sexta-feira, julho 08, 2011

"Rating" de choque

"A Moody"s procedeu a um forte corte de notação de "rating" do Estado português, tendo em consideração o potencial de contágio da crise grega e a forma de resolução europeia encontrada para a partilha de perdas com investidores privados.


Enfatizou, sobretudo, aspectos extrínsecos à vontade e capacidade exclusiva de actuação de Portugal. Acresce que, como as agências de "rating" tendem a apresentar decisões alinhadas e as avaliações dos bancos acompanham a dos estados onde se inserem, o anúncio desta semana pode ter sido o primeiro de uma série.

Os analistas da Moody's referem que os bancos portugueses podem ter de recorrer à facilidade de garantia do Estado e/ou ao fundo de capitalização, consignados no Memorando de Entendimento. O valor das garantias que os bancos portugueses submetem ao Banco Central Europeu para obtenção de crédito, por descida da notação de crédito do estado, vai reduzir-se. Para o mesmo montante de financiamento obtido junto do BCE, as instituições portuguesas têm de reforçar os títulos apresentados como colateral. No caso do valor dos colaterais aceites pelo BCE se aproximar do crédito obtido e os bancos não disporem de títulos adicionais, terão de recorrer à emissão de obrigações com garantia do Estado para submeter ao BCE de modo a assegurar a manutenção ou aumento do crédito junto da (quase) única fonte de financiamento externo. (Alternativamente, poderão acelerar o ritmo de redução do rácio crédito-depósitos.) Por outro lado, os bancos portugueses têm de cumprir metas de requisitos mínimos de capital mais exigentes até final de 2011 e 2012. Na medida em que os activos do balanço, para cálculo do rácio de capital, são ponderados segundo regras que recorrem ao "rating" do Estado, alguns activos vão agora exigir mais capital que no passado, endurecendo as metas estabelecidas. Pela sua actuação, a Moody's torna os acontecimentos que antecipa mais prováveis.

É verdade que as autoridades europeias podiam reduzir a sua dependência das agências de "rating". Contudo, esta diminuição da dependência restringe-se às regras exigidas pelo BCE para valorização dos activos aceites como garantia dos empréstimos aos bancos. No que respeita à regulação do sistema bancário europeu, designadamente no respeitante aos requisitos mínimos de capital, esta rege-se por normas internacionais decididas no âmbito do Comité de Basileia, que são aplicáveis a todas as instituições mundialmente, com diferenças regionais menores.

Os países europeus podem criar uma agência europeia. Efectivamente, na França existe uma com dimensão relevante. Contudo, esta nova agência, na medida em que seria gerada por vontade política, despertaria receios de falta de independência ou manipulação, de que as agências norte-americanas são frequentemente acusadas. Segundo: as agências de "rating" existentes dispõem de informação estatística suficiente para produzir análises de risco robustas.
Por exemplo, a Moody's possui informação sobre empresas que lhe possibilita calcular frequências de incumprimento com dados desde 1920. Uma jovem agência de "rating" europeia muito dificilmente conseguia construir bases de dados tão completas para sustentar as suas análises num curto prazo de tempo.

As agências de "rating" só têm a importância que se lhes conferir; mas, muitos modelos e lógicas de negócio estão alicerçados sobre as suas decisões. Uma das soluções mais plausíveis e satisfatórias para a crise da dívida soberana europeia consiste na emissão de eurobonds. Cada país poderia emitir eurobonds (através de um emitente colectivo) até um máximo de dívida de 60% do PIB ou, alternativamente, igual à média europeia num determinado momento (cerca de 80% do PIB em 2010), emitindo o remanescente como dívida subordinada (33% do PIB actualmente em Portugal. A dívida pública atinge 93% do PIB). Esta solução asseguraria taxas de juro aceitáveis para a globalidade dos estados da área do euro, removendo receios de insolvência de algum estado, porque seria atribuído um "rating" AAA para os eurobonds (Novamente, o "rating"!) iguais para todos os países.

A dívida subordinada obteria um "rating" inferior, pagando um prémio face à primeira. Estes títulos de pior qualidade poderiam enfrentar risco de incumprimento ou restruturação sem fazer perigar o edifício da moeda única (à semelhança da dívida municipal nos EUA). Este modelo desejável, para onde se parece caminhar, carece de mecanismos muito exigentes de cumprimento de regras de consolidação orçamental por parte dos estados-membros: os quais ainda não foram adoptados e sem os quais esta alternativa não se concretizará - compreensivelmente
."

Cristina Casalinho

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