Caos e ordem
"A economia precisa da política, não para manter a ordem mas para manter as coisas interessantes.
Momoyo Torimitsu tentou fazer um retrato crítico da globalização: pequenos bonecos a pilhas, vestidos como executivos, rastejavam num mapa mundial, cruzando fronteiras sem qualquer respeito e chocando entre si e contra tudo o que lhes tapasse o caminho na mais perfeita desordem. Uma bela metáfora, mas sem querer a metáfora adquiriu contornos brilhantes. Como os bonecos acabavam por ficar imobilizados por um qualquer obstáculo, uma atraente rapariga tinha de os colocar novamente no chão, e em movimento, noutro sítio qualquer. A economia precisa da política, não para manter a ordem mas para manter as coisas interessantes.
Tradicionalmente o papel das autoridades tem sido o de impor a ordem num mundo demasiado caótico. Hoje tudo mudou ou começa a mudar. Os riscos são exactamente os opostos. Compete às autoridades manter o caos num mundo desejoso de ordem.
Vamos por partes. Se alguns bancos importantes perderam pequenas fortunas isso é absolutamente irrelevante. Alguém as ganhou. O problema não é o dinheiro que mudou de mãos mas o efeito de paralisia induzido no crédito. Em segundo lugar, a paralisia resulta directamente do ponto fraco dos mercados financeiros, o risco de liquidez, para o qual não existem ainda instrumentos adequados. Temos assistido a um crescimento exponencial do número de transacções financeiras, mas quantas transacções têm por objecto contrariar o risco de uma pausa súbita neste fluxo?
O ponto fraco, por outras palavras, é a excessiva estabilidade dos mercados financeiros actuais. No limite tendem para a imobilidade e não se pense que a tendência não é poderosa: a lição dos últimos meses parece ser a de que um mercado onde os mesmos algoritimos repetem as mesmas operações ao longo de períodos alargados não é suficientemente imprevisível e fragmentado. É precisamente quando estes modelos funcionam bem, sem choques informacionais, que o mercado desaparece. Se todos os agentes pensam da mesma maneira, então tem de haver um ponto para o qual todos confluem. Deixo para o próximo texto os perigos da procura de uma ordem financeira global.
Sabemos que os decisores públicos não têm capacidade para avaliar quando existe alavancagem excessiva ou sobrevalorização de activos, pela que a sua função, tão necessária quanto suficiente, deve ser a de compensar falhas de imaginação e contrariar comportamentos de rebanho ou efeitos gravitacionais. A defesa política da tecnologia e da globalização decorre deste objectivo. Para quem não acredita no mercado como única garantia de desordem, há um papel importante para a política."
Bruno Maçães
Momoyo Torimitsu tentou fazer um retrato crítico da globalização: pequenos bonecos a pilhas, vestidos como executivos, rastejavam num mapa mundial, cruzando fronteiras sem qualquer respeito e chocando entre si e contra tudo o que lhes tapasse o caminho na mais perfeita desordem. Uma bela metáfora, mas sem querer a metáfora adquiriu contornos brilhantes. Como os bonecos acabavam por ficar imobilizados por um qualquer obstáculo, uma atraente rapariga tinha de os colocar novamente no chão, e em movimento, noutro sítio qualquer. A economia precisa da política, não para manter a ordem mas para manter as coisas interessantes.
Tradicionalmente o papel das autoridades tem sido o de impor a ordem num mundo demasiado caótico. Hoje tudo mudou ou começa a mudar. Os riscos são exactamente os opostos. Compete às autoridades manter o caos num mundo desejoso de ordem.
Vamos por partes. Se alguns bancos importantes perderam pequenas fortunas isso é absolutamente irrelevante. Alguém as ganhou. O problema não é o dinheiro que mudou de mãos mas o efeito de paralisia induzido no crédito. Em segundo lugar, a paralisia resulta directamente do ponto fraco dos mercados financeiros, o risco de liquidez, para o qual não existem ainda instrumentos adequados. Temos assistido a um crescimento exponencial do número de transacções financeiras, mas quantas transacções têm por objecto contrariar o risco de uma pausa súbita neste fluxo?
O ponto fraco, por outras palavras, é a excessiva estabilidade dos mercados financeiros actuais. No limite tendem para a imobilidade e não se pense que a tendência não é poderosa: a lição dos últimos meses parece ser a de que um mercado onde os mesmos algoritimos repetem as mesmas operações ao longo de períodos alargados não é suficientemente imprevisível e fragmentado. É precisamente quando estes modelos funcionam bem, sem choques informacionais, que o mercado desaparece. Se todos os agentes pensam da mesma maneira, então tem de haver um ponto para o qual todos confluem. Deixo para o próximo texto os perigos da procura de uma ordem financeira global.
Sabemos que os decisores públicos não têm capacidade para avaliar quando existe alavancagem excessiva ou sobrevalorização de activos, pela que a sua função, tão necessária quanto suficiente, deve ser a de compensar falhas de imaginação e contrariar comportamentos de rebanho ou efeitos gravitacionais. A defesa política da tecnologia e da globalização decorre deste objectivo. Para quem não acredita no mercado como única garantia de desordem, há um papel importante para a política."
Bruno Maçães
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