quarta-feira, janeiro 23, 2008

Portugal e a Europa.

"As economias alemã e portuguesa já não podem conviver no mesmo espaço por muito mais tempo. Teremos de enfrentar uma escolha difícil.

Pensemos sobre o que a presente crise significa para a economia global numa perspectiva suficientemente ampla. Tem razão quem diz que tudo começou há dez anos, porque a expansão do défice de transacções correntes americano foi a solução encontrada para alimentar as exportações asiáticas e evitar o colapso. Tudo começou com a crise asiática, mas o vento sopra numa nova direcção.

Distribuídas por uma dezena de países a sul e a leste, as vulnerabilidades da economia europeia, da especulação imobiliária e cambial ao descontrolo das contas públicas, são uma ameaça grave, sobretudo porque causarão uma aceleração súbita dos problemas quando eles começarem. Alguém dizia recentemente que a próxima crise de dívida ocorrerá num de três países do sul da Europa e não, como se poderia pensar, num mercado emergente. No que diz respeito à economia alemã, um modelo de solidez, poucos acreditam que o consumo interno possa compensar a redução abrupta e inevitável nas exportações provocada pelo arrefecimento da economia americana e pela valorização do euro, acompanhada pela queda dos salários reais com novas pressões inflaccionistas.

A fragmentação orçamental dentro da mesma zona monetária encoraja a despesa pública e o fomento da procura, pelo que as taxas de juro têm de ser mantidas artificialmente altas. Entrámos num período de turbulência financeira fragilizado por experiências políticas delicadas.

Mas os problemas de acção colectiva não ficam por aqui. Numa economia de mercado os custos do trabalho por unidade de produção deveriam convergir. Talvez a zona euro não seja uma economia de mercado, porque a verdade é que esses custos são hoje 10% inferiores à média na Alemanha e 20% superiores em Portugal. Stefan Collignon elaborou um gráfico surreal mostrando que esta diferença tem vindo a aumentar consideravelmente nos últimos anos. As economias alemã e portuguesa já não podem conviver no mesmo espaço por muito mais tempo.

Em breve teremos de enfrentar uma escolha difícil. Admitindo que a situação actual provocaria uma desindustrialização profunda, teremos de optar entre a transferência radical de soberania económica para as instituições europeias ou o abandono da zona monetária. Discutida com algum segredo há dois meses, a expansão do pacto de estabilidade para incluir custos do trabalho parece ser a forma que a primeira opção irá tomar. O velho pacto de estabilidade fez e desfez governos entre nós. O novo teria efeitos mais profundos.

Tenho de concluir que a segunda opção é bastante mais provável
."

Bruno Maçães

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