terça-feira, janeiro 08, 2013

Revisão constitucional clandestina

 
A diretora da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, Teresa Pizarro Beleza, alertou hoje para a existência de uma "revisão constitucional clandestina" em curso, criticando algumas decisões do Tribunal Constitucional (TC).
Durante a conferência de comemoração dos 50 anos do Instituto Ciências Sociais, que hoje decorreu na Fundação Calouste Gulbenkian, Teresa Pizarro Beleza lançou o alerta: "Está em curso uma revisão constitucional clandestina".
"Há a ideia de que, em situação de necessidade, vale tudo, inclusivamente passar por cima da Constituição. Mesmo do lado do Tribunal Constitucional, julgo que há decisões ou, pelo menos, votos que são criticáveis e que devem ser cuidadosamente analisados e criticados", defendeu a jurista.
À Lusa, Teresa Pizarro Beleza deu como exemplo a retirada de alguns direitos dos funcionários públicos, como aconteceu com os cortes dos subsídios de férias e de natal.
A especialista considera que existe um discurso que tenta olhar para alguns direitos como sendo "regalias" dos funcionários públicos. Sem discussão, alerta a jurista, essas mudanças poderão, no futuro, pôr em causa os direitos de todos.
A professora da Universidade de Direito teme que, por trás desta argumentação, exista o objetivo de "levar as pessoas a aceitar a ideia de que existe um grupo privilegiado, que são os funcionários públicos, e que é preciso começar a cortar nas regalias deles".
O problema, alertou, é que "as pessoas não se percebem que daqui se passa para cortar a toda a gente. Porque o princípio da igualdade, em vez de funcionar a favor das pessoas discriminadas, acaba por estender essa diminuição de direitos a toda a gente".
"Quer a classe política, quer o próprio Tribunal Constitucional, quer a generalidade dos cidadãos e cidadãs estão dispostos a aceitar uma alteração profunda da sociedade portuguesa que vai no sentido contrário aos valores fundamentais que estão na Constituição: da liberdade, igualdade, dignidade. E penso que é importante as pessoas tomarem consciência dessa situação", alertou.
Há em algumas decisões do TC uma espécie de "ideia de cedência à necessidade económica e financeira", disse Teresa Pizarro Beleza, lamentando a atual ausência de discussão ideológica e questionamento político.
Durante a sua apresentação na Fundação Gulbenkian, a ex-vogal do Conselho Superior do Ministério Público alertou: "Do lado da Assembleia da República e do sistema político português há uma certa resignação de que o tempo de Abril passou e que, neste momento, é preciso ser realista e endurecer as coisas, independentemente do que diz a Constituição. Portanto está em curso uma revisão clandestina da Constituição".
Esta declaração foi fortemente aplaudida pelo público presente na conferência "Portugal em Mudança - Diversidades, Assimetrias e Contrastes", que teve início na segunda-feira e encerrou hoje em Lisboa
Por Agência Lusa, publicado em 27 Nov 2012

 

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