quarta-feira, abril 01, 2009

Ópera bufa

"As vaias e as pateadas são uma vetusta tradição operática, mas apenas durante, ou após, o espectáculo. A originalidade nacional inventou a vaia prévia, como a que agora aconteceu no Centro Cultural de Belém. Mais original ainda, a vaia não se destinou aos cantores, ao compositor, ao autor do libretto ou ao encenador: no caso, foi dirigida ao eng. Sócrates, cujo atraso de 25 minutos na estreia de Crioulo protelou o início da ópera por igual período sem sequer uma justificação, aliás impossível de arranjar, ao auditório.

Se me permitem, os apupos foram pessimamente dirigidos. O eng. Sócrates não tem culpa. O seu homólogo de Cabo Verde, que o acompanhava e que o gabinete do nosso primeiro-ministro tentou responsabilizar pelo incidente, também não. Num país civilizado, qualquer indivíduo tem o direito de chegar à ópera tão atrasado quanto desejar. Num país civilizado, a organização da dita é que tem o dever de não a retardar de acordo com os horários alheios e o porteiro tem instruções para não permitir que ninguém entre na sala antes do final do primeiro acto.

Acontece que isto é Portugal. Irrelevante que seja, o obséquio prestado pelos senhores que, por nomeação política, dirigem o CCB reflecte os obséquios maiores que distinguem, no que verdadeiramente conta, os portugueses que mandam dos restantes. Olhe-se para onde se olhar, há por aí uma imensa aptidão para servir privilégios a uns, migalhas aos outros. Ocasionalmente, estes vaiam as migalhas. Na maioria das vezes, de habituados que estão ao serviço, agradecem-nas
."

Alberto Gonçalves

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