O Estado Social da penúria (I)
"(Onde o autor, evidentemente adepto do Estado Social, chama a atenção, como toda agente de rigor, para o facto de este que temos ser insustentável levando todos ao fundo, enquanto dá umas voltas pelo tempo e pelo espaço, para assentar algumas ideias cruciais).
O tema que hoje trouxe para apontamento é provavelmente o mais importante, na actualidade, para um País em catastrófica situação e em urgência quanto à possível terapêutica e cura. Infelizmente, a necessária discussão sai inquinada por obstinação ideológica ou por luta política travada em termos de demagogia. Suponho que isso seria sempre mais ou menos inevitável, ao fim e ao cabo a luta democrática faz-se em termos de curto prazo e a longo prazo estamos todos mortos. Como dizia Lloyd George, ainda no primeiro quartel do século XX, as medidas previdenciais trazem votos ou não tivessem como beneficiários as franjas mais amplas da população.
Ou fazem perder votos, pois a moeda tem duas faces. Daqui resulta que um adequado consenso nos partidos do arco da governação é imperativo e os jogos de florete no limite do precipício são bons para os filmes do Indiana Jones mas execráveis e irresponsáveis para quem tem responsabilidades de poder. E o ideal seria mesmo o consenso porque o corte de expectativas será de tal ordem que a impopularidade terá de ser repartida, o discurso deverá ser idêntico, esclarecedor e persuasivo e a execução perdurando no tempo. Infelizmente agora não se abrirá a possibilidade que aconteceu com a reforma da Segurança Social promovida pelo ministro Vieira da Silva pois o diferimento temporal dos cortes fez passar despercebida a dor àquelas que a vão suportar, mas não imediatamente.
O realismo e o pragmatismo são determinantes. Sabemos, a OCDE sabe e a União Europeia também - e dizem-no - que a situação é insustentável e não só para Portugal, e, após anos de procrastinação, resistências fátuas e arrastar de pés, o severo aviso da crise orçamental poderá fazer acordar. Quem foi alertando ao longo do tempo não tinha dúvidas que, quando a despesa sobe a múltiplos aterradores e a economia que a iria pagar não acompanha, bem pelo contrário, o resultado é a falência, após um penoso percurso por prestamistas que um dia fecham a torneira do crédito. Mas também sabiam as donas de casa e qualquer pessoa que administre recursos escassos, pois a questão não é ideológica mas aritmética. Para ilustrar este ponto, recordo-me sempre de um dito irónico de Medina Carreira que faz reforçar a substância do reparo: " Os partidos de Esquerda, só pelo facto de o serem, não podem recusar-se a fazer contas e a insultarem os que as fazem". Depois, há um elemento essencial que parece esquecido e esse passa por lembrar que o sistema é financiado por impostos e não por deduções para investimento e a "canga" fiscal tem um limite, acabando por penalizar, por desvio permanente de verbas, o sistema económico que o poderia sustentar.
Isto dito, há que lembrar que o Estado Social, Providência ou de Bem-Estar, chame-se como se quiser chamar, corresponde a um patamar superior da evolução das sociedades humanas e corresponde a um natural anseio das pessoas procurando protecção contra o risco. A história social e financeira está lá para ser vista e convém mesmo que seja vista e estudada porque a experiência histórica e a evidência empírica são os guias a quem use metodologia científica e pretenda resultados e não onirismos de quem anda a "ganzar-se". Seja por mutualismo, por via de seguros, fundos de capitalização ou pelo grande "segurador", o Estado, a citada aspiração humana é para ser realizada e os governos têm que a promover, mas tendo a devida atenção pela governança.
Nem me parece que haja divergência de finalidades das forças políticas, sendo ainda certo que da Direita à Esquerda ambos os lados caminharam no mesmo sentido. A divergência não é de fins é de meios, e convém lembrar que o Estado Social foi fundado por Bismark ("com maior segurança, os homens tornam-se mais razoáveis"), instalado no Japão imperial e o grande impulso foi dado em Inglaterra por Churchill e o seu ministro Beveridge, gente que nem com arroubos de fantasia se pode catalogar na Esquerda. E mais: o estabelecimento na Europa foi tanto por impulso dos sociais-democratas como dos democratas cristãos.
Então, digo eu ingenuamente, se a herança é comum e o desígnio da mesma forma, o que existe é apenas um problema e esses resolvem-se e deslindam-se com engenho, arte e sentido pragmático. Então porque não corre tudo sobre rodas?"
Fernando Braga de Matos
O tema que hoje trouxe para apontamento é provavelmente o mais importante, na actualidade, para um País em catastrófica situação e em urgência quanto à possível terapêutica e cura. Infelizmente, a necessária discussão sai inquinada por obstinação ideológica ou por luta política travada em termos de demagogia. Suponho que isso seria sempre mais ou menos inevitável, ao fim e ao cabo a luta democrática faz-se em termos de curto prazo e a longo prazo estamos todos mortos. Como dizia Lloyd George, ainda no primeiro quartel do século XX, as medidas previdenciais trazem votos ou não tivessem como beneficiários as franjas mais amplas da população.
Ou fazem perder votos, pois a moeda tem duas faces. Daqui resulta que um adequado consenso nos partidos do arco da governação é imperativo e os jogos de florete no limite do precipício são bons para os filmes do Indiana Jones mas execráveis e irresponsáveis para quem tem responsabilidades de poder. E o ideal seria mesmo o consenso porque o corte de expectativas será de tal ordem que a impopularidade terá de ser repartida, o discurso deverá ser idêntico, esclarecedor e persuasivo e a execução perdurando no tempo. Infelizmente agora não se abrirá a possibilidade que aconteceu com a reforma da Segurança Social promovida pelo ministro Vieira da Silva pois o diferimento temporal dos cortes fez passar despercebida a dor àquelas que a vão suportar, mas não imediatamente.
O realismo e o pragmatismo são determinantes. Sabemos, a OCDE sabe e a União Europeia também - e dizem-no - que a situação é insustentável e não só para Portugal, e, após anos de procrastinação, resistências fátuas e arrastar de pés, o severo aviso da crise orçamental poderá fazer acordar. Quem foi alertando ao longo do tempo não tinha dúvidas que, quando a despesa sobe a múltiplos aterradores e a economia que a iria pagar não acompanha, bem pelo contrário, o resultado é a falência, após um penoso percurso por prestamistas que um dia fecham a torneira do crédito. Mas também sabiam as donas de casa e qualquer pessoa que administre recursos escassos, pois a questão não é ideológica mas aritmética. Para ilustrar este ponto, recordo-me sempre de um dito irónico de Medina Carreira que faz reforçar a substância do reparo: " Os partidos de Esquerda, só pelo facto de o serem, não podem recusar-se a fazer contas e a insultarem os que as fazem". Depois, há um elemento essencial que parece esquecido e esse passa por lembrar que o sistema é financiado por impostos e não por deduções para investimento e a "canga" fiscal tem um limite, acabando por penalizar, por desvio permanente de verbas, o sistema económico que o poderia sustentar.
Isto dito, há que lembrar que o Estado Social, Providência ou de Bem-Estar, chame-se como se quiser chamar, corresponde a um patamar superior da evolução das sociedades humanas e corresponde a um natural anseio das pessoas procurando protecção contra o risco. A história social e financeira está lá para ser vista e convém mesmo que seja vista e estudada porque a experiência histórica e a evidência empírica são os guias a quem use metodologia científica e pretenda resultados e não onirismos de quem anda a "ganzar-se". Seja por mutualismo, por via de seguros, fundos de capitalização ou pelo grande "segurador", o Estado, a citada aspiração humana é para ser realizada e os governos têm que a promover, mas tendo a devida atenção pela governança.
Nem me parece que haja divergência de finalidades das forças políticas, sendo ainda certo que da Direita à Esquerda ambos os lados caminharam no mesmo sentido. A divergência não é de fins é de meios, e convém lembrar que o Estado Social foi fundado por Bismark ("com maior segurança, os homens tornam-se mais razoáveis"), instalado no Japão imperial e o grande impulso foi dado em Inglaterra por Churchill e o seu ministro Beveridge, gente que nem com arroubos de fantasia se pode catalogar na Esquerda. E mais: o estabelecimento na Europa foi tanto por impulso dos sociais-democratas como dos democratas cristãos.
Então, digo eu ingenuamente, se a herança é comum e o desígnio da mesma forma, o que existe é apenas um problema e esses resolvem-se e deslindam-se com engenho, arte e sentido pragmático. Então porque não corre tudo sobre rodas?"
Fernando Braga de Matos
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