sexta-feira, novembro 12, 2004

Democracia 2.

Quando o ideal democrático começou a ganhar corpo na Grécia, por volta de 508 a.C., observou-se um fenómeno curioso: quanto mais agraciado era um político com o dom da oratória, tanto mais seguramente acendia ele na conceituação do povo e tanto mais rapidamente se destacava na "Assembleia dos Cidadãos", o equivalente da época ao congresso de hoje. Se o que era dito tinha ou não valor, era irrelevante, o que importava era falar bem. Só assim foi possível aos verborrágicos democratas daquele tempo, já suficientemente corrompidos, condenar à morte o sábio Sócrates, apoiados apenas em argumentos incoerentes de um palavreado oco. Estava inaugurado o primeiro crime de vulto acobertado pelo omnipresente escudo democrático. Fazendo referência àquela época, um historiador (*) afirmou textualmente: "Parecia não existir em Atenas um partido no qual um homem que não quisesse abrir mão de princípios éticos pudesse se integrar." Familiar não? Mas não apenas isso. Era quase impossível decidir alguma coisa na Assembleia dos Cidadãos, pois os integrantes frequentemente deixavam de comparecer ao plenário... Ausentavam-se para poder cuidar de seus assuntos particulares...


A democracia é uma das excrescências produzidas pela contínua e irrefreável decadência humana, que vem já de milénios. O fato de sua origem ser tão antiga, demonstra apenas que já naquela época a maior parte da humanidade vivia de forma contrária a determinadas leis que regem o mundo, ou leis naturais. Tudo quanto é edificado em contraposição a essas leis naturais não tem possibilidades de se manter. Dura um certo tempo e se desintegra, por efeito automático dessas mesmas leis. Para quem as conhece não é tão difícil assim fazer previsões, que têm de se cumprir infalivelmente, mais cedo ou mais tarde. Em épocas passadas, quando a humanidade ainda vivia integrada a essas leis, os regimes de governo também eram diferentes. Na Caldeia, em Sabá e mesmo mais recentemente no Império Inca vigorava a verdadeira arte de governar. Poder-se-ia chamar esses regimes de autocracias, porém com diferenças fundamentais em relação ao conceito que se tem hoje dessa forma de governo. Em primeiro lugar, a autocracia daqueles tempos não era o "regime do mais forte", e sim o "regime do mais sábio". E mais sábio era aquele que melhor compreendia as leis da vida e que mais desenvolvido se encontrava espiritualmente.

Os dirigentes eram pessoas que já nasciam predestinadas a governar. Traziam em si um sentido incorruptível da verdadeira justiça e, com sua visão mais ampla que a dos demais, estavam aptos a reconhecer de que forma deveriam conduzir o povo, para que este alcançasse seu máximo desenvolvimento espiritual e terreno. Uma maneira de governar que o ser humano de hoje sequer consegue imaginar, preferindo taxá-la de fantasia…


Aliás, a reacção que sentimos de imediato a essas palavras é bem natural, pois estamos por demais convencidos da capacidade humana em resolver os problemas criados pela própria humanidade. Só mesmo quando todo o errado se auto-exaurir, num completo e indisfarçável malogro, é que a humildade será redescoberta. E somente com a humildade como archote é que poderá ser encontrado o caminho de volta para o modo correcto de vida em todos os sentidos. Aos que preferem taxar de utópica a forma de governo indicada, digo que têm absoluta razão. É realmente uma utopia para a época presente. No solo ressacado da política actual jamais poderia florescer algo de belo e útil. Antes esse solo terá de ser completamente limpo das ervas daninhas e do sarçal venenoso, plantados e tratados cuidadosamente pela legião de maus jardineiros da política, tão orgulhosos desse seu trabalho.


Os povos mencionados acima reconheciam com gratidão a sabedoria dos seus governantes e, por isso, seguiam à risca, confiantemente, as directrizes de governo. Integravam-se naturalmente em castas sociais; não umas sobre as outras, mas umas ao lado das outras. Não havia evidentemente nenhum tipo de opressão, mas todas as castas, da mais alta à mais baixa, eram consideradas de igual importância, pois o bem do país e do povo dependiam do trabalho conjunto e harmonioso de todas elas, segundo as capacitações de cada um. As castas se formavam de acordo com a maturidade espiritual das pessoas. A mais elevada era a formada pelos sábios. Poderíamos fazer uma analogia desse tipo de governo com um navio que singra o oceano. A segurança e a tranquilidade da viagem dependem da actuação sincronizada de todos os membros da tripulação. O capitão do navio tem a missão de levá-lo em segurança a um bom destino, pois é ele quem melhor está capacitado para isso e de seu posto de observação tem a mais ampla visão dos acontecimentos.

Compete a ele também dar as directrizes correctas no caso da aproximação de tempestades perigosas, que possam por em risco o destino final da viagem. O pessoal que trabalha no convés, na casa de máquinas e na manutenção da embarcação não têm a visão do comandante, mas confiam nele integralmente e trabalham diligentemente para que os motores funcionem bem e o leme mantenha-se firme. Da mesma forma, sem o seu importante trabalho, a viagem também não chegaria a bom termo. O navio é a nação; a viagem é a vida terrena, que deve estar voltada para a ascensão espiritual e o progresso terreno; as tempestades são todos os perigos que ameaçam o curso da viagem, como o surgimento de modos de vida falsos, doutrinas religiosas e filosóficas impregnadas de mentiras, comodismo, falta de vigilância espiritual e terrena, etc; o capitão é o sábio dirigente que, destacando-se espiritualmente dos demais, indica com energia e justiça o rumo a seguir; os outros membros da tripulação, que têm variadas funções a bordo, constituem as castas que se formam automaticamente de acordo com as capacitações e o desenvolvimento interior de cada um.

Não há actualmente sobre a Terra nenhum resquício de regime de governo que sequer se aproxime da forma como era exercido naqueles tempos. Na realidade, nenhum povo hoje merece ser governado assim, mas, ao contrário, apenas por essa classe desqualificada de políticos profissionais, que não visam nada além de seus próprios interesses. Mas também isso é um efeito retroactivo da própria actuação dos povos, muito mais interessados em direitos do que em deveres. É literalmente certo quando se diz que cada povo tem o governo que merece, o que, no entanto, não é apenas decorrência dos resultados das eleições. A verdadeira causa é muito mais profunda, pois colhemos na época presente os frutos venenosos que semeamos em outros tempos."

1 Comments:

Blogger Carvalho Negro said...

Correio recebido.

Ninguém usa a democracia senão na altura de eleições. Não existe democracia em ninguém. Esse sistema, radical e absolutamente, não existe no quotidiano. Pergunte-se a um arquitecto se gostaria ou se estaria disposto a que um projecto seu se submetesse a aprovação popular e ele de pronto cerraria os dentes, os punhos, e maldiria a democracia com toda a sua história de azares e crimes. E de resto, haverá alguém, no seu bom senso, que possa admitir que o voto de uma pessoa esclarecida valha o mesmo que o de um ignaro corrupto? Haverá alguém que possa realmente acreditar que a opinião de massas é a opinião acertada? Alguém faz alguma ideia da competência da pessoa ou grupo em quem vota? Resta, a quem não gosta de um sistema que se diz ser um mal menor (que coisa incrível, esta escureza de espírito que não se apronta a arranjar alternativas e se contenta com um suposto menos mau), resta, dizia, evitar a cicuta que em tempos trouxe a morte a um homem sábio que achava aberrante votar.

http://alertaamarelo.blogs.sapo.pt/

domingo, novembro 14, 2004  

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