28 de Março de 845.
Os Vikings cercam Paris. Os Normandos ("homens do Norte"), nome dado, na época carolíngia, aos piratas vindos por mar da Escandinávia (noruegueses, suecos e dinamarqueses), e que se chamavam a si próprios vikings, percorreram as costas da Europa no séc. VIII. Sob o nome de varegos, ocuparam, em meados do séc. IX, o vale superior do Dnieper, Smolenski e Kiev, e espalharam-se até Constantinopla. Tornaram-se, no plano comercial, os intermediários entre Bizâncio e o Ocidente, entre cristãos e muçulmanos. Mas era o Ocidente que, principalmente, os atraía. Descobriram a Islândia (séc. IX), a Groenlândia (séc. X). Os noruegueses colonizaram o norte da Escócia e da Irlanda; os dinamarqueses instalaram-se no nordeste da Inglaterra (séc. IX). Organizados em pequenos bandos, reunidos em flotilhas de grandes barcos, chegaram, após a morte de Carlos Magno, a desembarcar na entrada dos principais rios do reino franco. Carlos, o Calvo, teve de, mais de uma vez, pagar para que se retirassem. Em 886, sitiaram Paris, valentemente defendida por Eudes e o bispo Gozlin; mas Carlos, o Gordo, entrou em acordo com eles mediante enorme resgate e a autorização de saquearem a Borgonha. Em 911, no Tratado de Saint-Clair-sur-Epte, Carlos III, o Simples, cedeu ao chefe deles, Rollon, a região actualmente conhecida pelo nome de Normandia, exigindo em compensação que o conde normando e seus súbditos se fizessem cristãos, abandonando a selvajaria em que viviam, e reconhecessem Carlos, o Simples, como suserano.
Foi da Normandia que, no séc. XI, partiriam para conquistar a Inglaterra. Após o acordo firmado por Rollon as invasões cessaram, mas o gosto pelas expedições a terras distantes persistiria entre os normandos, que fundaram principados no sul da Itália e na Sicília (séc. XI-XII). Foi Richard, conde dos normandos, descendente de Rollon, que encomendou em 994 de um cónego da região dos francos, Saint-Quetin-Dudon, a história do principado que tinha sob seu domínio, assim como de seus ancestrais. Nessa obra é encontrada um fato que teria ocorrido logo após o baptismo de Rollon, em 911:
"Como símbolo de segurança restabelecida, o duque proibira recolher os arados. Eles ficariam expostos no campo. Um lavrador veio almoçar em casa, deixando o instrumento no lugar. Como muitas mulheres, a sua era maldosa: foi apoderar-se do jugo, da relha e da lâmina. O camponês queixou-se ao duque, que o indemnizou, ordenando uma investigação na aldeia. Recorreu-se ao ordálio, à prova de fogo em nome de Jesus Cristo, sem sucesso, e Rollon, recém-batizado, inquietava-se, perguntava ao bispo: 'Se o Deus dos cristãos vê tudo, por que não desmascara o culpado?'.
Interrogado, o camponês revelou que apenas sua esposa podia saber onde se encontrava o arado. A mulher foi presa, chicotearam-na com varas. Ela confessou. Então o duque perguntou ao camponês: 'Sabias que tua mulher era ladra? Então mereces a morte e por duas razões: és o chefe de tua esposa, devias controlá-la, impedi-la de causar dano. Se, no par conjugal, o homem não segura o leme, tudo vai por água abaixo. Além do mais, devias denunciá-la, entregá-la à justiça do povo, portanto és seu cúmplice'. A mulher e seu marido foram enforcados". Para Guillaume de Jumièges, monge que no século XI escreveu a biografia de Guilherme, o Conquistador, também descendente de Rollon, apenas a esposa foi punida. Vararam-lhe os olhos.
Nessa época escrevia-se pouco, e raramente em veículos duráveis. Todo poder exercia-se sobretudo pela palavra e gestos. As fontes de informação são esporádicas. A cultura escrita era monopólio dos padres.
Para os povos bárbaros o mais importante era o facto criminoso considerado objectivamente. A razão da pena era a "quebra da paz" pública ou privada e baseava-se na vindicta. Não havia muita preocupação com a culpa (sentido amplo), ou com o elemento subjectivo do delinquente; o dano material causado tinha sempre um valor predominante.A prova de fogo: ordálio ou juízo de deus que consistia em submeter a testemunha ou o acusado ao contacto com o fogo, após o que aguardava-se um determinado tempo, se houvesse queimaduras estava mentindo, se não houvesse, estava falando a verdade. O responsável pela paz voltava-se para o Deus justiceiro exortando-o a baixar ele mesmo a sentença.A condenação acima mostra que apenas os homens haviam sido submetidos à prova: não mais que os animais domésticos, as mulheres não eram da alçada da coisa pública, são objectos, móveis.
Fontes: - "Damas do Século XII", Georges Duby,
Ed. C. das Letras, 1995.- "Idade Média na França",
Georges Duby, JZE, 1992.- Enciclopédia Koogan-Houaiss Digital, 1999.-
"Princípios de Direito Criminal", Ferri.
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