O outro lado do espelho
"O capitalismo é o centro de todos os ressentimentos e o último obstáculo à existência de todas as alternativas.
O cenário é a crise financeira internacional. Vive-se numa espécie de realidade invertida em que tudo parece mudar de lugar e em que as certezas de um dia são as incertezas de um minuto. Veja-se o caso das “nacionalizações”. Existem as velhas “nacionalizações” impostas por motivos ideológicos e sustentadas por uma concepção estatista e centralista da economia. Mas também existem as “intervenções”, por necessidade ou urgência, como medida de excepção para a correcção de uma perturbação no mercado. Na precipitação do debate actual não existe simplesmente o decoro de uma distinção essencial.
Em simultâneo, decreta-se a falência dos mecanismos de auto-regulação e de regulação do mercado. Com entusiasmo, anuncia-se a decadência como estádio terminal na gloriosa caminhada para a extinção do capitalismo. Os defensores da economia de mercado salvaguardam os benefícios do sistema, mas ressalvam o falhanço de uma ética capitalista e denunciam o predomínio da ganância. Este é exactamente o argumento que mantém vivo o ideal socialista face ao colapso dos regimes populares – a natureza corrupta do Homem não esteve à altura das exigências do ideal político. Quando a Esquerda condena a intervenção do Estado e a Direita justifica a intervenção do Estado, tal significa a dificuldade da ideologia política perante a complexidade, as contigências e a imperfeição dos Homens e do Mundo.
À confusão ideológica junta-se a inexistência de soluções alternativas ao sistema capitalista. Não existe a intenção de um regresso a Marx, não é visível a definição de um neo-keynesianismo emergente, não é observável a declaração de uma solução corporativa tão ao gosto da extrema-direita. O capitalismo é o centro de todos os ressentimentos e o último obstáculo à existência de todas as alternativas.
No entanto, a essência do capitalismo é a concorrência. Por extensão, o capitalismo necessita do efeito de competição que só a alternativa de um outro sistema económico pode garantir. Perante o vazio das alternativas políticas, a economia de mercado tenta reinventar-se contra o espectro do fim da História.
A crise financeira internacional vem chamar a atenção para uma versão do dilema liberal – quando tudo aponta para a existência de uma ameaça, uma ameaça que ainda pode ser controlada pela acção humana, deve-se agir ou permanecer sentado sobre as mãos no topo da teoria? A teoria não salvou a União Soviética. Nas teorias não há lugar para um Mundo em aberto."
Carlos Marques de Almeida
O cenário é a crise financeira internacional. Vive-se numa espécie de realidade invertida em que tudo parece mudar de lugar e em que as certezas de um dia são as incertezas de um minuto. Veja-se o caso das “nacionalizações”. Existem as velhas “nacionalizações” impostas por motivos ideológicos e sustentadas por uma concepção estatista e centralista da economia. Mas também existem as “intervenções”, por necessidade ou urgência, como medida de excepção para a correcção de uma perturbação no mercado. Na precipitação do debate actual não existe simplesmente o decoro de uma distinção essencial.
Em simultâneo, decreta-se a falência dos mecanismos de auto-regulação e de regulação do mercado. Com entusiasmo, anuncia-se a decadência como estádio terminal na gloriosa caminhada para a extinção do capitalismo. Os defensores da economia de mercado salvaguardam os benefícios do sistema, mas ressalvam o falhanço de uma ética capitalista e denunciam o predomínio da ganância. Este é exactamente o argumento que mantém vivo o ideal socialista face ao colapso dos regimes populares – a natureza corrupta do Homem não esteve à altura das exigências do ideal político. Quando a Esquerda condena a intervenção do Estado e a Direita justifica a intervenção do Estado, tal significa a dificuldade da ideologia política perante a complexidade, as contigências e a imperfeição dos Homens e do Mundo.
À confusão ideológica junta-se a inexistência de soluções alternativas ao sistema capitalista. Não existe a intenção de um regresso a Marx, não é visível a definição de um neo-keynesianismo emergente, não é observável a declaração de uma solução corporativa tão ao gosto da extrema-direita. O capitalismo é o centro de todos os ressentimentos e o último obstáculo à existência de todas as alternativas.
No entanto, a essência do capitalismo é a concorrência. Por extensão, o capitalismo necessita do efeito de competição que só a alternativa de um outro sistema económico pode garantir. Perante o vazio das alternativas políticas, a economia de mercado tenta reinventar-se contra o espectro do fim da História.
A crise financeira internacional vem chamar a atenção para uma versão do dilema liberal – quando tudo aponta para a existência de uma ameaça, uma ameaça que ainda pode ser controlada pela acção humana, deve-se agir ou permanecer sentado sobre as mãos no topo da teoria? A teoria não salvou a União Soviética. Nas teorias não há lugar para um Mundo em aberto."
Carlos Marques de Almeida
1 Comments:
Há por aí grande confusão nessa cabeça.
O capitalismo, mesmo nos estados socialistas existia e Marx, não inventou coisa alguma.
Fez afinal uma análise que qualquer capitalista sabia há muito acerca das relações e interacções do mundo da economia, qualquer que fosse a sociedade.
Afinal os políticos depois, é que executaram, seguindo as teorias do Iluminismo, as coisas menos boas até às coisas mais bárbaras, sempre em nome do Iluminismo, como fez a Inqusição em nome da Fé e da Igreja.
A meu ver não existem diferenças, apenas a contabilidade das vítimas é que as poderá separar.
Ao que parece continuamos nas trevas, como na Idade Média, continuam então os homens a ser homens, animais, como muito bem diz John Gray no seu excelente livro: " cães de palha, acerca dos humanos e outros animais"
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