Tragédia grega
"Quase caía da cadeira quando ouvi Angela Merkel dizer que a União Europeia podia tomar a si a gestão ocasional da política orçamental de países membros altamente endividados.
Estará a chanceler alemã a afastar-se de um sistema de coordenação da política orçamental fiscal assente em regras? Talvez não. Se bem entendi a sua curta declaração, refere-se apenas aos períodos de crise. Mas estamos aqui perante a proposta de ‘governance' mais abrangente alguma vez emanada da Alemanha. A sua proposta surgiu no seguimento da crise grega, uma crise que pôs a nu as fraquezas do pacto de estabilidade e crescimento da Europa. A resposta europeia é, em parte, a grande culpada por esse desastre. Em Novembro os ministros das Finanças europeus conceberam um plano que passava por colocar a Grécia num regime de austeridade à semelhança do que acontecera com a Irlanda - um plano credível de redução do défice a médio prazo. E para justificar a urgência deste plano, foram muitos os ministros das Finanças e os banqueiros centrais que expressaram as suas preocupações. Axel Weber, presidente do Bundesbank, avisou que as obrigações gregas não poderiam ser eternamente garantidas pelo banco central. Jean-Claude Juncker, presidente do eurogrupo de ministros das Finanças da zona euro não se cansou de expressar a sua indignação face às más práticas gregas.
Mas estas medidas e posições não ajudaram a resolver o problema, tendo contribuído antes para o seu agravamento. Em vez de impedir uma crise, os responsáveis políticos europeus, obcecados com os seus procedimentos internos e alheios ao que se passava nos mercados financeiros globais quase provocaram uma outra crise.
Ao culpar as entidades europeias não estou com isto a ser condescendente com a forma como os sucessivos governos gregos se comportaram. Os líderes políticos do país agiram de má fé, interpretaram mal as estatísticas e não fizeram esforços suficientes no sentido de cumprirem as regras. Mas provocar uma crise não é uma forma de lidar com o problema.
Tudo isto é mau sobretudo para a UE. O problema reside sobretudo no pacto de estabilidade e crescimento que já havia falhado na anterior recessão. Reformado em 2005, tornou-se desde então mais flexível. Mas quando a crise financeira rebentou, perdeu a sua sustentação. O problema não reside, ao contrário do que tem sido dito, no facto de os países terem défices orçamentais superiores a 3% do PIB. Trata-se de algo perfeitamente normal durante uma crise, mesmo nos termos do pacto existente. O problema reside na dificuldade em coordenar estratégias de saída vinculativas entre os estados membros. O pacto prende-se com procedimentos e a Grécia não seguiu os procedimentos de boa fé. E o mesmo aconteceu com outros estados membros, incluindo a França.
Daí a ideia de Merkel de um regime separado de gestão de crises. Mas se quiser levar mais a peito a sua proposta terá que aceitar também outras dimensões da gestão de crises, nomeadamente políticas de resolução financeira comuns, uma supervisão mais eficaz dos bancos a nível da EU, estímulos fiscais e políticas estruturais. A zona euro precisa, sem dúvida de um regime de gestão de crises capaz de fazer face às condições macroeconómicas difíceis com que nos deparamos actualmente."
Wolfgang Münchau
Estará a chanceler alemã a afastar-se de um sistema de coordenação da política orçamental fiscal assente em regras? Talvez não. Se bem entendi a sua curta declaração, refere-se apenas aos períodos de crise. Mas estamos aqui perante a proposta de ‘governance' mais abrangente alguma vez emanada da Alemanha. A sua proposta surgiu no seguimento da crise grega, uma crise que pôs a nu as fraquezas do pacto de estabilidade e crescimento da Europa. A resposta europeia é, em parte, a grande culpada por esse desastre. Em Novembro os ministros das Finanças europeus conceberam um plano que passava por colocar a Grécia num regime de austeridade à semelhança do que acontecera com a Irlanda - um plano credível de redução do défice a médio prazo. E para justificar a urgência deste plano, foram muitos os ministros das Finanças e os banqueiros centrais que expressaram as suas preocupações. Axel Weber, presidente do Bundesbank, avisou que as obrigações gregas não poderiam ser eternamente garantidas pelo banco central. Jean-Claude Juncker, presidente do eurogrupo de ministros das Finanças da zona euro não se cansou de expressar a sua indignação face às más práticas gregas.
Mas estas medidas e posições não ajudaram a resolver o problema, tendo contribuído antes para o seu agravamento. Em vez de impedir uma crise, os responsáveis políticos europeus, obcecados com os seus procedimentos internos e alheios ao que se passava nos mercados financeiros globais quase provocaram uma outra crise.
Ao culpar as entidades europeias não estou com isto a ser condescendente com a forma como os sucessivos governos gregos se comportaram. Os líderes políticos do país agiram de má fé, interpretaram mal as estatísticas e não fizeram esforços suficientes no sentido de cumprirem as regras. Mas provocar uma crise não é uma forma de lidar com o problema.
Tudo isto é mau sobretudo para a UE. O problema reside sobretudo no pacto de estabilidade e crescimento que já havia falhado na anterior recessão. Reformado em 2005, tornou-se desde então mais flexível. Mas quando a crise financeira rebentou, perdeu a sua sustentação. O problema não reside, ao contrário do que tem sido dito, no facto de os países terem défices orçamentais superiores a 3% do PIB. Trata-se de algo perfeitamente normal durante uma crise, mesmo nos termos do pacto existente. O problema reside na dificuldade em coordenar estratégias de saída vinculativas entre os estados membros. O pacto prende-se com procedimentos e a Grécia não seguiu os procedimentos de boa fé. E o mesmo aconteceu com outros estados membros, incluindo a França.
Daí a ideia de Merkel de um regime separado de gestão de crises. Mas se quiser levar mais a peito a sua proposta terá que aceitar também outras dimensões da gestão de crises, nomeadamente políticas de resolução financeira comuns, uma supervisão mais eficaz dos bancos a nível da EU, estímulos fiscais e políticas estruturais. A zona euro precisa, sem dúvida de um regime de gestão de crises capaz de fazer face às condições macroeconómicas difíceis com que nos deparamos actualmente."
Wolfgang Münchau
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