O monstro
"O monstro não se deixa controlar com facilidade. É já certo que o objectivo do défice público deste ano não será atingido. O que se vai passar a seguir está por decidir. Ou enfrentaremos mais medidas de austeridade ou teremos mais tempo para reduzir o défice. Tudo depende agora da troika, que chega a Lisboa na próxima semana.
O ministro das Finanças começou a preparar os seus parceiros europeus e a opinião pública portuguesa em Junho. Há um "aumento significativo dos riscos e incertezas que estão associados às perspectivas orçamentais", disse Vítor Gaspar em Junho, no Luxemburgo, numa das madrugadas das reuniões dos ministros das Finanças, dias antes de se conhecerem os números da execução orçamental dos primeiros cinco meses de 2012. Os resultados ficaram depois à vista: a previsão da receita de IVA consagrada no Orçamento revelava-se significativamente sobrestimada. O mês de Junho confirmou, depois, os receios desenhados com os números de Maio. A despesa pública estava controlada e a cair - com os cortes nos subsídios da função pública -, mas a receita de impostos reflectia a acentuada travagem do consumo privado.
Os países do euro na sua última reunião a 9 de Julho fizeram saber através do seu comunicado que recomendaram à troika que trabalhasse em conjunto com as autoridades portuguesas para que o programa de ajustamento se mantivesse na trajectória prevista. O ministro das Finanças, Vítor Gaspar, foi na altura um pouco mais longe dizendo aos jornalistas que foi "pedido à troika que, no contexto do quinto exame, olhasse, em colaboração com as autoridades portuguesas para formas de favorecer o sucesso do processo de ajustamento em Portugal". E assim se entrou nas férias estivais, com este primeiro sinal de que o objectivo orçamental deste ano estava seriamente ameaçado.
Os valores de Julho, divulgados nesta quinta-feira de Agosto, já não deixam qualquer dúvida: o objectivo de um défice público de 4,5% do PIB para este ano não vai ser atingido.
O que fazer agora? Restam três alternativas: adoptar mais medidas de austeridade para cumprir rigorosamente o objectivo; deixar défice público subir ou optar por uma combinação entre mais medidas e flexibilização do objectivo, dando a Portugal mais tempo.
O FMI tem-se mostrado disponível para deixar aumentar o défice. O actual chefe da missão para Portugal, Abebe Selassie, disse-o claramente nas entrevistas que deu após a quarta avaliação ao Programa de Ajustamento Económico e Financeiro. O pensamento da Comissão Europeia não é tão claro.
É nesta frente europeia que o governo poderá ter mais dificuldades em negociar a flexibilização da meta orçamental. Como vão os líderes europeus explicar que dão mais tempo a Portugal e não o dão à Grécia? Claro que Portugal pode ter condições para dizer que mais tempo, para si, não significa mais dinheiro. Porque o Estado tem conseguido financiar-se no mercado - já foi este ano buscar 20 mil milhões de euros - e o que faltou no ajustamento do sector público foi além do previsto no sector privado, onde as necessidades de crédito externo se reduziram significativamente.
O que se está a passar apenas revela que temos de estar preparados para o pior cenário que, neste caso, é mais um imposto extraordinário. O "monstro" como lhe chamou o actual Presidente da República não se deixa domar com facilidade."
Helena Garrido
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