Cidades
"A maioria das pessoas preferiria viver em cidades. Sabêmo-lo porque estão dispostas a pagar uma elevada factura por essa escolha.
A minha mulher cresceu no campo, ao passo que o meu processo de crescimento teve por palco diversas pequenas cidades. Actualmente vivemos em Londres e, não raramente, sentimo-nos divididos entre aí permanecer e em mudarmo-nos para o campo.
É uma decisão que nos cabe a nós tomar, muito embora também afecte terceiros e seja condicionada pela participação do governo nas escolas, infraestruturas e sistemas de planeamento. E o governo deveria, neste processo, fortalecer as respectivas infraestruturas e deixá-las, num assomo de razão, crescer. No Reino Unido, e em certa medida nos EUA, tudo indica que têm por meta fazer exactamente o contrário.
A maioria das pessoas preferiria viver em cidades. Sabemo-lo porque estão dispostas a pagar uma elevada factura por essa escolha. E se excluirmos os efeitos do elevado custo de vida nas cidades – liderado pela carga fiscal e pelos preços imobiliários –, verificamos que a média salarial nas cidades é inferior à das pequenas cidades rurais.
O escritor nova-iorquino Daniel Gross concluiu recentemente que o poder de compra do dólar nova-iorquino equivale a uns meros 61 cêntimos e que os salários mais altos em Nova Iorque correspondem a menos de metade dessa diferença. Para Edward Glaeser, economista de Harvard, este padrão aplica-se aos EUA no seu todo: os salários reais são, efectivamente, inferiores nas grandes cidades.
A ironia está no facto de as grandes cidades serem benéficas para o planeta. Recentemente, alguns títulos na imprensa causticavam Londres pela baixa taxa de reciclagem, mas omitiam um pormenor importante: os londrinos produzem menos lixo que os restantes habitantes do Reino Unido. Os londrinos têm menos automóveis. Os transportes públicos podem não funcionar na perfeição nas grandes cidades, no entanto, no campo nunca funcionarão de todo.
As cidades são igualmente centros de comércio e inovação tecnológica. Os instrumentos agrícolas usados no campo foram, na maioria dos casos, desenvolvidos nos laboratórios das universidades de Chicago e Cambridge. Estudos sobre patentes confirmam que estas tendem a estimular o surgimento de outras na mesma área geográfica; e estudos sobre a inovação comercial atestam que este fenómeno se concentra maioritariamente nos centros urbanos. Bem como as artes, que giram essencialmente em torno de redes criativas sediadas nas grandes cidades.
Exceptuando a frugalidade ambiental, a inovação e as artes, que fizeram as cidades por nós? Fizeram algo que assume hoje crescente importância se tivermos em conta que o comércio global exige uma cada vez maior flexibilidade às nossas economias: tornou as cidades mais resistentes. As economias desenvolvem-se mudando e o processo de mudança implica que haja despedimentos e procura de novos empregos. Uma experiência pouco divertida, claro, mas essencial para a regeneração do tecido laboral das cidades e menos dolorosa que a vivida nas pequenas cidades dependentes de uma única indústria, onde o encerramento de uma fábrica ou de uma mina significa um duro golpe económico e o fim de uma era.
Ora, este fenómeno é uma constante nas grandes cidades, mas aqui existem alternativas. Mais: sempre que alguém decide viver numa cidade e não no campo está, na prática, a preservar o ambiente para todos os demais e a contribuir para a concentração de pessoas necessárias ao desenvolvimento do comércio e da inovação cultural, bem como para a consolidação da resistência da economia que a suporta. Os governos deviam, por isto mesmo, pagar às pessoas para irem viver para as cidades e não o contrário.
Mas não precisamos de ir tão longe. Joe Gyourko, economista especializado no sector imobiliário, estima que os residentes de Manhattan pagam anualmente 7.500 dólares (5.450 euros) em custos imobiliários pelo simples facto de as licenças de construção serem cada vez mais restritas. Os preços elevados afastam as pessoas de Nova Iorque e esse afastamento redunda num desastre cultural e ambiental. A cintura verde de Londres tem o mesmo efeito, uma vez que obriga a actividade económica a deslocar-se para lá da cidade, onde é mais frágil e menos bem sucedida. Logo, menos resistente.
Todos têm o direito de escolher onde querem viver. Mas sempre que alguém opta pela cidade, os demais beneficiam dessa escolha. E se assim é, porque insistimos em pagar-lhes para viverem no campo?"
Tim Harford
A minha mulher cresceu no campo, ao passo que o meu processo de crescimento teve por palco diversas pequenas cidades. Actualmente vivemos em Londres e, não raramente, sentimo-nos divididos entre aí permanecer e em mudarmo-nos para o campo.
É uma decisão que nos cabe a nós tomar, muito embora também afecte terceiros e seja condicionada pela participação do governo nas escolas, infraestruturas e sistemas de planeamento. E o governo deveria, neste processo, fortalecer as respectivas infraestruturas e deixá-las, num assomo de razão, crescer. No Reino Unido, e em certa medida nos EUA, tudo indica que têm por meta fazer exactamente o contrário.
A maioria das pessoas preferiria viver em cidades. Sabemo-lo porque estão dispostas a pagar uma elevada factura por essa escolha. E se excluirmos os efeitos do elevado custo de vida nas cidades – liderado pela carga fiscal e pelos preços imobiliários –, verificamos que a média salarial nas cidades é inferior à das pequenas cidades rurais.
O escritor nova-iorquino Daniel Gross concluiu recentemente que o poder de compra do dólar nova-iorquino equivale a uns meros 61 cêntimos e que os salários mais altos em Nova Iorque correspondem a menos de metade dessa diferença. Para Edward Glaeser, economista de Harvard, este padrão aplica-se aos EUA no seu todo: os salários reais são, efectivamente, inferiores nas grandes cidades.
A ironia está no facto de as grandes cidades serem benéficas para o planeta. Recentemente, alguns títulos na imprensa causticavam Londres pela baixa taxa de reciclagem, mas omitiam um pormenor importante: os londrinos produzem menos lixo que os restantes habitantes do Reino Unido. Os londrinos têm menos automóveis. Os transportes públicos podem não funcionar na perfeição nas grandes cidades, no entanto, no campo nunca funcionarão de todo.
As cidades são igualmente centros de comércio e inovação tecnológica. Os instrumentos agrícolas usados no campo foram, na maioria dos casos, desenvolvidos nos laboratórios das universidades de Chicago e Cambridge. Estudos sobre patentes confirmam que estas tendem a estimular o surgimento de outras na mesma área geográfica; e estudos sobre a inovação comercial atestam que este fenómeno se concentra maioritariamente nos centros urbanos. Bem como as artes, que giram essencialmente em torno de redes criativas sediadas nas grandes cidades.
Exceptuando a frugalidade ambiental, a inovação e as artes, que fizeram as cidades por nós? Fizeram algo que assume hoje crescente importância se tivermos em conta que o comércio global exige uma cada vez maior flexibilidade às nossas economias: tornou as cidades mais resistentes. As economias desenvolvem-se mudando e o processo de mudança implica que haja despedimentos e procura de novos empregos. Uma experiência pouco divertida, claro, mas essencial para a regeneração do tecido laboral das cidades e menos dolorosa que a vivida nas pequenas cidades dependentes de uma única indústria, onde o encerramento de uma fábrica ou de uma mina significa um duro golpe económico e o fim de uma era.
Ora, este fenómeno é uma constante nas grandes cidades, mas aqui existem alternativas. Mais: sempre que alguém decide viver numa cidade e não no campo está, na prática, a preservar o ambiente para todos os demais e a contribuir para a concentração de pessoas necessárias ao desenvolvimento do comércio e da inovação cultural, bem como para a consolidação da resistência da economia que a suporta. Os governos deviam, por isto mesmo, pagar às pessoas para irem viver para as cidades e não o contrário.
Mas não precisamos de ir tão longe. Joe Gyourko, economista especializado no sector imobiliário, estima que os residentes de Manhattan pagam anualmente 7.500 dólares (5.450 euros) em custos imobiliários pelo simples facto de as licenças de construção serem cada vez mais restritas. Os preços elevados afastam as pessoas de Nova Iorque e esse afastamento redunda num desastre cultural e ambiental. A cintura verde de Londres tem o mesmo efeito, uma vez que obriga a actividade económica a deslocar-se para lá da cidade, onde é mais frágil e menos bem sucedida. Logo, menos resistente.
Todos têm o direito de escolher onde querem viver. Mas sempre que alguém opta pela cidade, os demais beneficiam dessa escolha. E se assim é, porque insistimos em pagar-lhes para viverem no campo?"
Tim Harford
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