domingo, maio 25, 2008

Incógnitas europeias

"A economia europeia encontra-se numa encruzilhada com sinais contraditórios e incógnitas várias sobre o seu rumo.

A economia europeia suscita no presente inúmeras incógnitas que lançam outros tantos pontos de interrogação sobre Portugal. Por um lado, vários sinais, corroborados por declarações repetidas de decisores económicos como o presidente do BCE, indiciam o carácter enganador da esperança de alguma imunidade da economia europeia em relação à crise da economia norte-americana (constatação sobre a qual já aqui escrevemos). Por outro lado, os dados objectivos do primeiro trimestre de 2008 traduzem um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) da zona euro superior às previsões anteriormente existentes. Para além disso, a parcela assegurada pela zona euro no PIB mundial parece também ter aumentado, aproximando-se da que é realizada pelos EUA. É certo que nos últimos dias novamente o presidente do BCE – que assume o quase sempre desagradável dever de ofício de recordar as eventuais más notícias – veio destacar que esse crescimento pode representar um parêntesis até que os efeitos da crise do sistema financeiro atinjam na sua plenitude as restantes actividades económicas (podendo assim esperar-se um abrandamento económico no segundo trimestre do ano, pelo que as aparentes boas notícias económicas do primeiro trimestre não o chegariam a ser verdadeiramente).

Em contrapartida, para além destas reais incógnitas sobre a encruzilhada económica europeia um outro elemento novo parece poder baralhar as previsões, sobretudo para as pequenas economias muito abertas como Portugal. Trata-se de um elemento de heterogeneidade. Assim, enquanto a Espanha enfrenta uma drástica desaceleração – sobre a qual também já escrevemos – a Alemanha parece evidenciar sinais de aceleração no seu crescimento (embora com dúvidas sobre a sua sustentabilidade). Neste tabuleiro de xadrez económico em que as peças parecem começar a ganhar novos movimentos diferentes das regras anteriores e o jogo ganha contornos mais indefinidos onde encaixará Portugal?

Parece quase evidente que a nossa proximidade em relação à economia espanhola não deixará de produzir efeitos desfavoráveis em função do abrandamento desta última (sobretudo se vierem a confirmar-se os cenários mais negros a esse respeito). A revisão do crescimento português em baixa agora anunciada reflectirá certamente este aspecto, estando também associada à nossa fortíssima dependência energética externa.

Acresce que, algo paradoxalmente, Portugal corre neste momento o risco de pagar uma factura apreciável por ter seguido um roteiro até certo ponto virtuoso de correcção dos seus desequilíbrios económicos e financeiros – roteiro que fez assentar um movimento lento de retoma no crescimento das nossas exportações. Neste contexto, com a desaceleração já experimentada ou previsível em vários dos principais destinos das nossas exportações o movimento incipiente de retoma é mais directa e rapidamente ameaçado. Contudo, a confirmar-se alguma heterogeneidade económica europeia em que crises como a espanhola fiquem localizadas e sejam contrabalançadas por outras áreas de relativo crescimento, algumas oportunidades permanecem para os nossos movimentos de exportação. Será acima de tudo inoportuno fazer agora funcionar o tradicional pêndulo fatalista português e oscilar – quase sem transição – de discursos de optimismo moderado para os cenários mais pessimistas e negros. Para além disso, será extremamente importante não interromper a trajectória de correcção dos desequilíbrios financeiros, mesmo que esta possa ter os seus ritmos ajustados às condições económicas prevalecentes em cada momento (numa difícil navegação à vista). Contudo, o grande factor que pode perturbar esta realidade é a entrada na última fase da legislatura e uma possível reinvenção do jogo político entre os dois maiores partidos a cerca de um ano das eleições (também estimulada pela alteração da liderança do segundo maior partido). Da forma como resistirmos à tentação de provocar uma grande oscilação num barco que navega entre margens muito estreitas e sem grandes alternativas reais até uma real consolidação das finanças públicas dependerá muito do nosso futuro colectivo próximo. Os precedentes recentes não nos são favoráveis. Resta-nos, contudo, esperar o melhor
."

Luís Silva Morais

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