O pecado mora na bomba de gasolina
"Não é só o preço da gasolina que está a ficar insuportável; a pressão social sobre o Governo e gasolineiras também. Uns e outros começaram por culpar os produtores de petróleo, que vendem caro. Depois, culparam os especuladores, que empolam o preço.
Agora, começaram a culpar-se mutuamente: as empresas queixam-se dos impostos; o Governo suspeita e atira a responsabilidade para a Autoridade da Concorrência, que evidentemente não vai provar nada.
Nenhuma Autoridade da Concorrência do mundo provou até hoje um cartel entre gasolineiras. Este é precisamente o crime do Direito da Concorrência mais difícil de provar: não basta o paralelismo de preços, é preciso provar que houve contacto entre empresas e que se promoveu a concertação.
Mais: não é preciso um cartel para haver concertação de preços. Basta que haja um líder de mercado com uma quota desequilibradamente grande e poucos concorrentes que se põem debaixo do chapéu de chuva: o líder marca o preço, os outros acompanham. Ora, ironicamente, o contestatário presidente da Anarec até está a ajudar as gasolineiras a concertarem preços, desde que passou a anunciar os aumentos de véspera. Os concorrentes ouvem e aumentam à mesma hora.
Mas se a teoria de conspiração entre gasolineiras é apenas isso só, a falta de concorrência no sector é um facto observável a olho nu. O problema começa na produção (onde há um cartel legal e não escrutinável, a OPEP), que extrai petróleo por dois ou 20 dólares, uma pequena percentagem dos mais de 120 dólares com que o barril é transaccionado nas bolsas. Porque o próprio produtor lucra. E porque os “especuladores” (uma espécie de eufemismo ao contrário para investidores) compram futuros assentes na expectativa de que o petróleo fique ainda mais caro. A procura é muita. E é cada vez maior a canalização de dinheiro para estes tipo de produtos (investimento hoje acessível a qualquer investidor, através de fundos e produtos estruturados).
OK, chegamos a um preço internacional comum. Mas, protesta-se, isso não justifica esta persistência dos aumentos, que remete para os períodos de hiper-inflação no Brasil, quando os produtos à tarde eram mais caros que de manhã. E a pressão social aumenta, desconfiada de uma parceria público-privado entre um Estado que encaixa mais de metade do preço de venda em impostos e gasolineiras que lucram cada vez mais.
Duas coisas são factualmente verdade: o Estado português é alarve na tributação das gasolinas; mas mesmo sem impostos, as nossas gasolinas são mais caras que outras na Europa.
O Governo não tem solução e o Estado tem pesos na consciência por ter feito mal a liberalização dos preços. Na verdade, os preços não são livres, são vigiados. Vigia-os a Autoridade da Concorrência, que produz relatórios há quatro anos sobre os preços praticados em Portugal; que recomendou o licenciamento livre em hipermercados, onde hoje se vende mais barato; que propôs painéis comparativos de preços à entrada das auto-estradas, onde se continua a vender mais caro. O Governo aprovou há um ano. Mas placas não há, ninguém as quer pagar...
Bem pode o Governo chutar para a Concorrência, a bola fará ricochete. Um ministro terá de vir explicar uma de duas coisas: se for o das Finanças, ou pede resignação aos preços internacionais ou desce o ISP; se for o da Economia, ou anuncia uma intervenção ou cria um “défice tarifário” que se paga mais tarde.
Esperemos que seja Teixeira dos Santos a falar."
Pedro Santos Guerreiro
Agora, começaram a culpar-se mutuamente: as empresas queixam-se dos impostos; o Governo suspeita e atira a responsabilidade para a Autoridade da Concorrência, que evidentemente não vai provar nada.
Nenhuma Autoridade da Concorrência do mundo provou até hoje um cartel entre gasolineiras. Este é precisamente o crime do Direito da Concorrência mais difícil de provar: não basta o paralelismo de preços, é preciso provar que houve contacto entre empresas e que se promoveu a concertação.
Mais: não é preciso um cartel para haver concertação de preços. Basta que haja um líder de mercado com uma quota desequilibradamente grande e poucos concorrentes que se põem debaixo do chapéu de chuva: o líder marca o preço, os outros acompanham. Ora, ironicamente, o contestatário presidente da Anarec até está a ajudar as gasolineiras a concertarem preços, desde que passou a anunciar os aumentos de véspera. Os concorrentes ouvem e aumentam à mesma hora.
Mas se a teoria de conspiração entre gasolineiras é apenas isso só, a falta de concorrência no sector é um facto observável a olho nu. O problema começa na produção (onde há um cartel legal e não escrutinável, a OPEP), que extrai petróleo por dois ou 20 dólares, uma pequena percentagem dos mais de 120 dólares com que o barril é transaccionado nas bolsas. Porque o próprio produtor lucra. E porque os “especuladores” (uma espécie de eufemismo ao contrário para investidores) compram futuros assentes na expectativa de que o petróleo fique ainda mais caro. A procura é muita. E é cada vez maior a canalização de dinheiro para estes tipo de produtos (investimento hoje acessível a qualquer investidor, através de fundos e produtos estruturados).
OK, chegamos a um preço internacional comum. Mas, protesta-se, isso não justifica esta persistência dos aumentos, que remete para os períodos de hiper-inflação no Brasil, quando os produtos à tarde eram mais caros que de manhã. E a pressão social aumenta, desconfiada de uma parceria público-privado entre um Estado que encaixa mais de metade do preço de venda em impostos e gasolineiras que lucram cada vez mais.
Duas coisas são factualmente verdade: o Estado português é alarve na tributação das gasolinas; mas mesmo sem impostos, as nossas gasolinas são mais caras que outras na Europa.
O Governo não tem solução e o Estado tem pesos na consciência por ter feito mal a liberalização dos preços. Na verdade, os preços não são livres, são vigiados. Vigia-os a Autoridade da Concorrência, que produz relatórios há quatro anos sobre os preços praticados em Portugal; que recomendou o licenciamento livre em hipermercados, onde hoje se vende mais barato; que propôs painéis comparativos de preços à entrada das auto-estradas, onde se continua a vender mais caro. O Governo aprovou há um ano. Mas placas não há, ninguém as quer pagar...
Bem pode o Governo chutar para a Concorrência, a bola fará ricochete. Um ministro terá de vir explicar uma de duas coisas: se for o das Finanças, ou pede resignação aos preços internacionais ou desce o ISP; se for o da Economia, ou anuncia uma intervenção ou cria um “défice tarifário” que se paga mais tarde.
Esperemos que seja Teixeira dos Santos a falar."
Pedro Santos Guerreiro
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