Uns irresponsáveis

"Esta crise financeira anda a deixar muitos indígenas daqui e dali imensamente satisfeitos. Por razões diversas.

Uns têm-se fartado de ganhar dinheiro com o sobe e desce das Bolsas e com a especulação sempre associada a momentos de incerteza e mesmo de pânico. Outros esfregam as mãos de contentes porque estão convencidos de que o mercado, a concorrência e a livre iniciativa dos cidadãos estão definitivamente postos em causa.

Para os mais sonhadores, esta crise é uma bênção que vai finalmente derrotar o maldito e asqueroso capitalismo e abrir de novo o caminho para o glorioso socialismo, democrático ou não. Não interessa. O que interessa é que essa história de uma economia liberal está de pantanas e é tempo de voltar a tirar do baú as velhas teses do intervencionismo estatal, da economia planificada, das empresas nacionalizadas que, como se sabe, sempre foram maravilhosos exemplos de gestão e de racionalidade. É evidente que os sonhadores, cá dentro e lá fora, têm muitas razões para estar felizes.

As notícias vindas dos EUA não são boas para quem acredita no mercado, na concorrência e admite, obviamente, que as falências, como a morte, são naturais em qualquer economia e que as crises são momentos importantes para se corrigir erros e mudar de vida. Falando deste sítio pobre, manhoso e cada vez mais mal frequentado, esta crise o que revela é que a vidinha que os indígenas levavam acabou. Para a rapaziada que ainda sonha com o socialismo e anda por aí a esfregar as mãos de contente, a culpa não é de quem gasta mais do que recebe. A culpa é dos malandros que acenam com créditos a juros baixos para comprar casas, automóveis, férias, na praia ou na neve, telemóveis de várias gerações, GPS para tudo e para nada. Sim, a culpa é desses malandros que enganam os pobres indígenas a torto e a direito, que os tentam com as sete maravilhas do consumo e, imagine-se o despautério, até andaram a semear por tudo o que é parede umas caixinhas milagrosas que dão dinheiro a qualquer hora.

É verdadeiramente escandaloso enganar assim gente irresponsável, que é tentada todos os dias por uma miserável sociedade de consumo. É preciso defender os consumidores irresponsáveis. É preciso pôr o Estado a tomar conta deles e a castigar quem os tenta para o pecado do consumo. O melhor mesmo é limitar o voto. Os indígenas não podem escolher os senhores que vão tomar conta da sua vidinha. Volta Salazar, a Esquerda já te perdoou."

António Ribeiro ferreira