quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Relembrar o que nos querem fazer esquecer

“O pior está para vir.”
Foi com esta lúgubre frase que o secretário do Tesouro dos EUA, Henry Paulson, anunciou a noite passada o lançamento de um plano de emergência para que o reajuste das taxas de juro «subprime», contratadas entre as instituições de crédito e os clientes, seja adiado por mais 30 dias.
O objectivo é dar um balão de oxigénio aos devedores em incumprimento, a fim de arranjarem dinheiro suficiente para pagarem as prestações atrasadas.
A inédita medida, baptizada de “Project Lifeline”, dirige-se aos detentores de hipotecas com mais de 90 dias de atraso, tentando evitar que as respectivas casas sejam penhoradas.
Bank of America, JP Morgan Chase, Citigroup, Countrywide, Washington Mutual eWells Fargo são os bancos envolvidos, segundo um artigo publicado pelo Financial Times.
Na semana passada, um relatório publicado por um grupo de procuradores gerais federais revelou que 2/3 dos devedores, desde Outubro, não obtiveram quaisquer facilidades do sistema bancário. Robert Steel, subsecretário das finanças internas, numa audição perante uma comissão do Senado confessou que os apoios especiais recentemente aprovados pelo governo - Programa “Hope Now” - se revelaram, até ao momento, “inadequados”.
Contudo, os gestores do plano publicaram dados na semana passada segundo os quais 68% dos “maus pagadores” beneficiaram de ajudas no segundo semestre de 2007.
O Projecto Lifeline abrange igualmente os tomadores de créditos hipotecários de menor risco - empréstimos “alt-A“. O mercado e os analistas interpretam o facto como revelador do receio dos governantes de que a crise de crédito atinja também os devedores com históricos bancários de melhor qualidade.
Christopher Dodd, presidente da comissão senatorial que fiscaliza o sistema bancário, afirmou que o bem-intencionado plano “não conseguirá impedir a onda de milhões de penhoras com que nos iremos deparar nos próximos meses.”
Por seu turno, John Taylor, presidente de uma organização não lucrativa envolvida na solução da crise hipotecária americana - National Community Re-investment Coalition - deitou mais algumas achas na fogueira ao revelar que os problemas do sector não foram causados pelos seis bancos envolvidos no projecto Lifeline.
“Eles irão precisar da autorização dos accionistas para modificarem os contratos hipotecários. Até agora, já vimos que as probabilidades de tal acontecer são mínimas.” (pvc)

“Os mercados são moldados por expectativas humanas, os seus comportamentos não são passivos de previsão racional. As forças que movimentam os mercados não são processos mecânicos de causa e efeito. São aquilo que George Soros designou por “reflexões interactivas”. Dado que os mercados são constituídos por interacções entre crenças altamente inflamáveis, não são capazes de se autoregular.
De acordo com a teoria económica corrente, podemos compreender a economia como compreendemos um maquinismo; mas as sociedades humanas estão em permanente flutuação e mudanças. As instituições sociais são formadas de convicções humanas; um rectângulo de papel serve de dinheiro apenas enquanto acreditamos que é dinheiro; de outro modo, é apenas uma curiosidade. As teorias que procuram mecanizar os mercados deixam de lado o facto mais importante: eles são ficções construídas pela imaginação e pelas expectativas humanas.
Em particular nos mercados financeiros, as nossas expectativas sobre o futuro entrechocam-se. Os mercados financeiros não tendem para o equilíbrio. O excesso é o seu estado normal. Esta volatilidade no âmago das instituições financeiras liberalizadas dá origem a uma economia mundial organizada como um sistema de mercados livres essencialmente instáveis.
Os que crêem que os mercados livres nos permitem formular expectativas racionais sobre o futuro vêem a longa expansão económica americana desde o início dos anos 80 até ao presente como prova de que os ciclos económicos são uma das bárbaras relíquias da história.
Estão confiantes em que as economias que se submetem às exigências do consenso de Washington não precisam recear as súbitas contracções e longas depressões que as sacudiram no passado.
Allan Greenspan, presidente do Banco Central Americano ( Federal Reserv Bank ), credibilizou o conceito de que os ciclos económicos estão obsoletos.
Até 1989 Greenspan acreditou que os mercados livres se enraizavam na natureza humana e que apenas a tirania poderia evitar que o resto da natureza humana os abraçasse.
É louvável que Greenspan, numa conferência no Centro Woodrow Wilson em Junho de 1997, tenha confessado que após 1989 descobriu que « muito do que tomámos por verdadeiro no nosso sistema de mercado livre não se devia à natureza, mas à cultura.
O desmantelamento da função de planificação central não estabelece automaticamente, como alguns supunham, o capitalismo de mercado».
Greenspan reconheceu a importância das normas culturais na sustentação dos mercados livres. Mas que cataclismo no mercado será preciso para convencer Greenspan de que uma «nova era» de crescimento estável é apenas um mito?
O laissez-faire global pode sucumbir no meio de uma crise ingerível dos mercados bolsistas e das instituições financeiras.
A enorme e praticamente obscura economia virtual dos derivados financeiros aumenta os riscos de uma ruptura sistémica.
Como reagiria a sociedade americana desunida a um colapso bolsista como o que ocorreu no Japão no início dos anos 80?
Hoje, uma ruptura dessa dimensão desencadearia convulsões económicas e sociais de grande escala nos Estados Unidos.
Independentemente de outros presságios de um tal evento, podemos ter a certeza de que mais ninguém falaria da utopia do governo minimalista.
O regime internacional dos mercados livres não poderia sobreviver a uma convulsão económica no seu epicentro.”

John Gray in “False Down”

Post scriptum:
Viram a notícia sobre o envolvimento de fundos da CGD no lodo do subprime?
O que estará ainda por se descobrir?
Como se irão comportar as autoridades reguladoras?
Um país onde a autoridade do estado desaparece, deixa de ser viável como tal, Hobbes esclarece porquê.

2 Comments:

Blogger Toupeira said...

Peço desculpa ao Carvalho Negro por postar, quase em cima, só reparei depois.
Mil desculpas.

quarta-feira, fevereiro 27, 2008  
Anonymous Anónimo said...

Os deputados, ministros, secretários de Estado, etc. sabem quanto ganham os elementos do Conselho de Administração do Banco de Portugal. Quem não sabe e os políticos pretendem que não seja conhecedor é o povo.

Os partidos políticos neste país têm servido fundamentalmente para uma cambada de oportunistas incompetentes conseguir ser nomeada para cargos a que por competência e mérito próprios nunca teriam acesso.

O Estado deveria ser uma entidade para gerir eficientemente os bens públicos em benefício do seu proprietário colectivo ‑ o povo português ‑ e simultâneamente regular dum modo isento e independente as relações entre os cidadãos.

Ao invés disso transformou‑se numa imensa máquina de extorsão de dinheiro aos portugueses que nos está a levar a todos à ruína. E esse dinheiro extorquido aos contribuintes é sempre distribuído em benefício dos mesmos: os políticos e seus protegidos.

Só para ter ideia até que ponto estamos a ser explorados compare com a situação aqui ao lado em Espanha em que em sede de IVA enquanto nós pagamos 21% eles pagam apenas 16%. Em sede de IRS a diferença ainda é mais escandalosa. Segundo li num jornal diário da semana passada, em Espanha os contribuintes que ganhem menos de 16000,00€ / ano (ou 265 contos/mês) estão isentos de IRS. Só a partir desse valor é que os contribuintes começam a pagar IRS. Agora compare com a quantidade de IRS paga em Portugal para o mesmo rendimento.

Em sede do Imposto Municipal de Imóveis estamos também a ser roubados. O Decreto-Lei 287/2003 aprovado pela então Ministra das Finanças, a Dra. Manuela Ferreira Leite, veio criar condições ainda mais difíceis à vida dos portugueses. Conheço casos de apartamentos que já estão a pagar cerca de 1 200,00 € / ano de IMI. Mais grave ainda é o caso das moradias em que num caso que eu conheço o proprietário já foi obrigado a vender por não conseguir pagar o valor de IMI que as Finanças lhe atribuíram, cerca de 2300,00€ / ano. Quanto aos proprietários de imóveis que ainda pagam valores de IMI inferiores a 500,00€ / ano, eles que se acautelem, porque os imóveis ainda não foram reavaliados (o prazo em que as Finanças prevêem fazê‑lo é de 10 anos) logo que seja efectuada a sua reavaliação irão começar a pagar valores da mesma ordem de grandeza. E estou a falar de habitações perfeitamente vulgares.

Por comparação com o caso português, um emigrante com quem estive hoje paga de uma moradia grande de que é proprietário no Luxemburgo, simplesmente o país com maior rendimento per capita da UE, apenas 70,00€ / ano de imposto sobre imóveis ao Estado luxemburguês. Compare agora com os milhares de euros cobrados pelo Estado português!

Em termos práticos significa que enquanto o português médio tem de trabalhar três meses e meio só para pagar os impostos anuais relativos à moradia, ao luxemburguês médio bastam-lhe apenas três horas e meia de trabalho para pagar o imposto equivalente. Será isto a famosa justiça social que os nossos governantes já andam a apregoar há tantos anos?

O que nos estão a fazer é imoral meu amigo. Comprámos casas para não estarmos a pagar renda a um senhorio e em vez disso a partir do infame decreto‑lei da Dra. Ferreira Leite iremos ser obrigados a pagar renda ao Estado.

A situação de pobreza de uma parte da população é substancialmente mais grave do que aquilo que os nossos governantes querem fazer crer à opinião pública. Só no ano de 2006, 100 000 portugueses foram forçados a emigrar por não terem trabalho cá.

A estes juntam‑se mais 80 000 que continuam a residir em Portugal mas já trabalham em Espanha durante a semana.

Se adicionarmos estes 180 000 emigrantes forçados aos mais de 400 000 desempregados oficiais concluímos que o número de desempregados ultrapassa já largamente os 600 000! Só não se nota nas estatísticas porque ESTAMOS A EXPORTAR DESEMPREGADOS!

A estes infelizes contrapõe‑se uma minoria sem qualquer mérito que está cada vez mais rica fazendo negócios com o Estado, sob a protecção do Estado, ou favorecidos pelo Estado (vide empresas de obras públicas, telecomunicações, energia, banca, etc.), usufruindo de um regime de monopólio ou quase que lhes permite cobrar os preços que querem (normalmente exorbitantes) aos consumidores os quais são forçados a ser seus clientes porque não têm outra alternativa.

Muitas dessas situações não são noticiadas pelos média, porque não vendem jornais, e a insistência na sua publicação só iria fazer baixar as tiragens. A nível noticioso, o país está‑se a transformar num jardim de infância para adultos, em que o povo prefere andar a ler a Caras ou outras revistas cor de rosa para saber quem vai para a cama com quem, do que informar‑se, pronunciar‑se e revoltar‑se quando a sua qualidade de vida está em degradação permanente e acentuada.

É este o retrato dos portugueses. São explorados economicamente, maltratados pelos agentes do Estado, escarnecidos pelos políticos, desprezados pelos oligarcas, mas devido às sistemáticas operações de marketing, propaganda, manipulação dos media e contra informação efectuada pelos políticos, parte da população ainda anda satisfeita porque julga viver num cantinho do céu. Como diz o ditado popular, pobretes mas alegretes.

Contudo, nem todos andam satisfeitos. Para os mais atentos à situação social deste país o estado de espírito é de revolta e indignação pela situação degradante em que as suas vidas caíram. É neste momento evidente para essa franja mais atenta e desfavorecida da população que foi criado em Portugal um grande laço que está a estrangular a carteira e principalmente o cérebro dos portugueses.

Caso nada seja feito para o contrariar, Portugal caminha a passos largos para um regime totalitário de pensamento único, infestado de bufos e delatores sempre prontos a denunciar os contestatários às autoridades na esperança de serem promovidos, onde os ingénuos serão manipulados com operações de marketing, os discordantes serão descredibilizados com manobras de contra‑informação nos media, os recalcitrantes serão perseguidos até deixarem de reclamar, e praticamente todos os cidadãos irão perder a liberdade de pensamento, expressão e actuação, continuam a ter deveres, mas deixaram de ter direitos. Por isso meu amigo, o futuro da situação dos direitos e liberdades individuais deste país também não se augura brilhante.

Isto é uma realidade que neste momento ainda não é apercebida por todos. Muitos dos desatentos e inconscientes, onde eu próprio até há pouco tempo me incluía também, só se irão aperceber do que está a suceder quando começarem eles próprios a sofrer arbitrariedades na pele.

Ninguém é inocente em relação ao descalabro a que as coisas estão a chegar, mas alguns serão mais culpados que outros!

Quero esclarecer que até ao presente também eu fui um dos cidadão vítima de abusos e prepotências e que se calaram. Agora estou farto e para mim chegou a altura de dizer BASTA!

O Estado português está infiltrado por uma máfia de crápulas sem escrúpulos, moral ou princípios, que está a prejudicar gravemente e a fazer a vida negra aos seus concidadãos!
Só livrando‑nos deles, revogando toda a legislação danosa e de favor aprovada, e denunciando contratos ruinosos, poderemos finalmente aspirar neste país a ter uma vida digna de ser vivida!

A VERDADE é importante para denunciar, debater e moralizar. Mas se não conseguirmos modificar o regime, será apenas mais uma voz a bradar no deserto e todo o esforço feito terá sido em vão.

Já temos a força da razão. Mas para modificar o que está mal precisamos também de ter a força do número. Para isso é importante angariarmos militantes inteligentes, críticos, interventivos e disciplinados, que queiram empenhar‑se civicamente na modificação do regime.

Só com um movimento cívico forte, organizado, disciplinado e determinado conseguiremos modificar o regime.

Será que ainda iremos a tempo? Sinceramente não sei. Só sei que vou lutar pela minha liberdade. E pelo que me está a ser negado em Portugal: a possibilidade de ter uma vida digna. Porque adoro este país e não quero ser mais um dos infelizes obrigados a emigrar. E espero que ao lerem as newsletters mais cidadãos inconformados se unam a mim numa luta por um futuro digno e humano neste país.

Se o ambiente actual que se vive no país é de dificuldades e intimidação, o futuro que nos preparam é de miséria e opressão. E nós merecemos melhor!

quinta-feira, fevereiro 28, 2008  

Enviar um comentário

<< Home

Divulgue o seu blog!