quarta-feira, novembro 21, 2007

Saco de pancada

"Um italiano com assento no Banco Central Europeu veio dizer à Eslovénia que não seguisse o exemplo de Portugal no momento da sua adesão à Europa. E pediu: sigam antes o modelo irlandês. Um país não pode assistir indiferente a comentários como este.

A reacção saloia seria lembrar ao italiano que esse mau exemplo é velho e que o actual momento do país não o justifica. Poder-se-ia mesmo dizer-lhe: calcule o que seria recordar a Itália (apenas) como berço da máfia e da corrupção. Uma segunda reacção, mais adulta, consistiria em dar relevância às críticas.

Não para as validar, mas para lembrar o que se fez mal: quando Portugal aderiu ao euro, e à sua moeda única e taxas de juro baixas, não deveria ter deitado mais lenha para a fogueira atiçada em que essas novas variáveis deixavam a economia. Isto é, em vez de injectar dinheiro nos célebres movimentos pró-cíclicos, poderia ter recorrido ao modelo alternativo (o tal da Irlanda): desenhar um plano suave, de investimento em conhecimento (com retorno de longo prazo) aproveitando o empurrão natural da zona euro. A lógica do contra-ciclo.

Sucede que o Governo português está a preferir nada dizer – ou pelo menos a não tornar público o seu incómodo com o facto de o país ser usado sempre como mau exemplo. É verdade: o governador do Banco de Portugal já o fez, sem esconder a verdade, mas não é ele que convence as massas. E as massas não gostam de sentir um pé a pressioná-las.

Porque se é verdade que o país está a sair do buraco financeiro em que se colocou (já cumpre o défice), e que os números do desemprego (a subir) provam que alguma coisa está a mudar na estrutura económica nacional, fingir que os números não contam é o pior dos inimigos.

Repare-se: os desempregados qualificados que são apanhados nesta onda de mudança precisam de uma palavra – não que alguém lhes diga que os números não são rigorosos. Os futuros licenciados que entram no jogo nesta fase de alterações precisam de pistas para tomar decisões sobre o futuro – não que alguém lhes sugira que tudo está bem.

Quando Thatcher revolucionou à força a sociedade britânica, ouviu a fúria de mineiros e gente que se tornou sem-abrigo da noite para o dia. Mas falou-lhes. Lançou até uma campanha que correu o país a celebrar as virtudes de empregos em cadeias de hambúrguer – ela sabia que nenhuma dessas pessoas regressaria a empregos qualificados. Por cá, não se vende sequer a promessa de um oásis no fim do caminho. Diz-se apenas que o caminho é bom, e fala-se grosso quando alguém sugere não ver esse éden.

O italiano que não gosta de Portugal poderia estar a fazer-nos um favor – obrigando o Governo a dizer porque vamos sair do buraco. Mas não: o Governo, calado, parece preferir segurar o saco de pancada
. "

Martim Avillez Figueiredo

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

O éden e o oásis e uma no cravo outra na ferradura
"Quando Thatcher revolucionou à força a sociedade britânica, ouviu a fúria de mineiros e gente que se tornou sem-abrigo da noite para o dia. Mas falou-lhes. Lançou até uma campanha que correu o país a celebrar as virtudes de empregos em cadeias de hambúrguer – ela sabia que nenhuma dessas pessoas regressaria a empregos qualificados.

Por cá, não se vende sequer a promessa de um oásis no fim do caminho. Diz-se apenas que o caminho é bom, e fala-se grosso quando alguém sugere não ver esse éden."
Tatcher aplicou as virtudes do Consenso de Washington e que se saiba, o resultado é o de uma sociedade com grandes assimetrias, muita miséria, mas isso já é hábito, desde o período vitoriano, antes e depois, a lei dos pobres, etc... e depois exportou a revolução de que Cavaco tanto gostava e babava.
Este,que agora agarra o leme,com o mestre perto, timoneiro do oásis, quer criar um novo oásis, quer voltar a aplicar uma coisa que já está em aplicação há muito, o flexiemprego de salários miseráveis, mas justos, e com horários reduzidos e só às vezes, e a indústria de manufactura que seja feita pelos chinas e indianos.
O Sr Zeller, donzela muito ensimesmada por causa da Ota e de Alcochete, que saliva, decerto por razões que Pavlov explicará melhor, em conjunto com o Sr Cavaco e com o Sr Sócrates, vá lá se saber porquê, também mantém os indígenas em sobressalto e os coitados dos presidentes de câmara e os pobres que especularam, fazem garra com a mão no peito, tal a angina, aguardando-se intervenção do INEM do Sr Campos, sempre muito sorridente, daquela maneira cínica, e ao mesmo tempo com cara de tolo que tudo sabe, como se desse lição aos futuros administradores hospitalares.
Portanto, é preciso, como diz o sr Avillez,(com 2 Ls), explicar aos indígenas, o que se está a fazer pelo seu futuro e pelo dos seus, se ainda os houver, porque com o número de abortos a crescer, como algumas figuras do iluminismo jacobino tanto gostam, deve ter sido por terem lido Mao na juventude e de través o reverendo Malthus.
Depois de toda a porcaria que Thatcher fez, exportou-se o modelo para a Nova Zelândia que era um país com estado a sério, num país a sério com paz social, criando um país de liberalismo selvagem, com milhões de excluídos. Este é o milagre de que gosta tanto o sr Cavaco e o sr Sócrates que não sabe bem o que faz, como tonto convencido que é, mas tem decerto quem lhe puxe os fios.
O sr Martin não conhece o episódio do oásis e nem sempre é preciso dizer que isto é um oásis, porque num sítio com indígenas que sabem de tudo, de futebol, de política, de falar mal do vizinho e de o denunciar, como o faziam no tempo da Pide, poupando-lhes o trabalho, ou por inveja ou por súbitas inimizades políticas, (o PCP e as coisas que gravitavam à sua volta sabem-no bem), não é preciso explicar nem o que é um oásis, nem o que o sr Cavaco inventou como tal, como grande mestre de economia, hoje cada vez mais uma ciência exacta, o que está bem de ver...
Foi isto que o sr Martim queria dizer?
Toupeira

quarta-feira, novembro 21, 2007  

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