"Finalmente, alguém no mundo islâmico pôs a mão na consciência e ousou dizer alto a terrível verdade: "Todos os terroristas do mundo são muçulmanos." O autor desta frase, tão verdadeira quanto cruel, não foi (ainda) algum imã, algum dirigente religioso islâmico, mas sim um "civil": o jornalista Abdul-Rahman al-Rashed, director da televisão Al-Arabya e colunista do jornal "Ashark al-Awsat". Seguramente que al-Rashed irá passar por traidor entre os círculos religiosos e grande parte do mundo árabe e muçulmano, tanto mais que à constatação de facto ele acrescenta uma justificação que contém em si mesma a condenação moral da sociedade islâmica de hoje: "Os nossos filhos terroristas são o produto final da nossa cultura corrompida." "
Manda a verdade que se diga que nem todos os terroristas, rigorosamente, são muçulmanos: Israel pratica, com a justificação da autodefesa, uma forma de terrorismo que, nem por ser aprovado e executado ao nível do Estado, deixa de o ser também. O terrorismo político, social e securitário de Israel constitui ainda hoje, aliás, a fonte de legitimação do terrorismo muçulmano aos olhos de uma crescente comunidade de crentes do islão. Reconhecesse Israel, sem subterfúgios de qualquer espécie, o direito dos palestinianos de viverem numa pátria livre e viável, a par do seu próprio direito de viver em fronteiras seguras, e grande parte das justificações políticas ou teológicas do terrorismo islâmico cairia por terra, no mesmo dia. "
A solução é fácil. Obrigue-se Israel a reconhecer a Palestina e o terrorismo acaba. Até na Rússia, grande amiga de Israel. O mundo ficará finalmente seguro.
"É justamente o que não se vê existir hoje no mundo islâmico e, em particular, no mundo árabe: um movimento civilista, o triunfo do homem, da ciência e do progresso sobre o fanatismo religioso. O que outrora fez o esplendor da civilização árabe parece ter sucumbido para sempre na trágica rendição de Granada, como se em 1482 não tivesse caído apenas uma cidade, mas verdadeiramente toda uma civilização. Hoje, sentados sobre os lençóis de petróleo de que depende a sustentação económica do Ocidente, tanto parece bastar aos árabes para justificar a sua superioridade."
Está a começar a abrir os olhos.
"Todos os dias há multidões de cidadãos de países muçulmanos que tentam atravessar o estreito de Gibraltar para Espanha, que tentam emigrar da Argélia para França, da Turquia para a Alemanha, do Paquistão para Inglaterra ou da Palestina para os Estados Unidos. Não vão apenas à procura de trabalho e de condições materiais de vida dignas - que é uma vergonha não encontrarem nos seus países de origem -, mas vão também à procura de tudo o que lhes pode oferecer uma sociedade livre e laica. E é por isso que não existe o movimento contrário: que, mesmo os ocidentais fascinados com o mundo árabe, como eu próprio, não estão dispostos a trocar o modo de vida em que se funda a sua cultura e os seus valores por um outro mundo onde quem manda em nós, na nossa casa, nos nossos hábitos, na nossa família e no nosso país são uns guardiões de um texto dito sagrado, escrito por um Profeta há mais de mil e quinhentos anos, e destinado a povos nómadas do deserto e a sociedades que ou já não existem ou há muito deveriam ter deixado de existir. "
Isso não é verdade. Veja-se as manifestações dos muçulmanos em França contra a proibição de as mulheres usarem os véus. Se fosse verdade o que diz Sousa Tavares, elas ficariam contentes com a proibição porque o uso do véu é humilhante. Quanto ao texto dito sagrado, é isso.
"É preciso que não haja confusão nem pudor algum sobre isto: nós temos razão e eles não. O quinto mandamento dado a Moisés, "não matarás!", é o que distingue os homens dos assassinos. A liberdade individual é infinitamente mais justa e própria da condição humana do que o cumprimento das "verdades" reveladas no código penal medieval que é o Corão."
O quinto mandamento de Moisés não está incluído no Corão.
"Na última edição da PÚBLICA vem uma entrevista feita por Paulo Moura ao marroquino-francês Thami Bréze, presidente da UOIF, a maior organização muçulmana actuante em França. O objectivo que ele diz pretender é conciliar os valores do islão com os da República Francesa. Ora, isto é, em si mesmo, impossível, contraditório e deve levar-nos a desconfiar e a ficar imediatamente alerta: trata-se de um cavalo de Tróia. Não há convivência possível entre os ensinamentos do Corão e os valores civilistas de 1789. Repare-se, por exemplo, como ele coloca a questão do uso do véu islâmico: as raparigas muçulmanas têm a "liberdade" de o não usar, mas, se quiserem seguir a "verdade" que lhes é ensinada nas escolas corânicas e dentro de casa, têm de o usar - ou seja, resta-lhes a liberdade de poderem trair, porque a verdade, essa, há-de permanecer imutável para sempre. "
Este “Cavalo de Tróia” é assim tão difícil de ser enxergado ou o anti-americanismo fala tão alto que cega? No entanto esta conclusão de Sousa Tavares é contraditória com a outra que ele menciona como cauda da imigração islâmica a “procura de tudo o que lhes pode oferecer uma sociedade livre e laica.”
"Mas Thami Bréze também sabe que o Corão é um texto datado, cuja leitura literal não faz hoje o mais pequeno sentido, mesmo para os próprios crentes. Isso torna-o, reconhece ele, um "texto muito perigoso", que requer interpretação e regras, "não se faz como se quer". Logo, "o problema é quem faz a interpretação, quem é a autoridade". Justamente: eis a fragilidade do islão. Não subsiste sem autoridade religiosa, sem clero, sem intérpretes autolegitimados da palavra divina. Só que, ao contrário do catolicismo, não existe uma autoridade suprema que fixe a melhor doutrina, não há concílios, não há encíclicas: cada escola interpreta o Corão como entende ou como melhor lhe serve para outros fins. No Irão, o "ayatollah" Khomeini interpretou-o de tal forma que, de um dia para o outro, o país regrediu cinco séculos; no Afeganistão dos taliban, o extremo chegou ao ponto de as mulheres serem proibidas de estudar, trabalhar, sair à rua e até serem atendidas nos hospitais; na Arábia Saudita, as escolas corânicas formaram os ideólogos da Al-Qaeda, e em Marrocos, na Argélia, no Egipto ou no Sudão, formam hostes de assassinos, para quem matar os próprios vizinhos e irmãos é uma forma suprema de cumprir os mandamentos do Profeta. Qual é então, afinal, a verdade única revelada pelo Corão? "
Simples. Não existe verdade única revelada pelo Corão.
"Ideólogos e dirigentes como Thami Bréze, que vivem no Ocidente e beneficiam da sua cidadania, não podem, não devem acreditar e, honestamente, também não julgo que acreditem nestas visões extremas do texto sagrado. Mas não só a sua condenação do terrorismo islâmico nunca é linear ou aparece sempre mitigada - como se ele não fosse o Mal absoluto do nosso tempo - mas também a sua visão da república e da liberdade é selectiva."
Pois. Não pode, não deve ... Como o mundo é tão simples.
"A liberdade ou é absoluta e idêntica em todas as latitudes ou não é um valor em si mesma, mas apenas um disfarce - e fatalmente provisório. É por isso que, nesta questão da proibição do uso do véu islâmico em França, e contra muitas opiniões bem argumentadas e que dão que pensar, o instinto sempre me disse que a França tem razão. O Estado de direito, o Estado republicano, deve consentir a todos o exercício do seu culto religioso, mas não deve consentir nem a ostentação de símbolos que pretendem invocar uma diferença ou superioridade em razão da religião, nem práticas religiosas que ofendem os princípios em que se funda a democracia e a república. Do mesmo modo que eu, quando vou a um país muçulmano, respeito os valores, os símbolos e as práticas aí existentes e abstenho-me de exibir ou fazer uso dos meus, de modo a poder ofendê-los. "
É aqui que reside a nossa inferioridade. Quando vamos a um país muçulmano, temos de respeitar os seus valores, os seus símbolos e as práticas aí existentes, abstenho-nos de exibir ou fazer uso dos nossos, de modo a poder ofendê-los. Agora o contrário não acontece. Nos países ocidentais, os ocidentais praticamente têm de comportar-se como se estivessem num país muçulmano.
"Na sua génese, o terrorismo é uma batalha ideológica, que o Ocidente tem de travar e de vencer."
Através do diálogo. Muito diálogo.
2 Comments:
O Sousa Tavares quando quer consegue ver bem as coisas. O pior é que geralmente não quer. Veja-se os artigos sobre o FCP. Nem pagos sairiam melhor.
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