A DERROTA
Com o resultado eleitoral em Espanha, inesperado como foi, já que a dúvida até dia 11 de Março era se o Partido Popular teria maioria simples ou absoluta, houve uma brecha importante no “partido dos Açores”, no dizer de um articulista espanhol.
Esse “partido dos Açores”, partido da guerra e do desrespeito pelo Direito Internacional, partido do unilateralismo, partido do grupo de “amigos de Washington”, partido do neo-conservadorismo libertário mundial, partido dos novos cruzados foi derrotado.
Antes de Março de 2003, antes do início da agressão ao Iraque, país soberano e independente, a população europeia, para não dizer mundial, foi maioritariamente contra essa aventura militar.
Na Europa e não só.
Os EUA e Inglaterra, sua indefectível aliada, ficaram sós no Conselho de Segurança das Nações Unidas, após verem gorados os aliciamentos que tentaram junto de países da América Central e de África.
Apenas lhes restaram os países do leste europeu, desejosos de adoptar uma estratégia de colagem aos EUA para que se defendam da proximidade da Rússia e, novidade, a Espanha e a Itália de Berlusconi.
Com estes dois países, a Polónia, a República Checa, a Bulgária ou a Roménia já não ficariam isolados no plano internacional, já que politicamente a aliança da Inglaterra aos EUA, por ser recorrente, nada traria de novo.
Por isso a entrada da Espanha para este “partido dos Açores” foi importante para a estratégia atlantista dos EUA e Inglaterra.
Trazia para o seu campo um tradicional aliado da Europa continental, enfraquecia a EU (constituindo desse modo um desígnio estratégico dos EUA), e sendo a Espanha uma potência emergente, só traria vantagens políticas a quem queria sacudir a ideia de que a aventura iraquiana tinha sido obra de poucos.
Por isso se explica a pressa (e desespero) da Polónia e Roménia no apelo que fizeram no dia 15 ao futuro PM espanhol para que não retire as tropas do Iraque.
Não porque os 1.500 militares espanhóis representem tácticamente uma mais valia relevante para o esforço de guerra, mas exactamente pelo peso político que a presença espanhola representa.
Com a Espanha e a Itália, a que se juntaram os aliados de ocasião, os que gostam de estar sempre do lado do mais forte, (mas não necessariamente do lado do que tem mais razão), como a Dinamarca ou Portugal, a coligação militarista parecia suficientemente abrangente e assim ganhar foros de legitimidade internacional, não se cansando Bush e seus conselheiros de repetirem até à exaustão a existência de 27 países que apoiaram a política americana, não esquecendo países de grande importância na cena mundial, como a Nicarágua, Guatemala, Burundi, Eritreia ou Tuvalu.
Com a reviravolta política espanhola neste domingo, de que só o PP tem culpa, pela inabilidade e evidente aproveitamento eleitoralista que quis fazer da tragédia do 11 de março em Madrid, e pela ausência de uma informação livre e independente por parte da TVE, controlada pelo Estado e pelo Governo, a Espanha está agora prestes a sair desta coligação, ou do “partido dos Açores”.
Porque a Espanha retomará as linhas de política externa tradicionais, como contribuir para o reforço do chamado eixo franco-alemão, da construção europeia, e do Direito Internacional.
Responsavelmente a Espanha não retirará apressadamente, mas até 30 de Junho.
Responsavelmente a Espanha e seu governo farão jus ao discurso de Luis Zapatero há um mês, em que disse que no mundo a única arma de destruição maciça verdadeiramente mortal e perigosa era a fome no 3º mundo.
E porque até Portugal ficará mais isolado na Europa e no mundo, após, de uma forma irresponsavelmente entusiástica, Durão Barroso ter dito num comício de campanha eleitoral espanhola que o povo português estava com o PP espanhol.
Perdeu o “partido dos Açores” e ganhou a paz.
Escusado será agora virem os profetas da desgraça, acabrunhados que ficaram com este resultado eleitoral, dizerem que a retirada espanhola da coligação dos senhores da guerra será uma cedência ao terrorismo da Al Quaedda, ou aos interesses dos países árabes.
Argumentam ainda que agora o terrorismo, essa entidade difusa, passa a poder condicionar de forma activa os resultados eleitorais e as políticas dos estados, esquecendo que cedência seria adiar as eleições ou passarem as populações a terem um comportamento diferente, de medo, ou se se estabelecessem políticas securitárias no ocidente europeu.
A Espanha, habituada há anos a conviver com o terrorismo nunca cedeu a chantagens da ETA, a sua população faz sempre uma vida normal, e os resultados eleitorais em cada momento são resultado e prova da vitalidade democrática dos estados.
O governo de Aznar alinhou nesta coligação do “partido dos Açores” contra o povo espanhol e contra a comunidade internacional.
Perdeu.
Arruinou as suas não escondidas ambições para uma carreira política relevante na Europa, com o apoio dos conservadores.
E perdeu o partido da guerra.
Por isso é que um jornal americano fez manchete a propósito dos resultados eleitorais espanhóis dizendo:
“Bush já perdeu as eleições em Espanha”.
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