sexta-feira, novembro 02, 2012

Antes da refundação, o Governo tem de sobreviver

"O debate parlamentar do Orçamento do Estado foi esquizofrénico. Os deputados e o Governo deviam estar reunidos para discutir e votar as medidas e previsões para 2013 mas, na verdade, falou-se mais da suposta “refundação” que chegará em 2014.


Quem acompanhou o debate ficou com a impressão de que o Orçamento para o próximo ano é doce como o mel. Infelizmente é mais amargo do que o vinagre. É o maior ataque aos contribuintes desde o 25 de Abril, com a subida de vários impostos e taxas, destacando-se o IRS que vai tirar mais de metade dos rendimentos a muitos portugueses.

O Orçamento passou na generalidade. O ministro Paulo Portas, em mais um truque de encenação política, fingiu que há espaço para alterações na especialidade. Todos sabemos que Vítor Gaspar não acredita num caminho alternativo. Por isso, no final, tudo ficará na mesma.

Com o Orçamento aprovado, levantam-se duas questões importantes. A primeira é política. O que fará o Presidente da República? Há fortes dúvidas sobre a constitucionalidade de algumas medidas. Perante isto, Cavaco Silva deveria pedir a apreciação preventiva pelo Tribunal Constitucional, até para evitar a repetição do episódio deste ano quando se descobriu que os cortes nos subsídios na função pública eram ilegais com o Orçamento já em execução. Porém, se o Presidente envia o Orçamento e o Tribunal Constitucional chumba a dimensão do agravamento do IRS, o Governo fica em maus lençóis. Terá que inventar mais medidas para reduzir o défice e o Orçamento não arrancará no primeiro dia de 2013. A ‘troika' não vai achar piada nenhuma. Cavaco Silva está numa situação difícil.

A segunda questão é económica. O Orçamento vai entrar na fase mais problemática: a execução. Montar o Orçamento do Estado para 2013 foi difícil mas o confronto com a realidade será muito pior. Há um consenso entre os economistas de que as previsões são optimistas. A recessão será mais grave do que o esperado pelo Governo, o que prejudicará a arrecadação de impostos, mesmo depois da subida brutal das taxas. O ministro das Finanças pode chegar a meio de 2013 e perceber que tem um buraco na execução orçamental, tal como aconteceu este ano. Por isso, já se fala de um plano B de mais de 800 milhões de euros. Mas terá o Governo a capacidade política para impor mais austeridade numa altura em que a contestação social está a aquecer rapidamente?

A refundação do Estado é fundamental para ultrapassar de forma estrutural o desequilíbrio nas contas públicas. É um debate que já devia ter começado há anos. O Governo de Pedro Passos Coelho lança a questão tarde e pode nem chegar lá. Primeiro tem de passar 2013, que será um ano horrível para os portugueses."

Bruno Proença

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