domingo, novembro 18, 2012

Vítor Gaspar tem razão em pressionar Costa e Draghi

"Com a troika em Lisboa para a sexta-avaliação, o ministro das Finanças foi ao Parlamento defender que a principal dificuldade no ajustamento nacional é a incapacidade de reduzir os custos de financiamento bancário das empresas, e garantir que tem exposto repetidamente o problema à troika. Vítor Gaspar fez bem em dizê-lo publicamente: até mais do que do FMI ou da Comissão, Portugal precisa do BCE e os últimos sinais de Mario Draghi e Carlos Costa são preocupantes.

Apesar do BCE ter a sua taxa central nos 0,75% esse efeito não se sente em Portugal, onde a taxa de juro média para um empréstimo bancário de um milhão de euros a cinco anos está perto dos 8%, o valor mais elevado da região (contra menos de 4% na Alemanha). Espanha, Irlanda Grécia sofrem do mesmo mal.

A desconfiança nos bancos, nos soberanos em dificuldades e na interligação entre eles é tal que, na prática, o sistema financeiro e a transmissão da política monetária não funcionam nestes países. Muitas boas empresas e ideias estão a ser penalizadas pela simples razão de estarem, juntamente com os seus bancos, localizadas em Portugal, em Espanha, na Grécia - como se não lhes bastasse a política de terra queimada a que são sujeitas na frente orçamental.

Perante a gravidade do problema a Zona Euro avançará para uma "união bancária" e o BCE tem montada uma nova bazuca: um programa de compra de dívida pública para os países em dificuldades. São desenvolvimentos notáveis na arquitectura europeia, mas vistos de Lisboa padecem de problemas graves.

O programa de compra de dívida pública, que visa baixar os custos de financiamento de Estados e indirectamente dos bancos e das empresas nos países em dificuldades poderá, afinal, não se aplicar a Portugal.

O Presidente do BCE argumentou recentemente que Portugal perdeu o acesso ao mercado de dívida pública e que o banco central não se pode substituir a esse mercado. Contudo, o Tesouro português tem-se financiado por bilhetes do Tesouro em maturidades que vão até 18 meses, cumpre todas as outras condições definidas pelo BCE para aceder ao programa e as empresas e os bancos portugueses merecem o mesmo tratamento que as espanholas e italianos.

Na união bancária o problema é outro. O objectivo passa por mutualizar as responsabilidades dos Estados relativamente aos respectivos sistemas financeiros, de forma a que se os bancos tiverem problemas, os soberanos não sucumbam, e vice-versa. A criação de um sistema comum de resolução de bancos e de seguro de depósitos ao nível da Zona Euro são essenciais e exigem em troca um sistema de supervisão centralizado em Frankfurt.

Mas também aqui as últimas evoluções não são animadoras. Na sexta-feira Carlos Costa confirmou o que Mario Draghi já vinha sinalizando: reféns da Alemanha, o BCE aponta para um sistema de seguro de depósitos comum mas, pelo menos numa fase inicial, caso ele seja accionado num país será o respectivo Estado a pagar a conta sozinho. Os depositantes poderão ficar um pouco mais seguros, mas a relação potencialmente venenosa entre Estado e banco mantém-se.

A confirmarem-se estes dois desenvolvimentos, o papel do BCE ficará muito aquém do que os países do Sul precisam. Vítor Gaspar, que tem sido acusado de complacência com a troika, faz bem em pressionar Draghi e Costa."

Rui  Peres Jorge

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