sexta-feira, janeiro 02, 2004

A teoria da cabala ou intoxicação pública.

Com o acesso da defesa ao processo, começam a surgir as surpresas.

O «Jornal de Notícias» noticia que João Guerra, O magistrado do Ministério Público que investigou o processo da Casa Pia, juntou ao inquérito duas cartas anónimas que visam o Presidente da República, Jorge Sampaio, e o comissário europeu António Vitorino.

Em volta do assunto gera-se a habitual exploração mediática sobre essa matéria, aonde, estranhamente, todos juristas contactados pelo referido diário, afirmam que «a lei diz que todos os actos inúteis são proibidos e são passíveis de procedimento criminal contra o magistrado», pelo que o próprio Magistrado João Guerra poderá ter de responder pela inclusão no inquérito das cartas que alegadamente tentam envolver no processo da Casa Pia os nomes de Jorge Sampaio e António Vitorino.

A esses juntaram-se os do costume.

O Bastonário dispara “É inconcebível que um documento que não foi valorizado minimamente e que não tenha servido para qualquer investigação seja mantido de uma forma que torne acessível e que permita este tipo de especulações”

“Começo o ano de novo preocupado, estamos a começar o ano de forma verdadeiramente devastadora. Depois não me venham falar que é a violação do segredo de justiça, aquilo está ali para ser violado, como é óbvio!”

“É evidente que não passa pela cabeça de uma pessoa sensata que de repente houve um conjunto de dirigentes de um partido, que todos vão começar a ser pedófilos”.

Adelino Granja afina pelo mesmo diapasão, acrescentando que comunicou ao DIAP o nome de um ministro do actual Governo que esses crimes já estão prescritos, visto que os factos terão ocorrido na década de 80, altura em que o actual ministro também exerceu funções governamentais.

Opinião contrária emitiu o juiz conselheiro jubilado do Supremo Tribunal de Justiça, Sá Nogueira, afirmando mesmo que “Imaginemos que alguém não gosta do Ministério Público que trata do caso e manda uma carta anónima para ver se ele não a mete no processo para depois vir dizer que houve ocultação de provas. Imaginem que não gosta do juiz e faz o mesmo para afastar o juiz, seja ele quem for”, exemplificou, prosseguindo: “Alguém que queira atacar ou beneficiar, seja os arguidos seja as vítimas manda uma carta anónima. Uma carta anónima é uma manobra para tentar desfazer alguém ou um acto, sempre cobarde, que é motivado por ódio ou por vingança”.

Acrescentou ainda que “Sempre que tive cartas anónimas enviei-as para o Ministério Público. Era o despacho que eu dava. Uma carta anónima não é considerada no julgamento mas pode servir para desencadear uma investigação, até para se aferir quem e com que finalidade a escreveu”.

Sá Nogueira referiu ainda que o procedimento do procurador João Guerra em anexar a referida carta mais não foi que “o cumprimento de uma indicação dada pelo juiz do processo”.

“Num processo penal, ao contrário de um processo cível, todos os documentos são importantes para o apuramento da verdade”,

Com o evoluir da confusão, a procuradoria-geral da República (PGR) viu-se ontem ‘obrigada’ a emitir um comunicado no qual refere que o chefe de Estado “não foi pronunciado por ninguém ouvido nos autos”, a propósito de uma notícia do JN que revelava a existência de cartas anónimas onde eram referidos os nomes de Jorge Sampaio e de António Vitorino no mega-processo da Casa Pia. Sobre Vitorino, nem uma menção, mas a PGR esclareceu mais tarde que o texto também se aplicava ao comissário.


De toda esta confusão resulta que:

1/ nos autos constam também outras revelações ‘anónimas’ com nomes de políticos do PSD e do CDS-PP Seis do PSD, quatro do PS e dois do PP. Nove homens e três mulheres.

Mas só os dois dos quatro nomes do PS mereceram atenção. Os outros 9 nomes de políticos de direita também foram poupados. Ou seja, os “cabalistas” pegaram só em dois dos 13 nomes, “esquecendo-se” de 9 nomes da "direita" e 2 nomes do PS.

Cumpre perfeitamente os requisitos de intoxicação da opinião pública com a teoria da cabala.

2/ O Bastonário continua a violar os Estatutos da Ordem ao falar do que não sabe e não deve, continuando assim a merecer boa pontuação pelo júri das escutas “pá”.

O que vale é que ele próprio, como afirma, não contribui para “este tipo de especulações”.

De reter a sua afirmação “aquilo ( as cartas ) está ali para ser violado, como é óbvio!”

3/ Adelino Granja confirma as palavras de Pedro Namora. Definitivamente não consegue resistir às pressões exteriores.

Então ele acha estranho que só surjam nomes do PS quando ele próprio denunciou o nome de um ministro do actual Governo, que também exerceu funções governamentais na década de 80 e cujos crimes já estão prescritos.

Esta declaração tem o condão de eliminar da lista o ministro Paulo Portas que na altura não tinha qualquer função governativa.

De qualquer forma louve-se o facto de ele denunciar alguém que já não pode ser condenado.

4/ O juiz conselheiro jubilado do Supremo Tribunal de Justiça, Sá Nogueira, tem toda a razão. Se a carta não fosse junta ao inquérito, o MP seria acusado de andar a destruir provas. Se a junta, é o que se vê.

Não há duvidas que a teoria da cabala está bem estudada.

Será que consegue intoxicar a opinão pública?

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