sexta-feira, dezembro 26, 2003

Um conto erótico na legítima versão Portuguesa

Era a terceira vez que aquele substantivo e aquele artigo se encontravam no elevador. Um substantivo masculino, com um aspecto plural e alguns anos bem vividos pelas preposições da vida. O artigo era bem definido, feminino, singular: era ainda novinha, mas com um maravilhoso predicado nominal.

Era ingênua, silábica, um pouco átona até, ao contrário dele: um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanáticos por leituras e filmes ortográficos.

O substantivo gostou da situação: os dois sozinhos, num lugar sem ninguém ver e ouvir. Sem perder a oportunidade, começou a insinuar-se, a perguntar, a conversar. O artigo feminino deixou as reticências de lado, e permitiu esse pequeno indíce.

De repente, o elevador pára só com os dois lá dentro: óptimo, pensou o substantivo, mais um bom motivo para provocar alguns sinônimos. Pouco tempo depois, quando já estavam entre parênteses, o elevador recomeça a movimentar-se: só que em vez de descer, sobe e pára justamente no andar do substantivo.

Ele usou toda a sua flexão verbal e levou-a ao seu aposto. Ligou o fonema, e ficaram alguns instantes em silêncio, a ouvir uma fonética clássica, suave e agradável.

Prepararam uma sintaxe dupla para ele e um hiato com gelo para ela. Estavam a conversar, sentados num vocativo, quando ele começou outra vez a insinuar-se. Ela foi deixando, ele foi usando seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo, todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo directo.

Começaram a aproximar-se, ela a tremer de vocabulário, ele a sentir o seu ditongo crescente. Abraçaram-se numa pontuação tão minúscula, que nem um período simples passaria entre eles. Estavam nessa ênclise quando ela confessou que ainda era vírgula, ele não perdeu o ritmo e sugeriu um longo ditongo oral e, quem sabe, talvez, uma ou outra soletrada em seu apóstrofo.

É claro que ela deixou-se levar por essas palavras, estava totalmente oxítona às vontades dele, e foram para o comum de dois gêneros. Ela totalmente voz passiva, ele voz ativa.

Entre beijos, carícias, parônimos e substantivos, ele avançou cada vez mais: ficaram uns minutos nessa próclise, e ele, com todo o seu predicativo do objecto, ia tomando conta dela. Estavam na posição de primeira e segunda pessoas do singular, ela era um perfeito agente da passiva, ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen ainda singular.

Nisto a porta abriu-se repentinamente. Era o verbo auxiliar do edifício. Ele tinha percebido tudo, e entrou a disparar conjunções e adjetivos contra ambos, que se encolheram gramaticalmente, cheios de preposições, locuções e exclamativas. Mas ao ver aquele corpo jovem, numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica, o verbo auxiliar diminuiu seus advérbios e declarou o seu particípio na história.

Os dois olharam-se, e viram que isso era melhor do que uma metáfora por todo o edifício. O verbo auxiliar entusiasmou-se e mostrou o seu adjunto adnominal.

Espantoso! Aquilo não era sequer comparativo: era um superlativo absoluto. Aproximou-se deles, com aquela coisa maiúscula, aquele predicativo do sujeito apontado para seus objetos. Chegou-se cada vez mais perto, comparando o ditongo do substantivo ao seu tritongo, propondo claramente uma mesóclise-a-trois. Só que as condições eram estas: enquanto abusava de um ditongo nasal, penetraria ao gerúndio do substantivo, e culminaria com um complemento verbal no artigo feminino.

O substantivo, vendo que corria o risco de se transformar num artigo indefinido, e a pensar no seu infinitivo, resolveu colocar um ponto final na história: agarrou o verbo auxiliar pelo seu conectivo, atirou-o pela janela e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à língua portuguesa, com o artigo feminino colocado em conjunção coordenativa conclusiva.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

quantas historia ainda existe







???

segunda-feira, agosto 31, 2009  

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