domingo, agosto 09, 2009

Tolerância Zero

"Num sistema de Tolerância Zero, as autoridades que têm poder devem ser incentivadas a agir segundo padrões pré-determinados. Esses padrões devem ter como meta principal a ética, a rectidão de comportamentos, o bom exemplo, tudo baseado em leis que ajudem a purificar o sistema e não a contaminá-lo.

Na vida pública, na regulamentação do exercício das funções que estejam ao serviço do País, quer por via de eleições, quer por outra via legal possível, a regra deve ser de Tolerância Zero. Quem exerce funções públicas (políticos, governantes, autarcas, juízes e outras) deve saber e ter a consciência de que o poder que tem nas mãos lhe confere maiores responsabilidades, mais riscos e uma menor garantia dos seus direitos.

Vem isto a propósito do sistema político e eleitoral que temos. É sério e legítimo considerar ou aceitar que o sistema eleitoral tenha uma malha jurídica tão larga e tão abrangente que deixe passar tudo e que se resguarde por baixo do guarda-chuva da presunção de inocência ou do trânsito em julgado de uma decisão? Claro que não.

Bem sei que é o que diz a Constituição e as leis criminais. Mas, em nome da transparência do regime democrático, da confiança que nele deve ser depositada pelo conjunto da comunidade, as normas constitucionais e as leis criminais também se alteram. A Constituição não é nenhuma ‘vaca sagrada’ que não possa ser revista. Haja vontade política, coerência e coragem.É o que tem faltado.

O que mina a confiança dos cidadãos nos políticos é esta hipocrisia doentia, esta falta de coragem, de quererem continuar a exercer funções públicas mesmo depois de terem sido acusados, pronunciados ou condenados pela prática de crimes graves no exercício dessas funções.

E aqui a culpa é de toda a classe política, de todos os partidos sem excepção, do poder legislativo, que querem agarrar a Lua com as duas mãos, servindo-se do poder e não estando ao serviço deste.

Era muito fácil por via legislativa, através da lei eleitoral, impor um regime de Tolerância Zero que impedisse qualquer candidatura, partidária ou independente, de concorrer a eleições caso estivesse em causa alguém pronunciado, no exercício das suas funções, por crimes de corrupção, peculato ou branqueamento de capitais. A Tolerância Zero radicava da pronúncia, de nada valendo a presunção de inocência nem a morosidade da decisão para fazer o resto.

Ninguém é obrigado a ir para a política. Este seria o risco a pagar por quem põe o poder ao seu serviço e interesses privados. A Tolerância Zero nunca podia ser aplicada pelos partidos, porque os amigos arguidos estavam sempre safos. Basta ver o que está a passar-se com as listas do PSD para o Parlamento. É por tudo isto que o regime político está contaminado
."

Rui Rangel, Juiz

1 Comments:

Blogger Toupeira said...

O Meritíssimo Juíz deveria lembrar-se de um processo em que o principal implicado não foi constituido arguido, quando no mesmo processo muitos outros foram.
Mas era Ministro não era?
Agora é PM, não é?
Porque será que não foi indiciado ou constituido arguido, será um boi ou uma vaca sagrada, ou o meritíssimo só olha em frente, terá palas laterais, o Meritíssimo?
Julga então Vossa Excelência que somos todos estúpidos?
À parte tudo o resto, a conversa está certíssima sobre ética e sobre o que deve e não deve acontecer, só falta dizer o que não deveria, ou deveria ter acontecido, mas isso deverá o Meritíssimo perguntar aos seus correligionários de curso e de carreiras.
Será assim?
Pois arrisca-se sempre a Excelência, a se sujeitar a críticas, coisa a que habitualmente não estará habituado, serão também aqui a presença de vacas sagradas que o impedem de ser?

segunda-feira, agosto 10, 2009  

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