Casamento de conveniência
"Um fotógrafo cometeu a proeza de registar o mais fugaz dos momentos, pleno de simbolismo histórico, nas comemorações do armistício de 11 de Novembro em Paris: Angela Merkel e Nicolas Sarkozy de mãos dadas.
Seria fácil criticar a forma ostensiva como exibiram a amizade franco-alemã quando se sabe que as relações entre ambos nos últimos dois anos e meio foram tudo menos cor-de-rosa.
Confesso que sou daqueles que considera o simbolismo algo de extremamente importante, até porque pode inaugurar um novo período de cooperação entre os dois países. Não será a reedição da amizade entre Helmut Kohl e François Mitterrand. No entanto, uma análise racional das opções políticas dos dois líderes leva-nos a concluir que é do seu interesse adoptarem, não uma ‘entente cordiale', mas uma ‘entente stratégique'. Por três razões.
A primeira, e a mais importante, pelo vazio de liderança no resto da Europa. A Comissão Europeia há muito que deixou de assegurar uma liderança eficaz. Herman van Rompuy, recém nomeado presidente do Conselho Europeu terá, sem dúvida, menos visibilidade do que Merkel e Sarkozy. E no que respeita aos líderes dos restante países grandes da Europa - Reino Unido, Itália e Espanha -, não constituem alternativa.
A segunda razão prende-se com o facto dos dois países terem mais em comum do que à primeira vista pode parecer. As suas economias são estruturalmente diferentes, porém, menos do que se diz. A visão política poderá também ser distinta, mas Merkel e Sarkozy terão, mais tarde ou mais cedo, de acordar uma estratégia orçamental credível para evitarem pressões que possam comprometer a moeda única.
A terceira razão remete para a permanência no poder. Se ambos vencerem as próximas eleições, as relações bilaterais manter-se-ão por mais oito anos. Nem um nem outro deixará a sua inimizade pessoal interferir no processo de cooperação. Isto não significa que passarão a concordar com tudo aquilo que discordaram até aqui. Mas há pontos em comum como a visão sobre o futuro do capitalismo. Consideram-se liberais no respectivo contexto nacional, embora críticos da "variante" anglo-saxónica. Juntos, os dois países serão, talvez, as únicas potências na zona euro.
Os interesses franceses e alemães raramente foram coincidentes nas décadas de 70, 80 e 90. O valor da sua relação residia na capacidade pontual de se unirem quando isso podia fazer a diferença. Se assim não fosse não teria havido sistema monetário europeu nos anos 70 nem tratado de Maastricht e moeda única nos anos 90. A amizade franco-alemã é vista actualmente como necessária, importante e desejável, mormente pelos cidadãos dos dois países. O contrário poderia levantar dúvidas sobre a coesão da zona euro a longo prazo.
À laia de conclusão, cito o desejo expresso por Angela Merkel em Paris: "Os nossos países precisam de melhorar a sua relação". Já não era sem tempo."
Wolfgang Münchau
Seria fácil criticar a forma ostensiva como exibiram a amizade franco-alemã quando se sabe que as relações entre ambos nos últimos dois anos e meio foram tudo menos cor-de-rosa.
Confesso que sou daqueles que considera o simbolismo algo de extremamente importante, até porque pode inaugurar um novo período de cooperação entre os dois países. Não será a reedição da amizade entre Helmut Kohl e François Mitterrand. No entanto, uma análise racional das opções políticas dos dois líderes leva-nos a concluir que é do seu interesse adoptarem, não uma ‘entente cordiale', mas uma ‘entente stratégique'. Por três razões.
A primeira, e a mais importante, pelo vazio de liderança no resto da Europa. A Comissão Europeia há muito que deixou de assegurar uma liderança eficaz. Herman van Rompuy, recém nomeado presidente do Conselho Europeu terá, sem dúvida, menos visibilidade do que Merkel e Sarkozy. E no que respeita aos líderes dos restante países grandes da Europa - Reino Unido, Itália e Espanha -, não constituem alternativa.
A segunda razão prende-se com o facto dos dois países terem mais em comum do que à primeira vista pode parecer. As suas economias são estruturalmente diferentes, porém, menos do que se diz. A visão política poderá também ser distinta, mas Merkel e Sarkozy terão, mais tarde ou mais cedo, de acordar uma estratégia orçamental credível para evitarem pressões que possam comprometer a moeda única.
A terceira razão remete para a permanência no poder. Se ambos vencerem as próximas eleições, as relações bilaterais manter-se-ão por mais oito anos. Nem um nem outro deixará a sua inimizade pessoal interferir no processo de cooperação. Isto não significa que passarão a concordar com tudo aquilo que discordaram até aqui. Mas há pontos em comum como a visão sobre o futuro do capitalismo. Consideram-se liberais no respectivo contexto nacional, embora críticos da "variante" anglo-saxónica. Juntos, os dois países serão, talvez, as únicas potências na zona euro.
Os interesses franceses e alemães raramente foram coincidentes nas décadas de 70, 80 e 90. O valor da sua relação residia na capacidade pontual de se unirem quando isso podia fazer a diferença. Se assim não fosse não teria havido sistema monetário europeu nos anos 70 nem tratado de Maastricht e moeda única nos anos 90. A amizade franco-alemã é vista actualmente como necessária, importante e desejável, mormente pelos cidadãos dos dois países. O contrário poderia levantar dúvidas sobre a coesão da zona euro a longo prazo.
À laia de conclusão, cito o desejo expresso por Angela Merkel em Paris: "Os nossos países precisam de melhorar a sua relação". Já não era sem tempo."
Wolfgang Münchau
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