de financiamento e a uma restruturação da dívida. Os eleitores gregos têm o direito de escolher outro rumo. Mesmo que a alternativa seja pior.
Na encruzilhada grega, o nó impossível de desfazer é evidente. Os eleitores e os partidos que agora ganharam importância na definição dos destinos do país alimentam dois sonhos impossíveis de compatibilizar. Recusam o cumprimento do acordo com a troika e o ajustamento que aquele implica, mas querem permanecer no euro. Vão bater no muro.
A crise na Zona Euro tem a ver com um crescimento económico débil e com contas públicas pouco saudáveis. Se há margem para os líderes europeus fazerem alguma coisa com o objectivo de ajudar a superar o primeiro problema, o segundo depende do esforço dos governos nacionais. Sem decisões que consigam convencer os credores de que os países mais endividados querem arrepiar caminho para conseguirem reconquistar a confiança de quem lhes empresta dinheiro, não há soluções credíveis dentro do euro.
A alternativa não é mais entusiasmante, mas não deixa de ser uma alternativa. Se a Grécia decidir abandonar o euro, libertar-se-á das amarras que os resultados eleitorais rejeitam. A recessão será mais profunda e o empobrecimento será mais violento. O caos e a miséria serão o terreno ideal para a emergência de saídas políticas que há uns anos seriam inimagináveis num país da Europa Ocidental.
O povo grego é livre de escolher o que considera ser melhor. Mas a obrigação dos demagogos da extrema-esquerda que o querem governar não se pode limitar a prometer e a exigir o impossível. Os amanhãs que cantam costumam ter acompanhamento. A bancarrota toca viola, as falências tocam guitarra e a música não é agradável."
João Silva
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