segunda-feira, fevereiro 25, 2008

OS MALUCOS DO RISO

"A piada óbvia sobre a renúncia de Fidel era perguntar porque é que um homem que cumpriu tão bem a sua função a abandona tão precocemente. Sem surpresas, o PCP antecipou-se e contou a piada primeiro. Sem surpresas, o PCP não vê onde está a graça. Os comunistas portugueses acham genuinamente que "o povo cubano e a revolução socialista devem muito a Fidel Castro", e que este "teve um gigantesco papel na liberdade" em Cuba, além de ter contribuído "para um mundo melhor".

Já Francisco Louçã optou por recordar que "não pode haver socialismo sem liberdade de opinião, sem liberdade sindical e sem pluralismo da política e da vida social". Como nunca, em lado nenhum, o socialismo a que o BE aspira se misturou com a liberdade de opinião, a liberdade sindical e etc., o humor do dr. Louçã é igualmente inadvertido, mas muito mais subtil.

Pelo mundo fora, a decisão de Fidel suscitou inúmeras anedotas soltas e inconscientes, desde o estilo Parque Mayer de Chávez ("é um gesto de desprendimento pessoal") ao estilo Niemeyer de Niemeyer ("Fidel continuará a colaborar com o povo cubano"). E desde a chalaça surrealista de Morales ("é uma lição de democracia") à jovial brejeirice de Lula ("Fidel é o único mito vivo da história da humanidade").

Apesar de tudo, os comentários mais divertidos não vieram de comediantes profissionais, mas de jornalistas, repórteres e anónimos na Internet. São, curiosamente, todos semelhantes. Todos referem os presos políticos, a pobreza de Cuba, a tragédia de um povo. E todos, ainda assim, lamentam que a revolução se "desvirtuasse", que o "romantismo" se desvanecesse, que a "resistência" perdesse apelo.

Na cabeça desta gente, houve um instante (um longo instante) em que Fidel e o seu bando se moveram pelas melhores intenções e alimentaram os maiores sonhos. Não importa que aquilo tenha sido uma barbárie desde o início: importa que, a partir de certo ponto, a barbárie tornou-se-lhes desconfortável. A "mudança" que criticam em Fidel é, afinal, a mudança deles próprios, forçados pelas conveniências a remeter a nostalgia "revolucionária" para um canto acanhado e a "t-shirt" do "Che" para debaixo da camisa. E isto, sob uma perspectiva perversa, é hilariante.

Os cubanos comuns discordam, claro, mas os cubanos comuns nunca foram os protagonistas da revolução que, em tempos, os quis salvar: foram as vítimas
."

Alberto Gonçalves

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