Doidos por 12 mil milhões
"A troika é um bocado sádica. Diverte-se a fazer pouco dos bancos portugueses. Esta de lhes mandar a conta das suas próprias despesas é apenas mais um vexame. Nisso a banca está coberta de razão: se o Estado pagasse as dívidas das suas empresas é que fazia bem.
A banca está lacaia. Dezenas de inspectores estão a varrer as contas dos bancos; com auditores terceiros; tudo é reportado a um comité que, além da troika e do Banco de Portugal, inclui os bancos centrais... da Espanha, da França e da Bélgica. Isto já não é perda de autonomia, é violação de seriedade. A banca está a ser humilhada e ainda paga a conta. É quase arrogante. É um come-e-cala. É como cantavam os Trabalhadores do Comércio: "Ou taquetinho ou levas no focinho".
A troika é um árbitro, que não é imparcial nem é neutro, no jogo entre dois aflitos, o Estado e a banca. Compreende-se a parcialidade da troika: o dinheiro é emprestado por si. Mas o dinheiro não chega, como subitamente se tornou claro. 78 mil milhões chegam para refinanciar a dívida pública portuguesa. Mas não chegam para refinanciar as dívidas do Sector Empresarial do Estado (SEE). Da Refer, CP, metros, Estradas de Portugal, desse estendal de falidos.
O primeiro impulso do Governo foi primitivo: chamou os bancos e mandou-os emprestar dinheiro às empresas públicas. Sim, mandou-os. Como Sócrates fizera em Março para a dívida pública. Para as empresas públicas, são três mil milhões até ao fim do ano, mais 12 mil milhões no próximo, mais uns oito mil milhões em 2013. Os bancos estrangeiros fogem como de leprosos. Os bancos portugueses não querem nem podem. O Estado "ni hablar".
É evidente que o Estado tem de pagar as suas dívidas aos bancos, à medida que os empréstimos vençam, até porque isso facilita o desendividamento dos bancos e injecta liquidez na economia. Como não há dinheiro, todos olham para o bolo de 12 mil milhões de euros que está exposto para a capitalização estatal e magicam engenharias para lhe dar dentadas. Eis um bolo que está a ser disputado para tudo menos para o que serve, a capitalização da banca. E se é verdade que o Estado deve assumir o pagamento das dívidas das suas empresas, assim ajudando a banca, também é verdade que quatro milhões bastam para pagar as dívidas a fornecedores, assim ajudando as empresas.
A questão do capital (que tem sido aqui analisada) é uma das maiores tensões entre o Estado e a banca. O sector empresarial é outra. A transferência do fundo de pensões dos bancários outra ainda. Assim como a reestruturação da banca (fusões, despedimentos, encerramento de balcões). E a reavaliação da carteira de créditos.
Tudo isto está a ser negociado. Sobre a liquidez, é preciso não esquecer uma coisa: o desendividamento para um rácio de transformação de 120% (os créditos concedidos podem ser superiores aos depósitos recolhidos em apenas 20%) dói mais a uns que a outros. O crédito à habitação reduz devagar, pela inércia de contratos de várias décadas; o crédito ao consumo pesa pouco; sobra o crédito às empresas, é aqui que todo o esforço está a ser feito. Se, nessas, se dá privilégio às empresas públicas, sofrem mais as privadas. E como as privadas grandes têm muito mais influência do que as pequenas, as grandes sacrificadas são as PME. As tais que encostamos à parede e dizemos: "exporta ou morremos". Não se exporta sem investimento, não se investe sem crédito.
O Estado não pode consumir o pouco crédito disponível da banca. Até porque, no final, todos sabemos quem vai pagar a dívida das empresas públicas de transportes. São os contribuintes.
A história está a ficar repetitiva."
Pedro Santos Guerreiro.
A banca está lacaia. Dezenas de inspectores estão a varrer as contas dos bancos; com auditores terceiros; tudo é reportado a um comité que, além da troika e do Banco de Portugal, inclui os bancos centrais... da Espanha, da França e da Bélgica. Isto já não é perda de autonomia, é violação de seriedade. A banca está a ser humilhada e ainda paga a conta. É quase arrogante. É um come-e-cala. É como cantavam os Trabalhadores do Comércio: "Ou taquetinho ou levas no focinho".
A troika é um árbitro, que não é imparcial nem é neutro, no jogo entre dois aflitos, o Estado e a banca. Compreende-se a parcialidade da troika: o dinheiro é emprestado por si. Mas o dinheiro não chega, como subitamente se tornou claro. 78 mil milhões chegam para refinanciar a dívida pública portuguesa. Mas não chegam para refinanciar as dívidas do Sector Empresarial do Estado (SEE). Da Refer, CP, metros, Estradas de Portugal, desse estendal de falidos.
O primeiro impulso do Governo foi primitivo: chamou os bancos e mandou-os emprestar dinheiro às empresas públicas. Sim, mandou-os. Como Sócrates fizera em Março para a dívida pública. Para as empresas públicas, são três mil milhões até ao fim do ano, mais 12 mil milhões no próximo, mais uns oito mil milhões em 2013. Os bancos estrangeiros fogem como de leprosos. Os bancos portugueses não querem nem podem. O Estado "ni hablar".
É evidente que o Estado tem de pagar as suas dívidas aos bancos, à medida que os empréstimos vençam, até porque isso facilita o desendividamento dos bancos e injecta liquidez na economia. Como não há dinheiro, todos olham para o bolo de 12 mil milhões de euros que está exposto para a capitalização estatal e magicam engenharias para lhe dar dentadas. Eis um bolo que está a ser disputado para tudo menos para o que serve, a capitalização da banca. E se é verdade que o Estado deve assumir o pagamento das dívidas das suas empresas, assim ajudando a banca, também é verdade que quatro milhões bastam para pagar as dívidas a fornecedores, assim ajudando as empresas.
A questão do capital (que tem sido aqui analisada) é uma das maiores tensões entre o Estado e a banca. O sector empresarial é outra. A transferência do fundo de pensões dos bancários outra ainda. Assim como a reestruturação da banca (fusões, despedimentos, encerramento de balcões). E a reavaliação da carteira de créditos.
Tudo isto está a ser negociado. Sobre a liquidez, é preciso não esquecer uma coisa: o desendividamento para um rácio de transformação de 120% (os créditos concedidos podem ser superiores aos depósitos recolhidos em apenas 20%) dói mais a uns que a outros. O crédito à habitação reduz devagar, pela inércia de contratos de várias décadas; o crédito ao consumo pesa pouco; sobra o crédito às empresas, é aqui que todo o esforço está a ser feito. Se, nessas, se dá privilégio às empresas públicas, sofrem mais as privadas. E como as privadas grandes têm muito mais influência do que as pequenas, as grandes sacrificadas são as PME. As tais que encostamos à parede e dizemos: "exporta ou morremos". Não se exporta sem investimento, não se investe sem crédito.
O Estado não pode consumir o pouco crédito disponível da banca. Até porque, no final, todos sabemos quem vai pagar a dívida das empresas públicas de transportes. São os contribuintes.
A história está a ficar repetitiva."
Pedro Santos Guerreiro.
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