Um Orçamento com um pé fora da realidade
"Um Orçamento prevê receitas o melhor possível e fixa despesas. As contas públicas que hoje a Assembleia da República vai aprovar não faz nem uma coisa, nem outra. Nunca nos últimos anos os grandes números do Orçamento do Estado estiveram tão longe do que já se adivinha que será 2009. E pode estar igualmente bastante afastado das medidas expansionistas que o Governo já tomou e ainda poderá ter de adoptar para reanimar a economia.
O Governo, e o ministro das Finanças em particular, sabem que temos pela frente um dos anos mais difíceis desde a década de 70. Ainda ontem o comissário europeu Joaquin Almunia, responsável pelos assuntos económicos e financeiros, afirmou que a crise europeia se vai arrastar até 2010. Todos os economistas e governantes sabem que a situação que estamos a viver é extremamente complexa e difícil de combater. Por que não partilha então o Executivo essas dificuldades com os portugueses? Porquê se sabe também que lemos, ouvimos e vemos os discursos e medidas adoptadas nos outros países assim como as mais diversas análises?
A gestão das expectativas é a resposta a essa questão. O Governo está convencido que tem de ter um discurso optimista. Espera que essa visão menos realista actue como factor de resistência à queda da actividade das empresas. Que adie o mais possível as decisões de despedimento, de adiamento de projectos, de corte nas compras.
É verdade que quando o ministro das Finanças corrigiu as suas previsões de crescimento para este ano em Maio, alguns indicadores afundaram. Olhando para isso, o Governo pode convencer-se que está a contribuir para reduzir a velocidade a que vamos entrar em recessão.
Gerir o que as pessoas esperam do futuro exige uma aproximação, mínima que seja, ao que de facto se está a passar. Se assim não for, enfrenta-se o sério risco de obter um resultado oposto ao que se desejava. Mais grave ainda, há o risco de se transmitir uma ideia de desconhecimento ou desorientação face ao que se está a passar. O que provocará nas empresas e famílias reacções de precaução que aprofundam a crise. E com a crise a afectar seriamente a classe média, criará condições para se generalizar um sentimento de desprotecção, convidando à revolta.
O risco de instabilidade social sempre presente numa recessão é aqui ampliado pelo facto de esta crise estar a ser marcada pela salvação de bancos com dinheiro dos impostos, com casos como o do BPN onde se praticaram crimes. A banca tem desde há algum tempo a sua imagem degradada e ligada a uma classe de poder e dinheiro, imune à justiça.
O quadro da actual crise é de uma complexidade muito preocupante. Problemas complexos, à vista de todos e dolorosos já para muitos não se resolvem com "papas e bolos". O discurso do Governo, distanciado da realidade, é cada vez mais arriscado e perigoso.
O Orçamento do Estado para 2009 deveria ser uma oportunidade para o Governo falar ao país sobre as dificuldades que neste momento se adivinham no horizonte. As contas públicas deveriam estar a transmitir a preocupação de quem governa.
Portugal vai entrar em recessão. Os primeiros meses do próximo ano prometem ser extremamente difíceis. Não há medidas que evitem a crise que aí vem. Há apenas acções que podem moderar a dor e atitudes que podem gerar confiança em quem nos governa."
Helena Garrido
O Governo, e o ministro das Finanças em particular, sabem que temos pela frente um dos anos mais difíceis desde a década de 70. Ainda ontem o comissário europeu Joaquin Almunia, responsável pelos assuntos económicos e financeiros, afirmou que a crise europeia se vai arrastar até 2010. Todos os economistas e governantes sabem que a situação que estamos a viver é extremamente complexa e difícil de combater. Por que não partilha então o Executivo essas dificuldades com os portugueses? Porquê se sabe também que lemos, ouvimos e vemos os discursos e medidas adoptadas nos outros países assim como as mais diversas análises?
A gestão das expectativas é a resposta a essa questão. O Governo está convencido que tem de ter um discurso optimista. Espera que essa visão menos realista actue como factor de resistência à queda da actividade das empresas. Que adie o mais possível as decisões de despedimento, de adiamento de projectos, de corte nas compras.
É verdade que quando o ministro das Finanças corrigiu as suas previsões de crescimento para este ano em Maio, alguns indicadores afundaram. Olhando para isso, o Governo pode convencer-se que está a contribuir para reduzir a velocidade a que vamos entrar em recessão.
Gerir o que as pessoas esperam do futuro exige uma aproximação, mínima que seja, ao que de facto se está a passar. Se assim não for, enfrenta-se o sério risco de obter um resultado oposto ao que se desejava. Mais grave ainda, há o risco de se transmitir uma ideia de desconhecimento ou desorientação face ao que se está a passar. O que provocará nas empresas e famílias reacções de precaução que aprofundam a crise. E com a crise a afectar seriamente a classe média, criará condições para se generalizar um sentimento de desprotecção, convidando à revolta.
O risco de instabilidade social sempre presente numa recessão é aqui ampliado pelo facto de esta crise estar a ser marcada pela salvação de bancos com dinheiro dos impostos, com casos como o do BPN onde se praticaram crimes. A banca tem desde há algum tempo a sua imagem degradada e ligada a uma classe de poder e dinheiro, imune à justiça.
O quadro da actual crise é de uma complexidade muito preocupante. Problemas complexos, à vista de todos e dolorosos já para muitos não se resolvem com "papas e bolos". O discurso do Governo, distanciado da realidade, é cada vez mais arriscado e perigoso.
O Orçamento do Estado para 2009 deveria ser uma oportunidade para o Governo falar ao país sobre as dificuldades que neste momento se adivinham no horizonte. As contas públicas deveriam estar a transmitir a preocupação de quem governa.
Portugal vai entrar em recessão. Os primeiros meses do próximo ano prometem ser extremamente difíceis. Não há medidas que evitem a crise que aí vem. Há apenas acções que podem moderar a dor e atitudes que podem gerar confiança em quem nos governa."
Helena Garrido
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