Pela transparência contra a opacidade deste Estado
Paulo Morais acusa Parlamento de ser "centro de corrupção"
O ex-vice-presidente da Câmara do Porto Paulo Morais afirmou
sexta-feira à noite, no Porto, que "o centro de corrupção em Portugal tem sido a
Assembleia da República, pela presença de deputados que são, simultaneamente,
administradores de empresas".
"Felizmente, este parlamento vai-se embora. Dos 230 deputados, 30%, ou seja
70, são administradores ou gestores de empresas que têm directamente negócios
com o Estado", denunciou Paulo Morais, num debate sobre corrupção organizado
pelo grupo cívico-político Porto Laranja, afecto ao PSD.
Para o professor universitário, o parlamento português "parece mais um
verdadeiro escritório de representações, com membros da comissão de obras
públicas que trabalham para construtores e da comissão de saúde que trabalham
para laboratórios médicos."
Paulo Morais acusou o Grupo Lena de ser o maior fornecedor do Estado
português (dados de 2009) e os políticos de criarem "legislação perfeitamente
impercetível", com "muitas regras para ninguém perceber nada, muitas excepções
para beneficiar os amigos e um ilimitado poder discricionário a quem aplica a
lei".
"A legislação vem dos grandes escritórios de advogados, principalmente de
Lisboa, que também ganham dinheiro com os pareceres que lhes pedem para
interpretar essas mesmas leis e ainda ganham a vender às empresas os alçapões
que deixaram na lei", criticou.
Para o vice-presidente da organização não governamental Transparência
Internacional em Portugal (TIP), "os deputados estão ao serviço de quem os
financiou e não de quem os elegeu", sendo a lei do financiamento dos partidos "a
lei que mais envergonha Portugal".
"Há uma troca permanente de cadeiras entre o governo e os bancos e
construtoras, que são quem financia os partidos", afirmou Paulo Morais, citando
os casos de Jorge Coelho e Valente de Oliveira, administradores da Mota Engil, e
de José Lello, administrador da BST.
Paulo Morais deu como exemplo de corrupção a renegociação que o governo de
José Sócrates fez com as concessionárias das antigas autoestradas sem custos
para o utilizador (SCUT), assinando em Julho de 2010 anexos aos respectivos
contratos que substituem a contagem de tráfego por estimativas de passagem.
"As concessionárias das SCUT são as mesmas que financiam os partidos",
sublinhou, defendendo que o novo Governo deve renegociar de novo esses
contratos, porque apenas beneficiam as construtoras e obrigam o Estado a pagar
muito mais.
Paulo Morais criticou também as "vigarices" na área do urbanismo praticadas
por muitos municípios, acusando-os de "valorizar terrenos à ordem dos dois mil
por cento sem qualquer dificuldade", apenas para beneficiar um determinado
"predador imobiliário".
"Este tipo de máfia só existe em dois tipos de negócios em Portugal: no
urbanismo e no tráfico de droga", frisou, criticando a "promiscuidade absoluta
entre Estado e privados".
Paulo Morais revelou que a TIP está a preparar um portal na Internet,
inspirado no site usaspend.gov que o então senador Barack Obama lançou há alguns
anos para tornar públicos todos os gastos governamentais nos Estados Unidos, em
que será possível encontrar de forma rápida e fácil a informação "aparentemente
pública, mas que não é escrutinável".
O portal deverá ficar online ainda este ano, estando neste momento a ser
trabalhada a ferramenta de pesquisa.
Segundo o responsável, nos últimos 10 anos, Portugal desceu nove lugares no
Índice de Perceção de Corrupção da Transparência Internacional, estando
actualmente na 34.ª posição a nível mundial e numa das piores posições na Europa
(estão atrás apenas a Itália, Grécia e alguns países de Leste).
O bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, que também participou no
debate, defendeu que os advogados devem deixar de exercer a profissão quando são
eleitos deputados.
Marinho Pinto criticou também que as obras públicas em Portugal sejam pagas
sempre por preços superiores aos das adjudicações, afirmando que "isto só é
possível num país onde não há opinião pública e os partidos estão comprometidos
até à medula".
Obrigado, Senhor Professor Paulo Morais.
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