quarta-feira, fevereiro 15, 2012

Schadenfreude

"Schadenfreude é uma palavra que só existe na língua alemã, tal como ‘saudade’ só existe para os portugueses e galegos. Os estrangeiros quando tentam traduzir a palavra ‘saudade’ dizem que é uma espécie de nostalgia.

Quando tentam traduzir ‘schadenfreude', não tendo uma palavra com igual acepção, dizem que é uma espécie de sentimento de alegria ou prazer pelo sofrimento ou infelicidade dos outros.

Esta palavra vem a propósito da crise europeia que a Alemanha está há mais de dois anos a tentar resolver, de uma forma quase unilateral, e com pouco sucesso. Pedir à Alemanha que resolva a crise na Europa é a mesma coisa que pedir a uma empresa de venda de armamento para servir de mediadora num processo de negociação de paz. Porque, quer se goste, quer não se goste, a Alemanha está a ganhar com a crise.

Na maior crise financeira dos últimos 80 anos, o PIB alemão está a crescer 3% e o desemprego caiu para os 6,7%, o valor mais baixo dos últimos 20 anos. Os sindicatos da função pública e do sector metalúrgico estão a negociar aumentos salariais a rondar os 6,5%. O défice alemão caiu para 1% e ficou abaixo dos 3% impostos pelo PEC pela primeira vez em três anos.

A economia alemã tem uma balança comercial altamente excedentária e, na semana passada, foi anunciado que as exportações ultrapassaram, pela primeira vez, a mítica barreira de um bilião de euros. E se pensam que os alemães estão deslumbrados com o consumo e não estão a poupar, desenganem-se: a taxa de poupança ultrapassou os 17%, a mais alta da Europa. Mas as boas notícias não se ficam por aqui. A Alemanha está a beneficiar do fenómeno do ‘flight to quality' na Europa, com os investidores a fugirem dos países periféricos para se refugiarem nas ‘bunds'. Berlim está a vender dívida de curto prazo com ‘yields' negativas, o que quer dizer que os investidores estão dispostos a perder dinheiro para emprestarem à Alemanha.

Este tem sido o grande erro da Europa. A crise está a ser resolvida por quem está a ganhar com a crise e o papel das instituições europeias (Conselho e Comissão) tem sido uma nulidade. Hoje todos nós sabemos quem é a senhora Merkel e o senhor Schäuble, os senhores que mandam nisto tudo. Mas se perguntarem aos europeus quem é Van Rompuy são capazes de dizer que é uma marca de aspiradores. Catherine Ashton deve ser alguma espécie de automóvel de alta cilindrada, Juncker algum tipo de esquentador e Barroso é capaz de ser um bom vinho português.

Enquanto esta arquitectura de poder se mantiver na Europa, e enquanto tivermos uma Europa a duas velocidades, vamos ficar sempre com esta sensação de que os alemães estão a sentir aquela coisa do ‘schadenfreude'.
"

Pedro Sousa Carvalho

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