quinta-feira, julho 03, 2008

Ai flores

"O pinhal português está ferido de morte. D. Dinis deve dar voltas no túmulo. Ai flores, ai flores do verde pino! Mas isso que importa se o eucalipto é que dá a pasta e o papel?

O pinhal adoeceu na península de Setúbal em 1999 e, de acordo com as notícias do “Público” de ontem, a doença propagou-se por se ter permitido que a madeira doente circulasse para fora da zona afectada. Provavelmente foi vendida, contaminada, a preços de conveniência e de especulação, perante a indiferença do poder. E agora, o Governo e a União Europeia lavraram a sentença que dá todo o pinhal português como afectado pela doença do pinheiro. São assim os novos lavradores-burocratas: lavram sentenças de morte sobre os campos das culturas passadas.

Todos os anos em Portugal ardem extensas áreas de pinhal e as estatísticas dizem que em grande parte os fogos são de origem criminosa. Vendem-se os salvados da madeira de pinho queimada, urbanizam-se os terrenos ou reflorestam-se com eucalipto, que dá cabo da terra mas dá muito jeito à finança. Agora, com a propagação da doença do pinheiro a todo o território, alcançou-se a “solução final” do pinhal. As notícias de ontem davam conta do temor pelo futuro do pinhal português. Mas qual futuro? O pinhal tem é passado. O futuro é do eucalipto, sem reis-lavradores nem reis-poetas no seu passado. Portugal deixou de rimar com pinhal.

O pinhal, que tem sobrevivido às investidas anuais das chamas, é uma árvore com história ligada à identidade de Portugal. Mas a identidade não conta absolutamente nada para o PIB nem para a Balança de Pagamentos. E as “naus a haver”, “plantadas” por D. Dinis, já foram e por sinal voltaram à deriva, vogando ao sabor dos ventos da História
."

João Paulo Guerra

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